segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Crítica – Pantera Negra: Wakanda Para Sempre

 

Análise Crítica – Pantera Negra: Wakanda Para Sempre

Review – Pantera Negra: Wakanda Para Sempre
Quaisquer que fossem os planos originais da Marvel e do diretor Ryan Coogler para o segundo filme do Pantera Negra, eles foram inequivocamente abalados pela prematura morte do astro Chadwick Boseman. É preciso ter isso em mente ao analisar este Pantera Negra: Wakanda Para Sempre, que certamente precisou fazer várias gambiarras narrativas para adaptar as ideias originais, ser respeitoso com o falecimento de seu astro e atender às demandas corporativas da Marvel e a construção de seu universo cinematográfico.

A narrativa começa justamente com Wakanda lidando com o falecimento de T’Challa (Chadwick Boseman) por uma doença misteriosa. Um ano depois, Wakanda e seu valioso vibranium são alvo de ataques das potências mundiais que buscam o valioso recurso. O mundo acha que sem o Pantera Negra, a rainha Ramonda (Angela Bassett) e a princesa Shuri (Letitia Wright) estão vulneráveis. Ao mesmo tempo, quando uma plataforma marítima que pesquisava vibranium é atacada por estranhos seres aquáticos, o mundo desconfia de Wakanda. O líder desses seres, Namor (Tenoch Huerta) se revela para Ramonda e Shuri pedindo que Wakanda entregue a ele os responsáveis pela pesquisa com o vibranium submarino. Agora elas precisam ponderar como proceder com ameaças por todos os lados.

O longa é eficiente em suas homenagens a Boseman e seu personagem, conferindo a devida emoção e peso à sua ausência sem jamais soar indelicado ou de mau gosto. É um competente exame de como o luto nos deixa vulneráveis e sem rumo. O problema é que o filme demora a encontrar um eixo uma vez que passa do luto. Embora Namor seja um claro antagonista, a narrativa parece demorar a se decidir sobre o que é esse conflito com Namor e quem estará no centro dele até se decidir por Shuri, tratando a disputa com a nação submarina de Talokan como um meio para a jovem princesa externar sua frustração com os fracassos com o irmão, a mãe e o próprio país.

Até se encontrar o filme também introduz ou desenvolve vários outros personagens, muitos que estão aqui mais para estabelecer elementos para filmes futuros do que contribuir para a trama presente. É o caso de Valentina de Fontaine (Julia Louis-Dreyfus), que parece estar aqui mais para construir tramas para o vindouro filme dos Thunderbolts. Do mesmo modo a presença de Riri Williams (Dominique Thorne) serve mais como um piloto de luxo para a série da Coração de Ferro, já que aqui a personagem nunca mostra a que veio, sendo uma geniazinha precoce não muito diferente da própria Shuri.

Namor, por outro lado, faz jus à figura complexa que é nos quadrinhos. Um poderoso monarca que ama seu povo, mas que é implacável com seus inimigos. Tenoch Huerta é ótimo em nos fazer sentir o afeto que Namor tem por aqueles que são próximos a ele e como o monarca pode ser extremamente cruel e desumano com aqueles que cruzam seu caminho.

Nesse sentido, a decisão em transformar o reino submarino de Namor em uma nação mesoamericana se mostra acertada tanto para diferenciar Talokan da Atlântida apresentada pela DC em Aquaman (2018), quanto para tratar das ideias sobre colonialismo que o filme tenta abordar. Considerando que Talokan, assim como Wakanda, é uma nação não branca e não colonizada, o fato de que pressões externas forçam um conflito entre as duas reflete fielmente o processo de colonização do mundo real quando colonizadores, de olho nas riquezas das nações colonizadas, colocavam grupos nativos para brigarem entre si, se enfraquecendo e facilitando o domínio dos colonizadores.

Foi assim no Brasil, com os portugueses estimulando guerras entre diferentes nações indígenas ou com os ingleses estimulando o conflito de Brasil e Argentina com o Paraguai. Foi assim na África com diferentes potências europeias colocando nações rivais sob as mesmas fronteiras, estimulando conflito entre elas a exemplo dos hutus e tutsis em Ruanda. Nesse sentido, o filme é esperto em sugerir que Shuri e Namor deveriam deixar de lado as desavenças já que existem inimigos maiores para ambos pairando no horizonte.

Além do trabalho de Tenoch Huerta, é possível destacar o trabalho de Letitia Wright e Angela Bassett no modo como elas constroem uma afetividade poderosa em sua relação de mãe e filha, bem como na dor do luto que compartilham. Eu também não poderia deixar de mencionar como Winston Duke tem aqui espaço para explorar outras facetas de M’Baku. Se em filmes anteriores ele estava restrito a um rival ou alívio cômico, aqui ele mostra o líder astuto, maduro e compassivo que o guerreiro pode ser, funcionando como um importante conselheiro para Shuri.

O filme também conta com ótimas cenas de ação que mostram, por exemplo, o poder e a letalidade de Namor, que não é apenas um combatente formidável na água, como também fora dela graças a sua habilidade de voar. Okoye (Danai Gurira) também tem bons momentos em seus duelos contra Attuma (Alex Livinalli), que mostram como a líder das Dora Milaje é tão habilidosa que luta quase que em pé de igualdade contra a superforça do guerreiro Talokani. Apesar de toda a qualidade visual da ação, não consigo deixar de pensar em como a emboscada final a Namor é estúpida. Levar a batalha para o meio do mar, onde o inimigo tem vantagem e facilidade em mover mais números é uma decisão estrategicamente suicida, principalmente quando o inimigo já tinha avisado seu próximo ataque e a capital de Wakanda já tinha sido evacuada. Porque não emboscar Namor lá, onde eles tem domínio do território, ao invés de um espaço onde o inimigo é mais forte? É por pura sorte que todo o empreendimento não termina em massacre para Wakanda.

Não dá para deixar de comentar algumas questões técnicas e como algumas cenas são tão escuras ao ponto de serem quase incompreensíveis e olhe que não assisti em uma sessão 3D em que o óculos pudesse obscurecer a imagem. Cheguei a pensar que pudesse ser alguma coisa relacionada ao projetor da sala em que estava assistindo, mas conversando com outras pessoas percebi que não era um evento singular. Cenas como a que Namor se revela a Shuri e Ramonda pela primeira vez são tão escuras que chega a ser difícil entender o que estava acontecendo. Não sei se foi um problema na conversão do arquivo para ser exibido no cinema, se já foi filmado assim ou se algo que aconteceu durante os processos de correção de cor e imagem na pós produção, mas sinceramente espero que isso seja resolvido, provavelmente quando sair em home video.

Ainda que por vezes perca seu foco e tenha problemas entre contar sua história e se acomodar às demandas de outras tramas do universo Marvel, Pantera Negra: Wakanda Para Sempre se sustenta pelo cuidado com que trabalha o luto por seu astro ausente e pela qualidade de seu elenco.

 

Nota: 7/10


Trailer

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