quarta-feira, 21 de junho de 2023

Crítica – Black Mirror: 6ª Temporada

 

Análise Crítica – Black Mirror: 6ª Temporada

Review – Black Mirror: 6ª Temporada
Depois de um hiato de quatro anos Black Mirror retorna para sua sexta temporada com alguns de seus episódios mais fracos. É também uma temporada que se volta para elementos de horror sobrenatural ao invés de ficar apenas na tecnologia, o que em si não é um problema para mim, já que sempre vi a série como esse “espelho sombrio” das neuroses humanas cujas histórias recorriam à tecnologia para mostrar como nossa cultura e modo de vida materializa essas neuroses. Ainda assim imagino que muita gente irá ficar decepcionada com a guinada mais ao horror e um foco menor na tecnologia.

O primeiro episódio, Joan is Awful, é centrado em Joan (Annie Murphy), uma mulher aparentemente comum que vê sua vida transformada em série por um serviço de streaming que coletou seus dados. Com a intimidade exposta, Joan tenta entrar em contato com a protagonista da série, Salma Hayek (interpretando ela mesma), para acabar com tudo. É um episódio que reflete sobre a quantidade de poder de monitoramento que damos às plataformas digitais, que coletam quantidades enormes de dados sobre nós sem que saibamos ou fiscalizemos o que elas fazem com isso.

É também uma contundente fala sobre o uso de conteúdo gerado por IA no audiovisual e como a ideia de um ator vender sua aparência para um estúdio produzir conteúdo com ele é apenas uma nova maneira de precarizar o trabalho desse ator, pagando pouco e tirando deles o controle sobre a própria imagem ou representação, do que uma grande inovação que vai melhorar como fazemos arte no audiovisual. É uma discussão relevante principalmente no contexto atual, com uma greve de roteiristas em curso e greve de atores prestes a acontecer nos EUA justamente pelos problemas do uso de IA.

O segundo episódio, Loch Henry, é uma reflexão sobre essa onda de documentários sobre crimes e como plataformas de streaming veem essas histórias meramente como um meio de lucrar do que como uma oportunidade de dizer algo sobre o mundo. Ao longo do episódio vemos que todo o discurso de dar visibilidade a histórias silenciadas é balela e o que essas produções fazem é investir em sensacionalismo para chocar o espectador sem qualquer cuidado em colocar os sobreviventes para reviverem seus traumas, não contribuindo em nada para uma melhora na situação deles, apenas explorando seu sofrimento para ganhar dinheiro.

O terceiro episódio, Beyond the Sea, se passa em um 1969 alternativo com dois astronautas, Cliff (Aaron Paul) e David (Josh Hartnett), em uma missão no espaço ao mesmo tempo em que mantem suas vidas domésticas na Terra através do uso de avatares robóticos que controlam remotamente. Quando uma tragédia acontece com a família de David, isso muda a relação dos dois astronautas. O episódio começa levando a questões instigantes sobre identidade e realismo emocional, mas a partir do momento que os dois personagens começam a compartilhar um avatar fica bem previsível o que vai acontecer e a narrativa se alonga mais do que necessário. É uma pena considerando que começa tão bem.

O quarto episódio, Mazey Day, acompanha uma paparazzi (Zazie Beets) é incumbida de encontrar o paradeiro de uma problemática estrela de Hollywood e tirar fotos dela. Se passando em 2006, o episódio mostra como a internet, mesmo em um cenário pré banda larga, facilita que monitoremos de perto qualquer pessoa e como essa natureza panóptica pode ser tóxica. Ao mesmo tempo, também reflete sobre o modo predatório com o qual a mídia trata celebridades, expondo suas vidas e intimidades mesmo quando isso nada tem a ver com as realizações desses artistas. O problema é quando a trama dá uma guinada ao sobrenatural que não é devidamente construída e que acrescenta muito pouco aos temas centrais, tirando parte do impacto do episódio.

O quinto e último, Demon 79, é o mais fraco da temporada. A narrativa se passa em 1979 e acompanha uma pacata vendedora de loja que toma posse de um talismã demoníaco e é instigada por uma entidade sobrenatural a matar três pessoas para impedir o fim do mundo. É basicamente uma versão piorada do recente Batem à Porta, de M. Night Shyamalan. Se o filme de Shyamalan ao menos tentava produzir alguma reflexão sobre fé e sacrifício, aqui a trama não tem lá muito o que dizer, não há muita tensão ou mesmo pavor na e a reviravolta final não tem lá muito impacto. Há uma tentativa de falar na ascensão do conservadorismo político e os impactos disso nas décadas seguintes, mas, como o resto das ideias do episódio, o tema é pouco explorado e acaba não servindo para muita coisa. O problema nem é se afastar dos temas de tecnologia para focar no sobrenatural, eu não teria qualquer questão com isso, o problema é fazer isso de uma maneira tão inane e desinteressante.

Assim, a sexta temporada de Black Mirror é a mais fraca da série até aqui, começando com dois ótimos episódios e decaindo em qualidade nos seguintes.

 

Nota: 6/10


Trailer

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