quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Crítica – Não Se Preocupe, Querida

 

Análise Crítica – Não Se Preocupe, Querida

Review – Não Se Preocupe, Querida
Depois de uma ótima estreia como diretora no bacana Fora de Série (2019), fiquei curioso pelo que Olivia Wilde faria a seguir. Seu segundo trabalho, Não Se Preocupe, Querida já estava cercado de controvérsias antes mesmo de ser lançado por conta de histórias de bastidores atribulados, a relação entre ela e Harry Styles, além de possíveis desavenças entre Wilde e a atriz Florence Pugh. No fim todo esse conflito acabou rendendo algo mais interessante do que o próprio filme, que soa como uma reciclagem sem brilho de ideias e premissas que a ficção científica já explorou melhor desde a década de 70.

Na trama Alice (Florece Pugh) vive uma existência idílica como dona de casa suburbana no que parece ser a década de 50 enquanto seu marido, Jack (Harry Styles), sai todo dia para trabalhar na misteriosa instalação no meio do deserto liderada por Frank (Chris Pine). Aos poucos, no entanto, ela começa a desconfiar que Frank e a aquela tranquila comunidade escondem segredos nefastos.

Não vou me deter sobre as reviravoltas pra não estragar a experiência de ninguém, mas o que segue é basicamente um plágio do romance As Esposas de Stepford de Ira Levin que já foi adaptado para o cinema duas vezes em Esposas em Conflito (1975) e Mulheres Perfeitas (2004). Não apenas a premissa é idêntica como Wilde tem aqui muito pouco a dizer além da óbvia constatação de que vivemos em uma sociedade patriarcal que visa manter as mulheres sob controle. A questão é ao invés de avançar nessas considerações que a arte e a ficção científica já exploram há cinquenta anos, ela apenas repete o que já foi dito com uma condução pretensiosa que age como se estivesse fazendo algum tipo de constatação inovadora.

O filme ainda desmorona em seu clímax pela total incapacidade do filme em estabelecer a lógica de como aquela situação funciona (Frank não poderia ter simplesmente fechado o portal?) e por reveses que não tem a devida construção ou que não soam coerentes. Se Bunny (Olivia Wilde) já sabia a verdade sobre tudo aquilo e aceitava de bom grado, porque ajudar Alice? Isso não seria um risco à toda a realidade que Bunny se apegou? Do mesmo modo a esposa de Frank se voltar contra ele no fim é algo que soa jogado de qualquer jeito para chocar, já que não houve qualquer construção a respeito disso.

Quem carrega o filme é Florence Pugh e o modo como ela trabalha o crescente senso de desespero de Alice, que passa a duvidar da própria realidade e ser tratada como louca pelas pessoas ao seu redor. Pugh mobiliza nossa inquietação e suspense pela personagem, nos deixando em dúvida se realmente há algo errado ou se ela está perdendo a cabeça. Outro destaque é o trabalho de Chris Pine como Frank, que usa seu charme canalha em favor do personagem, dotando Frank de um grande magnetismo pessoal ao mesmo tempo que nos faz ver uma boa dose de malícia e desfaçatez por trás da fachada bondosa do líder local.

Harry Styles, por outro lado, carece da dubiedade necessária para fazer Jack um personagem interessante. Styles falha tanto na faceta mais sedutora quanto no lado mais amargurado e inseguro de Jack, entregando um sujeito apático que sequer consegue nos despertar raiva quando descobrimos a verdade. A revelação do passado de Jack e Alice, por sinal, poderia ser utilizada para falar sobre como a internet radicaliza o pensamento de homens medíocres frustrados, transformando-os em incels problemáticos, no entanto, o filme passa rápido por essas ideias e tem muito pouco a dizer.

As cenas de sexo, que Wilde tanto alardeou quando falava do filme para a imprensa ao ponto de Florence Pugh ter que se manifestar dizendo que elas são eram o ponto principal do filme, acabam sendo instantes pontuais que são pouco significativos na jornada dos personagens. Sim, elas realmente operam no inverso do que esse tipo de registro opera em Hollywood, evitando a objetificação feminina e focando mais no prazer da mulher do que do homem, mas estão longe de ser o elemento chocante e quebrador de tabus que a diretora tanto alardeava. Na verdade, elas poderiam ser removidas sem grande prejuízo para a trama, ao ponto em que me questiono o motivo da diretora ter feito tanta questão de frisar esse aspecto. Por outro lado, Wilde é competente em manejar o clima de paranoia que se instala ao redor de Alice, principalmente no modo como insere imagens lisérgicas abruptamente no cotidiano da personagem, demonstrando como ela está perdendo o senso de realidade.

Mesmo com uma boa performance de Florence Pugh, Não Se Preocupe, Querida não consegue ir além de ser uma reciclagem inane e sem brilho de ideias que a ficção científica já explorou melhor há décadas atrás.

 

Nota: 4/10


Trailer

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