Embora o retorno de Silver, vilão de Karate Kid 3: O Desafio Final (1989), seja um passo relativamente lógico para a trama, tinha minhas dúvidas em relação à inserção do personagem aqui considerando que o terceiro filme é muito ruim e Silver não era nada além de um psicopata histérico. Felizmente Silver acaba funcionando dentro da lógica da série, tendo sua relação com Kreese aprofundada, mostrando como o criador do Cobra Kai manipula o trauma e sentimento de culpa de Silver para mantê-lo sob controle.
Assim, Silver é menos um maluco histérico que é maligno sem nenhuma razão e mais um sujeito instável por conta de traumas e culpa do passado. A série ainda justifica de maneira divertida a conduta de Silver em Karate Kid 3 ao recorrer ao argumento do “foi mal, tava doidão” conforme o personagem admite que passou boa parte da década de oitenta sob efeito de cocaína.
A tentativa de Daniel e Johnny se aliarem segue um percurso relativamente previsível, com eles tentando se juntar, mas eventualmente discutindo por conta de rancores passados. Sim, eu já disse que um dos temas centrais da série é como viver preso ao passado cria mais problemas que resolve, mas a essa altura já vimos tantas vezes Johnny e Daniel resolverem as diferenças apenas para voltarem a brigar depois que já está ficando cansativo. Aqui há o agravante de que a conduta de Daniel nunca soa plenamente justificada. Johnny ao menos tem uma motivação consistente ao sentir ciúme e insegurança vendo Miguel (Xolo Maridueña) se aproximar de LaRusso. O mesmo, no entanto, não acontece com Daniel, que parece movido apenas por um radicalismo sectário vagamente construído.
Por sinal, da mesma forma que Miguel aprende com Daniel e começa a misturar estilos, o mesmo acontece com Sam (Mary Mouser), que se aproxima de Johnny para aprender seu estilo mais agressivo na esperança que isso lhe ajude a enfrentar Tory (Peyton List). Claro, ambas escolhas tem consequências, com Sam tendo problemas ao agir mais agressivamente e Miguel ao evitar confrontos, mas mostra como esses personagens conseguem trilhar seus próprios caminhos e aprenderem com ambas perspectivas ao invés de acharem que o caminho de seus tutores originais é o melhor.
Amanda LaRusso (Courtney Henggeler) acaba tendo um papel mais ativo na trama além de reagir sarcastimente às maluquices que acontecem ao seu redor. Aqui ela se aproxima de Tory, descobrindo o cotidiano difícil da garota e tentando encontrar uma maneira de ajudá-la. Claro, Amanda faz isso pensando em acabar com a rivalidade entre Tory e Sam, mas a matriarca dos LaRusso serve para mostrar a Tory que existem outras maneiras de lidar com os problemas além de raiva e agressão, o que pode sinalizar um eventual afastamento da jovem do caminho dos Cobra Kai.
Quem também está em um caminho de redenção é Eli/Falcão (Jacob Bertrand). Se na temporada anterior ele mudava subitamente de lado, nesta temporada a série dá mais peso e consequências às atitudes dele, mostrando que mesmo tendo deixado Cobra Kai, Miguel e os outros não voltam a se relacionar com ele da mesma maneira. O arco do personagem obriga o garoto a reconstruir a própria identidade, sem a agressividade do Cobra Kai ou o cabelo chamativo.
Por outro lado, a temporada também apresenta arcos narrativos que soam redundantes e apenas repetem ideias que já vimos antes. O melhor exemplo é a trama envolvendo Kenny (Dallas Young), garoto novato que sofre bullying nas mãos de Anthony (Griffin Santopietro), filho caçula de Daniel. Todo arco de Kenny é basicamente a mesma coisa que já vimos com Miguel e Falcão em temporadas anteriores e por mais que finalmente dê algum destaque ao mais jovem dos LaRusso, é uma trama quase que completamente descartável.
Sim, no fim Kenny serve para mostrar a Robby (Tanner Buchanan) o que Cobra Kai faz com a mente de um jovem, mas isso poderia ser alcançado usando qualquer outro dos personagens já presentes na série, sem precisar uma nova trama. Do mesmo modo, a eventual guinada de Anthony nos últimos episódios soa abrupta demais, como se bastasse uma conversa séria com Daniel para que o garoto deixasse de ser um babaca.
Apesar de todas as falhas que a série tem ao longo da temporada, os dois últimos episódios, focados no torneio regional e no confronto de Johnny e Daniel contra Kreese e Silver, entregam um excelente clímax. Além de boas cenas de luta que dão a impressão que qualquer um pode vencer, incluindo alguns resultados inesperados, os últimos episódios também trazem desenvolvimentos importantes para vários personagens.
De um lado, Johnny e Daniel finalmente entendem como o estilo do outro pode ajudar os respectivos alunos e ambos (mais uma vez) conseguem deixar as diferenças de lado, apontando uma aproximação mais definitiva. Por outro vemos um inesperado momento de humanidade de Kreese em sua fala para Tory na luta final. Até então o sensei do Cobra Kai era o personagem mais apegado ao passado, mas nesse momento ele mostra que está disposto a deixar de lado sua conduta tóxica de antes. Que isso aconteça por ele, de certa forma, se sentir culpado pela maneira como treinou Johnny só mostra que há um ser humano capaz de demonstrar afeto por baixo de sua superfície bruta. Não redime Kreese por tudo que ele fez, mas ao menos dá mais um pouco de nuance ao personagem.
Apesar de um percurso trôpego,
com tramas que reciclam elementos de temporadas anteriores, a quarta temporada
de Cobra Kai eventualmente consegue
amarrar bem seus fios narrativos ao final, abrindo caminho para novos
conflitos. Considerando que algumas coisas na série parecem estar se repetindo e que uma quinta temporada já está confirmada com uma sexta em pré-produção, acho que já era hora da equipe criativa começar a pensar em encerrar a série antes que ela comece a decair em qualidade.
Nota: 7/10
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