terça-feira, 21 de novembro de 2023

Crítica – Napoleão

Análise Crítica – Napoleão


Review – Napoleão
Dirigido por Ridley Scott, Napoleão funciona mais como um estudo de personagem do que como um épico histórico. Digo isso porque a trama é mais interessada na relação de seu personagem título com esposa e o que motiva suas ações do que em grandes batalhas ou em todo o contexto das Guerras Napoleônicas. Não que essa escolha seja um problema, apenas aviso para que ajustem suas expectativas.

A trama acompanha Napoleão (Joaquin Phoenix) a partir de sua ascensão no exército após a revolução francesa. Com suas primeiras vitórias ele se consolida em uma posição de liderança e se casa com a bela Josefina (Vanessa Kirby) enquanto suas ambições o impelem a almejar cada vez mais.

O filme é, em essência, um estudo sobre essa ambição desmedida que coloca a busca por grandeza acima de tudo, sacrificando até mesmo a relação com a mulher que ama, e o que impele essa busca. A narrativa constrói Napoleão como um bruto vulgar dotado de certo complexo de inferioridade por vir de uma família humilde ao contrário dos aristocratas ricos que o cercam. Assim, o personagem age como se sempre tivesse algo a provar e seu desejo de conquista, bem como a vaidade com a qual exibe sua inteligência tática, se mostram fruto dessa tentativa de ser visto como alguém grandioso.

Nesse sentido não é acidente que Scott filme muitas tomadas de Napoleão em palácios e amplos ambientes em planos abertos que evidenciam a pequenez do protagonista diante da imensidão que o cerca. A impressão é que quanto mais grandiosa é sua posição, menor ele parece. Tanto que ao conquistar o Egito e saquear antigas tumbas Napoleão precisa subir em um caixote para olhar um faraó mumificado nos olhos. É como se o filme nos mostrasse aí como a conquista napoleônica é menor que os feitos dos egípcios.

O foco na relação de Napoleão com a esposa revela como muito de seu desejo por ela vinha do fato de que ele sabia que não a tinha totalmente considerando os vários amantes que ela tem ao longo da vida. Há aí um misto de rebelião contra a emasculação que o adultério da esposa representa para ele e a vontade de domar alguém que lhe parece indomável. É uma relação que está longe de ser saudável, mas tanto Phoenix quanto Kirby nos fazem ver que apesar de tudo existe um amor real e intenso entre eles. Kirby, por sinal, reveste Josefina de dualidade. Uma mulher que aprendeu a sobreviver sob as piores condições e transita entre frágil ou dominadora dependendo do que lhe é mais vantajoso.

Por outro lado, muito do ambiente político da época ou a campanha de Napoleão contra os ingleses é representado de modo muito passageiro, com muitos saltos temporais e muitos eventos acontecem sem a devida contextualização, provavelmente deixando quem não tem conhecimento prévio de história boiando em alguns desdobramentos. Claro, o filme exibe algumas batalhas que servem para ilustrar a astúcia militar do protagonista, mas muita coisa é mostrada apenas de passagem.

O mesmo acontece com outros relacionamentos chave da vida de Napoleão. Muito é dito a respeito de sua mãe ser a mulher mais importante de sua vida depois de Josefina, no entanto, vemos efetivamente muito pouco dessa relação e nas poucas cenas que os dois tem juntos o filme não consegue nos fazer ver o quê de tão influente a mãe dele tinha. Do mesmo modo, vemos Napoleão empreender uma longa busca por uma segunda esposa ao descobrir que Josefina não pode lhe dar filhos. Quando ele finalmente consegue se casar novamente, a esposa e o filho são deixados de lado a despeito dele passar boa parte do filme dizendo que queria um herdeiro.

A impressão é que estamos vendo algo condensado de uma história maior, algo que se confirma com a informação de que o filme chegará na AppleTV+ com uma “versão do diretor” de quase quatro horas de duração. Ora, se Apple, que produziu o filme, deixou Scott produzir esse corte mais longo e ele parece ser a real versão da história que ele quer contar, porque não lançar esse corte nos cinemas ao invés de vender ao público um produto que soa incompleto. A impressão é que tudo é feito por ganância, para fazer as pessoas gastarem tanto com o ingresso para ver o corte de cinema quanto com a assinatura de streaming para ver o corte longo, uma estratégia bem picareta de ampliar os lucros da produtora.

Assim, apesar de apresentar um competente estudo de personagem, Napoleão soa demasiadamente fragmentado, saltando entre vários eventos sem a devida construção. Talvez a versão estendida a ser lançada em streaming resolva melhor isso.

 

Nota: 6/10


Trailer

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