Adaptando uma série britânica, Murderville, nova produção da Netflix, tenta misturar trama policial com jogos de improvisação. A trama é centrada no policial Terry Seattle (Will Arnett) que a cada episódio recebe um convidado especial diferente como parceiro. A questão é que esse convidado não tem o roteiro do episódio, não sabe o que vai acontecer e precisa improvisar suas ações enquanto segue Terry na investigação, ao final o convidado precisa apontar corretamente quem é o culpado.
Apesar da ideia de tudo ser construído em cima de improviso, o formato é um pouco mais engessado do que se imaginaria. Todo episódio segue a mesmíssima estrutura, com o convidado conhecendo Terry em seu escritório, depois uma cena com a legista Amber (Lilan Bowden) na qual ela dá as principais pistas do caso, depois uma cena com cada um dos três suspeitos, por fim uma cena com todos os suspeitos reunidos para que o convidado aponte o culpado. Esse formato rígido acaba tornando tudo menos caótico do que se esperaria de uma trama centrada em improviso.
A série depende muito dos convidados de cada episódio e do que eles conseguem trazer para a cena. Enquanto alguns como Conan O’Brien e Kumail Nanjiani realmente embarcam na maluquice e tentam elevar o nível de alopração de cada cena, outros convidados como ex-jogador de futebol americano Marshawn Lynch ou Sharon Stone se limitam a apenas reagir a Terry e os demais personagens, sem propor nada paras as cenas.
O formato também não permite a criação de mistérios com muita intriga, reviravolta ou grandes surpresas. Ao invés disso a série acaba focando mais na natureza lúdica da narrativa policial. Desde a literatura teóricos do gênero mencionam como narrativas policiais estabelecem uma espécie de jogo entre o leitor e o narrador, no qual o leitor tentaria resolver o crime antes da própria trama. As tramas de Murderville focam principalmente nisso, expandindo esse jogo também para o ator convidado, que, assim como o espectador, vai precisar atentar de modo mais ativo para as pistas que a trama sutilmente coloca diante dele.
Confesso que há um inegável prazer nessa disputa do espectador tentar superar a inteligência da narrativa e antever a explicação para o crime. No entanto, dado o formato rígido dos episódios e a natureza simples dos crimes, confesso que foi bem fácil para mim determinar o culpado (acertei todos). Por outro lado, admito que tenho uma familiaridade muito grande com o gênero (meu doutorado foi sobre narrativas policiais no cinema) e provavelmente o espectador menos experiente provavelmente não vá achar tudo tão simples.
A série ainda tenta criar um arco para Terry ao longo da temporada, narrando a tentativa dele em decifrar o assassinato da antiga parceira. O problema é que tudo é tão pouco desenvolvido e tão apoiado em clichês que a trama não envolve como deveria e é frágil demais para realmente “colar” todos os episódios juntos. Como cada episódio precisa, de certa forma, reapresentar Terry ao novo convidado sequer sei se esse formato precisa de arcos mais longos ao invés de focar no “caso da semana”.
Assim, Murderville entrega bons momentos de diversão graças à entrega de
Will Arnett e suas interações com os convidados, além de resgatar a natureza
lúdica do gênero policial, mas acaba sendo menos aloprado e engessado do que se
esperaria de algo calcado em improviso.
Nota: 6/10
Trailer
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