quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Crítica – Triângulo da Tristeza

Análise Crítica – Triângulo da Tristeza

 

Review – Triângulo da Tristeza
Em The Square: A Arte da Discórdia (2018) o diretor Ruben Ostulund comentava sobre a fragilidade da civilidade e as hipocrisias fúteis dos mais ricos de uma maneira tão abrangente que chegava a ser superficial. Em Triângulo da Tristeza ele faz mais do mesmo e repete os mesmos problemas.

A trama começa acompanhando o casal de modelos Carl (Harris Dickinson) e Yaya (Charlbi Dean) que ganham uma viagem em um cruzeiro de luxo. Lá eles encontram vários ricaços excêntricos como passageiros e a trama acompanha as tensões entre passageiros e tripulação. A situação muda depois que o navio é atacado por piratas e todos são deixados em uma ilha deserta, precisando depender das habilidades da tripulação para sobreviver.

Assim como em seu filme anterior, Ostlund comenta sobre a alienação dos mais ricos e como eles tratam quem está abaixo deles como objetos a serem dobrados segundo suas vontades e caprichos, além de comentar de como o verniz de civilidade e polidez que envolve as relações sociais é facilmente diluído em situações de crise. Não apenas não há nada de novo aqui, como a produção se estende mais do que necessário em comentários redundantes, metáforas óbvias e escatologia simplória.

O magnata russo que se tornou rico com estrume é um símbolo bem explícito da visão do filme de que bilionários enriquecem em cima de qualquer porcaria e o fato do personagem passar boa parte do filme dizendo “eu vendo merda” martela sem sutileza a mensagem desejada. O problema nem é que os personagens sejam unidimensionais, isso é esperado de sujeitos feitos para serem caricaturas ridículas, o problema é que essas caricaturas não são engraçadas e repetem sem parar a mesma piada sem graça. Não há aqui o deboche exagerado e mordaz de algo como O Lobo de Wall Street (2013)

Do mesmo modo, o longo segmento dos passageiros vomitando e tendo diarreia durante um jantar chique com o capitão do navio, culminando em imagens das privadas transbordando, usa de uma escatologia imatura para construir uma metáfora visual sobre a podridão interna daquelas pessoas. Poderia funcionar se usada com mais sutileza e não se alongasse tanto, mas do jeito que está parece algo saído de alguma comédia adolescente da década de oitenta.

O segmento do navio até introduz personagens com potencial de render alguma coisa interessante, como o capitão do navio interpretado por Woody Harrelson. Com uma postura marxista e sempre bêbado pelo fato de ter que entreter um bando de ricos babacas, o capitão poderia ser um meio de olharmos para a questão com mais nuance e olharmos o contraditório da conduta humana, no entanto, ele nunca é bem aproveitado de modo a dizer algo consistente.

A chegada na ilha e o modo como os ricaços são completamente despreparados para sobreviverem no ermo, dependendo principalmente da camareira Abigail (Dolly De Leon). Mais uma vez é uma metáfora pouco sutil de como os ricos não produzem nada e é o trabalho do assalariado que provem para a sociedade. O fato da camareira se tornar uma espécie de tirana, inclusive cobrando favores sexuais de Carl comenta a respeito da incivilidade natural do ser humano e como, dadas as condições, a humanidade vai sempre explorar e oprimir o outro. Como em muito do filme são ideias que poderiam funcionar se tratadas de maneira concisa, mas a narrativa expande isso mais do que necessário, estendendo e andando em círculos com essas mesmas ideias por quase uma hora, diluindo sua força.

Na verdade, chama atenção a empáfia com a qual Ostlund conduz todo o filme tratando essas metáforas óbvias e ideias batidas sobre classe como grandes sacadas. Ele dirige tudo como se fosse algo inédito e que nós, espectadores, seríamos incapazes de alcançar essas ponderações não fosse a generosidade do realizador em nos apontar para elas se achando muito mais esperto do que realmente é.

O desfecho em aberto, feito para o espectador preencher o súbito encerramento da trama com sua subjetividade, soa como uma decisão covarde da parte de Ostlund. Durante o filme inteiro ele assume uma posição muito explícita em relação ao conflito de classe que apresenta, mas quando a narrativa leva esse conflito ao extremo da violência o diretor confortavelmente prefere se abster de se posicionar sobre esse aspecto espinhoso e joga isso na mão do público, como que temendo soar radical caso tivesse que defender uma revolução violenta ou conciliador demais se encerrasse com integração e diálogo. Se Ostlund fosse deixando esses espaços de reflexão ao longo do filme faria sentido encerrar de uma maneira mais aberta. O texto, porém, nunca faz isso até esse instante final e faz parecer que Ostulund, apesar de defender claramente uma posição específica o filme todo, teme assumir uma posição quando a coisa toda caminha para ações extremas.

Com isso Triângulo da Tristeza resulta em uma produção rasa, cheia de metáforas óbvias, humor repetitivo e uma trama que se alonga demais sem ter nada de muito consistente a dizer.

 

Nota: 4/10


Trailer

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