É um documentário todo apoiado em entrevistas com eventuais imagens de arquivo e algumas transições com animação e fotos para tentar dar algum movimento, mas não conseguem mascarar a falta de ritmo e estética demasiadamente convencional. Durante boa parte do tempo soa mais como uma grande reportagem mais interessada em apenas narrar fatos do que analisá-los criticamente. Seria menos um problema se o documentário realmente analisasse com consistência as questões que apresenta ao invés de passar superficialmente por elas.
A narrativa comenta, por exemplo como a marca criou um padrão de beleza interessado apenas em pessoas brancas de classe média e com um determinado tipo de corpo, com esse padrão determinando até mesmo quem era contratado para trabalhar nas lojas. O documentário expõe as práticas preconceituosas da empresa, no entanto nunca as contextualiza. Da maneira como é apresentado parece que as ações da marca ocorreram em um vácuo e não que ela apenas assumia sem vergonha que vendia um padrão preconceituoso e excludente como boa parte da indústria da moda. Algumas declarações perto do final até mencionam isso, mas no geral a empresa é apresentada quase como um pária ou exceção da indústria.
Outro elemento mal aproveitado é o paradoxo apresentado entre a estética homoerótica das fotografias e catálogos da empresa e os ideais de heterossexualidade tradicionais que ela atrelava ao seu público alvo. Que uma marca com uma estética tão marcada e deliberadamente gay tivesse tanto apelo entre homens heterossexuais conservadores diz muito sobre o ideal de masculinidade e amizade entre homens dessa sociedade heteronormativa. O filme, porém, passa ao largo de tudo isso.
Por outro lado, o filme acerta em mostrar como é fácil uma empresa vender a ideia de diversidade sem, de fato, sê-lo, revelando como a marca ampliou as contratações de pessoas não brancas em suas lojas, mantendo toda a direção e alta cúpula completamente brancas, ou seja, sem possibilidade de mudar a cultura corporativa preconceituosa. É justamente porque o documentário aborda isso tão bem que chega a ser estranho como o final aceita com muita facilidade o discurso da nova presidente da empresa e todo o discurso sobre se abrir a ideais diversos de beleza.
O documentário trata como se a marca tivesse aprendido a lição sem ponderar (ainda mais com o histórico de enganação que ele próprio mostra) que talvez seja só mais uma estratégia cínica de uma corporação para continuar lucrando. Sim, eu sei que representatividade importa a despeito das intenções das empresas, mas simplesmente aceitar que uma empresa de cultura extremamente tóxica vai ficar boazinha do dia para a noite só com uma mudança de presidente é ser ingênuo demais.
Incomoda a presença de certos segmentos que são inseridos por puro sensacionalismo, a exemplo das alegações de abuso sexual por parte do principal fotógrafo da empresa e do antigo presidente. O documentário apresenta essas alegações por alto, sem nenhuma prova ou consistência, admitindo inclusive que nenhum dos dois nunca foi formalmente acusado perante a justiça criminal. Ora, se não há materialidade nas denúncias porque fazê-las? Investigação jornalística ou documental sem sustentação factual não passa de fofoca. Não estou aqui defendendo a inocência dessas figuras e sim que um documentário faça de fato seu trabalho investigativo ao invés de jogar alegações de qualquer jeito apenas para escandalizar a audiência.
Abercrombie & Fitch: Ascensão e Queda acaba tendo muito pouco a
dizer sobre a cultura e o meio social que observa, se limitando a uma estrutura
demasiadamente convencional e um olhar superficial para as questões que
denuncia.
Nota: 5/10
Trailer
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