A trama é protagonizada por Tess (Georgina Campbell) que viaja a Detroit para uma entrevista de emprego e aluga uma casa via aplicativo. Chegando lá Tess descobre que há outra pessoa no local, Keith (Bill Skarsgard), que alugou a mesma casa via aplicativo diferente. Sem conseguir outro lugar para ficar, Tess aceita dividir a casa com Keith, mas fica alerta com o comportamento do desconhecido.
De início imaginamos que o filme irá girar em torno desse desconforto social de ser mulher e ser colocada em um espaço com um homem estranho. Como vemos tudo sob a perspectiva de Tess, imediatamente suspeitamos de Keith e de suas atitudes aparentemente gentis, como oferecer chá. O fato de Keith comentar que é “um cara legal” e que o chá não tem nada para dopar Tess só amplia nossa desconfiança. Claro, muito da tensão vem da escalação de Bill Skarsgard, famoso por viver monstros em filmes de terror (como o palhaço Pennywise), já imaginamos que o personagem interpretado por ele será alguém sinistro.
Dessas tensões iniciais o filme se desenrola por caminhos bem inesperados e bem doidos em relação ao que parecia ser seu encaminhamento inicial, mas ainda assim a trama segue examinando a experiência social feminina. De certa forma é sobre como o mundo é tão insalubre para as mulheres que elas precisam estar constantemente em estado de alerta e desenvolvem uma certa capacidade de navegar situações de tensão.
Um dos mais tradicionais clichês de filmes de terror é o da chamada “final girl”, a mocinha que é a única sobrevivente no desfecho dos filmes normalmente por possuir algum atributo que um olhar masculino consideraria como “virtude”, tipo ser casta. Aqui, no entanto, o que garante a sobrevivência de certas personagens femininas é que elas estão tão habituadas a esperarem o pior e a manterem a guarda levantada que se tornam mais hábeis em lidar com ameaças ou navegar situações sociais em que precisam interagir com os predadores. Os homens, por outro lado, são destruídos pela própria soberba de acharem que estão no controle, subestimando as ameaças por nunca crerem que estão em perigo. Acostumados a se sentirem seguros, os homens baixam a guarda e pagam o preço por isso.
A ideia de que apenas mulheres conseguem entender como é existir em um mundo de perigo constante reverbera até mesmo na criatura que persegue os personagens e acaba desenvolvendo uma espécie de laço materno (ou o que essa criatura julga como tal) com Tess. Isso ajuda a humanizar o monstro e conforme descobrimos sua origem percebemos que ela também é vítima de homens predadores, tanto que a única vez que a criatura demonstra medo ou hesitação é diante de um determinado personagem masculino.
Não é à toa, portanto, que o clímax mostra como a soberba masculina e o modo como homens tratam mulheres como objetos descartáveis pode ser mais perigoso que qualquer monstro. A ideia de que a resiliência diante da conduta predatória dos homens une a criatura e outras personagens femininas do filme reverbera na cena final quando a bizarra entidade se permite ser eliminada, como que reconhecendo que ela se tornou exatamente o tipo de predador que temia e que destruiu sua vida.
Com uma trama que nos leva por
caminhos imprevisíveis e uma tensão que se constrói ao redor do pavor social
experimentado cotidianamente por mulheres, Noites
Brutais é um terror envolvente e criativo que reflete sobre o olhar
masculino presente no gênero.
Nota: 8/10
Trailer
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