Visualmente a produção se destaca pelo modo como mistura uma estética medieval com um visual futurista, criando um universo em que cavaleiros de armadura pilotam motos voadoras e castelos futuristas coexistem com arranha-céus e letreiros luminosos na paisagem urbana. Não lembro de nenhuma produção recente que usou uma ambientação assim e isso ajuda a dar personalidade ao universo que a trama tenta criar.
A jornada para provar a inocência de Ballister aproxima Nimona e o cavaleiro, com essa amizade sendo fundamental para que o filme chegue em seus temas principais. A investigação leva a dupla a descobrir algumas verdades ocultas sobre o reino e como a suposta invasão de monstros na verdade não passava de uma criação do preconceito das pessoas do passado e que a ideia de monstros existia basicamente para sustentar o ódio e perseguição a qualquer um diferente, como Nimona.
A narrativa mostra como é fácil criar um inimigo e mobilizar as pessoas a odiá-lo por simplesmente remover sua humanidade. Ao ver o diferente como uma criatura e não como alguém que tem os mesmos sentimentos que eu, ao enxergar a diferença como uma ameaça ao nosso estilo de vida ao invés de outra possibilidade de existência, removemos a possibilidade de nos aproximarmos do outro. Passamos a enxergar o outro como uma criatura, algo menos humano, e se é menos humano podemos agir com eles com uma crueldade ou violência que não conseguiríamos usar contra nossos semelhantes.
A vilã e seu discurso de proteção “do modo de vida” tem sua hipocrisia revelada durante o clímax, mostrando que o que ela entendia como modo de vida não tinha nada a ver com a proteção das pessoas (já que ela tenta usar uma arma perigosa sem se preocupar com baixas civis) e sim com a manutenção de uma estrutura excludente e de privilégios que manteria estagnada a estratificação social daquele povo e nenhuma chance de mudança para classes menos privilegiadas. A retórica de “defesa da tradição”, é, portanto, desvelada aqui como uma defesa de um status quo excludente e preconceituoso e da liberdade de continuar a exercer seus preconceitos.
Nada disso, no entanto, funcionaria se não houvesse sentimento genuíno na construção da amizade entre Ballister e Nimona que nos conectasse a protagonista e oferecesse um meio crível para que ela baixasse suas defesas e revelasse o passado que põe abaixo todas as crenças que fundamentavam aquela sociedade. Chama atenção a sutileza de como o filme trabalha as interações entre a dupla e os sentimentos em jogo a cada troca entre eles. Esse realismo emocional que nos mantem investidos mesmo quando boa parte das reviravoltas e revelações sobre o passado desse mundo soam previsíveis
Isso fica evidente, por exemplo, na cena em que Ballister demonstra surpresa ao ver Nimona cuspindo fogo e a garota imediatamente assume um semblante defensivo, como se esperasse que Ballister fosse rejeitá-la naquele momento (provavelmente por já ter passado por isso várias vezes antes), apenas para voltar a demonstrar alegria quando o cavaleiro mostra ter gostado do gesto dela, dando a Nimona um acolhimento e aceitação que ela não esperava obter e provavelmente não tinha recebido antes. É uma cena que mostra toda a dor que a menina carrega e o que a aceitação de Ballister significa para ela sem precisar explicitamente dizer isso ao espectador nem ficar chamando atenção aos gestos e expressões dos personagens de maneira exagerada.
Mesclando aventura, comédia e um
senso de encantamento com uma mensagem sobre tolerância e uma jornada emocional
envolvente para seus personagens, Nimona é
uma grata surpresa.
Nota: 8/10
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