quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Crítica – Querido Evan Hansen

 

Análise Crítica – Querido Evan Hansen

Review – Querido Evan Hansen
Filmes musicais estão normalmente associados à comédia, mas é perfeitamente possível que o gênero trate de temas mais pesados como suicídio e saúde mental sem parecer que está suavizando a gravidade dessas questões. Querido Evan Hansen, adaptação de um musical da Broadway de mesmo nome, tenta abordar exatamente esses temas, mas tem alguns problemas.

Evan (Ben Platt) é um adolescente tímido que sofre de depressão e ansiedade. Para lidar com isso, seu terapeuta sugere que ele escreva cartas para si mesmo na tentativa de colocar para fora seus sentimentos. Um dia ele acidentalmente imprime uma dessas cartas na escola, que é encontrada por Connor (Colton Ryan) que acha que Evan estava zombando dele. Dias depois Connor se suicida e a carta de Evan é a única coisa encontrada com ele fazendo todos acreditarem que aquela era a carta de suicídio de Connor e que ele e Evan eram amigos. Confrontado pelos pais de Connor, Evan não consegue dizer a verdade e confirma a mentira, que vai ganhando grandes proporções conforme a história se espalha e ele passa a apreciar o fato de finalmente ser notado e ter amigos.

Muito foi dito sobre a escalação de Ben Platt como Evan, que viveu o personagem no teatro anos atrás quando a peça estreou. A questão é que Platt hoje tem quase 30 anos e não remete mais a um garoto. Platt tem rosto de adulto e mesmo as próteses usadas para tentar suavizar seu rosto só tornam tudo mais artificial. Isso combinado aos maneirismos exagerados que ele adota, como os ombros excessivamente arqueados para frente ou as mãos chacoalhantes, deixa muito evidente que estamos vendo um homem adulto fingir ser um adolescente, algo similar ao meme do Steve Buscemi fingindo ser um colegial.

Sim, não é a primeira vez que alguém com quase 30 anos interpreta um adolescente e mesmo o resto do elenco coadjuvante tem 22 ou 24 anos. A diferença é que atrizes como Amandla Stenberg e Kaitlyn Dever conseguem tranquilamente passar por adolescentes, o que, por contraste, só deixa Platt mais deslocado. O problema aqui é que nossa adesão a Evan, considerando as ações questionáveis dele em manipular uma família enlutada, depende de vermos o personagem como um garoto frágil, inseguro e solitário, cujas ações são menos fruto de malícia ou egoísmo e mais de carência e imaturidade.

Como Platt não vende essa juventude frágil, a inocência bruta e crua de um garoto perdido, ficamos com um semblante adulto diante de todas essas situações delicadas, tornando mais difícil aderir a Evan. Para a escalação ter funcionado, o filme precisaria abandonar o naturalismo e adotar uma abordagem mais teatral (pensem no Anna Karenina do Joe Wright), tanto nos cenários quanto no restante do elenco, colocando todos os colegiais para serem interpretados por atores e atrizes mais velhos sem qualquer compromisso de fazê-los realmente parecer adolescentes.

Nos números musicais, no entanto, Platt justifica o porquê de ter sido escalado, dando vazão ao turbilhão interno de emoções do personagem, exibindo todo o sentimento de inadequação e isolamento que ele experimenta, bem como a dor que sustentar a mentira lhe causa. Isso também é ressaltado pelo modo como a câmera filma o personagem, sempre distante do resto das pessoas, com uma iluminação ou um fundo diferente dos demais. Em um dos primeiros números, no corredor da escola, ele está de pé sobre um azulejo vermelho enquanto todo o resto é branco. São esses segmentos musicais que nos mantem investidos na jornada de Evan, já que as cenas não musicais não conseguem envolver como deveriam.

A maioria dos números é focada em Evan, mas alguns outros personagens também tem seus momentos, como a colega Alana (Amandla Stenberg), uma das garotas mais populares da escola, que confidencia a Evan que também sofre de problemas de ansiedade. Do mesmo modo, a família de Connor também tem um número musical em que cantam sobre a dificuldade do luto. Um número protagonizado por Connor e Evan conforme o protagonista forja alguns e-mails para provar que eram amigos consegue trazer um pouco de humor à trama sem perder de vista a complicada situação moral de Evan. O ponto alto, no entanto, é a canção You Will Be Found que fala sobre a importância de cuidarmos um dos outros e que não estamos sozinhos. Um emocionante lembrete sobre a necessidade de procurar ajuda quando não nos sentimos bem mentalmente.

Amy Adams se sai bem como uma mãe enlutada em busca por entender melhor o filho e que se recusa a aceitar que ele não tenha deixado qualquer impacto positivo no mundo. Uma conduta carregada por desespero, como se tentasse justificar a si mesma que o filho não era o caso perdido que todos pensavam. Julianne Moore, por outro lado, não tem muito o que fazer como a mãe de Evan. Presa ao clichê da mãe solteira que trabalha demais e não consegue dar assistência ao filho, a personagem nunca sai desse lugar comum e apenas o número musical que ela tem perto do fim consegue ter algo a dizer sobre a personagem.

O final é outro problema, rapidamente resolvendo todo o conflito com uma breve montagem que pula para meses depois de Evan admitir a mentira. É uma espécie de redenção (ainda que não total) que vem rápido e fácil demais em relação à gravidade de todos os problemas que ele causou. Não digo que ele não pudesse ou não deveria encontrar algum tipo de perdão, mas que não é devidamente construída pela trama. Como não vi o musical original, não sei se o final é o mesmo, mas do jeito como o filme apresenta, talvez tivesse sido melhor ter deixado a questão em aberto, encerrando a história no momento em que ele posta o vídeo confessando a mentira.

Apesar de tocar em questões importantes e apresentar bons números musicais, Querido Evan Hansen dilui seu impacto por conta de alguns problemas de casting e por um desfecho que não soa devidamente construído.

 

Nota: 5/10


Trailer

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