segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Crítica – Sea of Stars

 

Análise Crítica – Sea of Stars

Review – Sea of Stars
Desenvolvido pela Sabotage, mesmo estúdio responsável pelo ótimo The Messenger, que misturava ação ao estilo Ninja Gaiden com exploração metroidvania, Sea of Stars é um RPG que homenageia produtos da era 16 bits como Chrono Trigger, Super Mario RPG ou Star Ocean. Ao contrário de muitos games indie que tentam esse tipo de construção referencial, Sea of Stars vai além da mera referência e cria um produto com personalidade própria, cuja força da trama, construção de mitologia e mecânicas de combate e exploração são bem mais do que uma colagem de elementos de games de outrora.

A trama se passa no mesmo universo de The Messenger, mas ele não é necessário para entender a história, já que ela se passa séculos antes. Claro, quem jogou The Messenger vai apreciar como elementos do jogo, como o templo do sol e da lua ou os cristais temporais ganham mais contexto aqui, mas não faz diferença no entendimento da narrativa. Centrada em Valere e Zale, dois guerreiros nascidos no solstício e dotados de poderes vindos da lua e do sol, respectivamente, que recebem a missão de cruzar o mundo para derrotarem horrores abissais conhecidos como Residentes para impedir o retorno do poderoso Fleshmancer.

É uma trama que começa bem típica, com guerreiros da profecia contra um mal ancestral, mas surpreende pelas reviravoltas que apresentam e pelo cuidado com o desenvolvimento de seus personagens. É raro um game que parte de uma premissa tão batida conseguir me pegar desprevenido com as guinadas da trama, mas ele consegue encontrar caminhos inesperados para levar seus personagens e nisso testa as relações entre os protagonistas e reforça a amizade entre eles, oferecendo momentos eficientes de emoção.

O combate segue a estrutura de batalhas por turnos, mas ao invés de uma barra de tempo ou ordem pré-determinada, o jogador pode selecionar na ordem que quiser as ações dos três membros do grupo ativo a cada turno e os inimigos tem um contador que indica em quantos turnos eles irão atacar. Apesar de só levar três personagens para as batalhas, eles podem ser trocados livremente durante os combates.

Como em Chrono Trigger os inimigos são visíveis no mapa e o posicionamento dos personagens durante o combate é importante porque alguns golpes especiais atingem áreas específicas. Também semelhante a Chrono Trigger os personagens podem realizar ataques combinados, mas ao invés de usar pontos de mana, esses ataques usam uma barra de combo que enche aos poucos conforme os personagens agem. Golpes normais e ataques especiais podem causar mais dano se um botão for pressionado em momentos específicos, similar a Super Mario RPG, e ataques recebidos podem ter dano reduzido ao fazer o mesmo.

A questão é que nem sempre fica claro o momento de agir e a janela para tal em muitos casos é muito curta, sem qualquer opção de ampliar esse tempo ou dar mais indicadores. Sim, há a opção de mostrar visualmente quando você acertou, mas até lá é muita tentativa e erro e as vezes ainda assim não tenho certeza de qual é o momento certo. Se ao menos tivesse um espaço para treinar para que o jogador pudesse dominar isso sem precisar desperdiçar golpes especiais contra inimigos seria muito bem vindo.

A principal novidade em termos de combate são as “travas” que aparecem sobre os inimigos quando eles estão perto de executar um ataque poderoso. Essas travas apresentam ícones de tipos de armas ou de dano elemental e usar os golpes indicados pelas travas pode diminuir o dano do ataque vindouro ou mesmo parar a ação do inimigo caso o jogador acerte todas as travas a tempo. É uma mecânica que encoraja o jogador a pensar estrategicamente com os recursos que tem em mãos e estar sempre atento às habilidades de cada personagem e às ações dos inimigos. As batalhas contra chefes muitas vezes tem mecânicas próprias, como carregar uma célula de energia para atacar o inimigo ou manter runas ativas para poder causar dano na criatura, esses elementos ajudam a manter o frescor dos combates e dar a eles um certo grau de imprevisibilidade.

Além de Valere e Zale, o jogador encontra outros três personagens ao longo da campanha, cada um com suas próprias habilidades. Nas batalhas contra os Residentes apenas os dois guerreiros do solstício conseguem causar dano significativo, mas a maneira como esses combates são estruturados sempre dá aos demais personagens algo para fazer. Subir de nível logicamente aumenta os atributos dos guerreiros, mas também dá ao jogador a oportunidade de conceder a cada personagem um bônus em um atributo específico, algo similar ao que acontecia em Super Mario RPG. A mecânica dá algum grau de experimentação para o usuário testar diferentes maneiras de construir seus personagens.

A exploração conta com várias opções de mobilidade, permitindo escalar plataformas, saltar pequenos espaços ou usar ferramentas como um arpéu para cobrir grandes distâncias. Com isso as áreas oferecem um nível de verticalidade que raramente vemos em games que evocam um visual bidimensional. O level design é eficiente em nos dar indicações visuais das diferenças de altura, distância e o com o que podemos interagir de modo que nunca ficamos perdidos ou sem saber como navegar por certos espaços, como acontece em games como CrossCode. Por outro lado, incomoda que só seja possível salvar em save points e que o autosave aconteça em momentos tão espaçados, é o tipo de elemento arcaico de design que já devia ter sido abandonado.

Viajar pelas diferentes áreas também envolve resolver quebra-cabeças que exigem certo raciocínio, mas nunca se tornam frustrantes, oferecendo maneiras criativas de usar os poderes de Valere e Zale e mover a posição do sol e da lua nos céus. Durante a exploração também é possível coletar ingredientes para cozinhar, que é o principal meio de obter itens de cura.

Os cenários se beneficiam pelo design que lhes dá variedade e personalidade próprias, indo de florestas outonais passando por castelos mecânicos ou mansões mal assombradas que são elevados pela belíssima pixel art que enche cada espaço de detalhes e cada personagem de vários frames de animação que ajudam a transmitir suas personalidades. Os efeitos de luz, sombra, névoa e partícula dão a esses visuais uma nuance e um senso realista de iluminação, perspectiva e movimento que os RPGs de 16 bits não seriam capazes de realizar.

A música traz alguns remixes de temas musicais de The Messenger, já que Sea of Stars compartilha áreas semelhantes e também temas originais compostos por ninguém menos que o venerável Yasunori Mitsuda, compositor de games como Chrono Trigger e Chrono Cross. As faixas compostas por Mitsuda trazem o senso de encantamento, grandiosidade, aventura e lirismo contemplativo que o tornaram célebre e ajudam a criar uma paisagem sonora marcante para Sea of Stars.

Sea of Stars pode não inovar muito em termos de combate, mas executa esses elementos com bastante competência, além de criar uma narrativa envolvente, personagens carismáticos e visuais deslumbrantes, se elevando para além de uma mera colagem de referências de games de outrora para criar uma experiência verdadeiramente memorável. O jogo foi lançado no catálogo da Xbox Game Pass e da PS Plus Extra, estando gratuito para os assinantes desses serviços.

 

Nota: 8/10


Trailer

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