segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Crítica – Na Mente do Demônio

 

Análise Crítica – Na Mente do Demônio

Review – Na Mente do Demônio
Durante todo o tempo em que assistia Na Mente do Demônio uma pergunta pairava sem parar na minha mente: “O que diabos aconteceu com Neill Blomkamp?”. Sim, eu sei que este filme foi realizado no auge da pandemia, com várias limitações de pessoal e orçamento, mas o resultado final não parece fruto do trabalho de alguém com três longas debaixo do braço e sim algo quase que amador. É impressionante que um realizador que tenha começado tão promissor com o excelente Distrito 9 (2009) nunca tenha conseguido entregar algo no mesmo nível, seguido com o passável Elysium (2013) e o péssimo e bagunçado Chappie (2015). Na Mente do Demônio, no entanto, é o ponto mais baixo dele até aqui.

A trama é centrada em Carly (Carly Pope) uma mulher que cortou relações com a mãe depois de décadas de trauma. Um dia é avisada por um amigo, Martin (Chris William Martin), que a mãe está há mais de uma década em coma depois de ser presa por múltiplos crimes e que os médicos do hospital precisam falar com Carly. Chegando na instalação médica, Carly descobre que os médicos querem que ela use um dispositivo experimental de realidade virtual para entrar na mente da mãe, Angela (Nathalie Boltt), para conseguir conversar com ela. O que Carly descobre, no entanto, é que existe outra entidade no corpo da mãe.

A ideia de entrar na mente de alguém possuído meio que misturando O Exorcista (1973) com A Origem (2010) já tinha sido explorada no péssimo Dominação (2017) e este filme não faz nada muito melhor em termos de tentar mostrar que a premissa pode funcionar. O fato de termos uma protagonista que entra na mente de uma pessoa que abusou psicologicamente dela poderia ter algo a dizer sobre trauma ou como funciona a mente de um abusador, no entanto, o texto não tem nada a dizer sobre isso.

A exploração do trauma de Carly praticamente não é construída. Os diálogos explicam vagamente o passado dela com mãe, mas nunca conseguem dar o devido impacto aos traumas da protagonista e o fato de não vermos o passado dessas pessoas ou interações delas fora da simulação contribui para que nada disso consiga ter qualquer peso dramático. Não ajuda que a possessão demoníaca acabe sendo usada como a explicação para toda conduta abusiva de Angela, diluindo imediatamente toda a dinâmica entre mãe e filha. Mais grave é que o roteiro presuma que ao saber que a mãe não era a culpada os traumas de Carly sejam automaticamente resolvido, como se um culpado diferente simplesmente apagasse as experiências ruins de imediato. Não é assim que trauma funciona e nada na jornada da personagem soa minimamente genuíno.

O filme também nunca se esforça para ser assustador ou tenso. Tirando um susto gratuito quando uma amiga de Carly vai visitá-la não há nada que sequer tente nos deixar com medo. Os elementos de horror parecem jogados de qualquer jeito, como que usados cinicamente por saber que horror é um gênero que sempre tem um público cativo e dá retorno, mas o filme também falha completamente nessa frente. Não ajuda que todas as externas tenham sido filmadas na idílica região dos vinhedos de Vancouver, sendo difícil sentir medo ou qualquer senso de ameaça iminente com as personagens sentadas tomando vinho e observando paisagens levemente ensolaradas com bucólicas florestas e montanhas. Eu sei que isso tem a ver com limitações da pandemia, que provavelmente foi ali onde Blomkamp estava durante o período de isolamento, mas ao menos poderia usar uma paleta de cores menos saturadas, colocar uma neblina, criar uma atmosfera opressiva e claustrofóbica ao invés de uma bela viagem pelo interior do Canadá.

Lá pela metade o filme introduz uma ideia interessante embora completamente aloprada (SPOILERS a seguir). A de que os médicos da instalação visitada por Carly são, na verdade, uma facção renegada e militarizada de padres católicos que rodam o mundo exterminando demônios, com todo o experimento sendo uma tentativa de confirmar se Angela estava possuída. Poderia render algo divertido se embarcasse nessa maluquice, mas mal o filme introduz esse conceito e já mata todos esses personagens fora de cena, não nos dando sequer a alegria de um gore divertido. De novo, eu entendo o porquê disso acontecer fora de cena, já que filmar uma cena de ação com tiros, explosões e sangue falso exigiria uma equipe muito grande que não dava dentro do orçamento ou restrições sanitárias da produção. O que critico aqui é o fato de introduzir um conceito apenas para abandoná-lo cinco minutos depois.

Esses elementos religiosos acabam não fazendo diferença nenhuma e nem mesmo os conceitos de ficção científica envolvendo a simulação (que parece um jogo de The Sims rodando em um PC abaixo dos requerimentos mínimos) tem qualquer coisa a dizer. Os elementos tecnológicos e do sci fi poderiam ser tranquilamente substituídos por elementos sobrenaturais que o resultado seria o mesmo. Ele poderia usar da ficção científica para falar algo sobre consciência, memória, subsconsciente ou como a tecnologia expande a experiência humana, mas não, nada disso é usado para comunicar qualquer ideia.

O clímax introduz do nada um objeto sagrado que estava no poder dos padres e que teria o poder de matar um demônio dentro do corpo da pessoa possuída. A revelação chega sem qualquer preparação para tal e não faz o menor sentido. Se os padres tinham isso o tempo todo, porque não usaram em Angela? Outra questão que soa gratuita e jogada de qualquer jeito é o fato do demônio querer tomar o corpo de Carly de qualquer jeito. Qual o motivo disso? Porque ela seria uma hospedeira tão ideal? Nunca há uma motivação para isso.

Com um roteiro que mistura drama, terror sobrenatural e ficção científica, Na Mente do Demônio fracassa completamente em todos os gêneros, entregando um produto arrastado e vazio.

 

Nota: 1/10


Trailer

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