A trama acompanha um assassino (Michael Fassbender) completamente devotado à sua profissão e que é famoso por entregar o que promete. Quando uma tentativa de assassinato dá errado, ele foge para evitar ser pego e inicia uma corrida contra o tempo para evitar que as consequências desse erro atinjam aqueles que conhece. De certa forma a trama poderia ser enquadrada como uma narrativa de vingança de um assassino subindo na cadeia de comando para eliminar aqueles que tentaram destruí-lo depois do erro. Não deixa de ser isso, no entanto, Fincher pega essa estrutura banal para refletir sobre a natureza do perfeccionismo e como esse esforço de estar sempre no controle está fadado ao fracasso.
Já na primeira cena, ao mostrar toda a preparação meticulosa de seu protagonista, o filme nos mostra o nível de atenção aos detalhes que o assassino tem e como ele busca não deixar nada ao acaso. A maneira como Fincher conduz tudo, com cortes breves e precisos, contribuir para impor esse ritmo meticuloso e deliberado na trama. Ao mesmo tempo, a escolha de ter o personagem constantemente sozinho em cena, com planos mais abertos que nos deixam ver a amplitude dos espaços vazios que ele habita, ajudam a transmitir o isolamento e alienação desse personagem em relação ao mundo. A decisão de mostrar cada elemento de sua preparação, inclusive seus alongamentos e os longos momentos de espera visam mostrar o tédio e os tempos mortos que envolvem a atividade, um retrato menos romantizado ou glamouroso do que aqueles normalmente contidos em filmes hollywoodianos.
Toda essa preparação meticulosa, porém, não é o suficiente para impedir que o protagonista falhe. Ao longo de sua jornada, suas ações para se manter vivo aos poucos começam a ir de encontro ao rígido código que recita em sua cabeça e que ouvimos na forma de narração. Todo o arco do personagem é, de certa forma, um exame sobre a futilidade do perfeccionismo. De como não é possível controlar tudo o tempo todo e se não nos abrirmos ao acaso ou fizermos concessões a nossos métodos rígidos provavelmente não teremos como sobreviver. É como se através dessa história Fincher reavaliasse sua própria postura diante do cinema e de como fazer filmes requer uma certa dose de improviso e abertura por mais meticuloso que um realizador seja.
O filme também comenta sobre a chamada “gig economy”, a atual estrutura produtiva em que todos somos profissionais liberais trabalhando para contratantes que por sua vez trabalham para contratantes e assim sucessivamente. Na busca por quem pode ir atrás dele o assassino lida com intermediário atrás de intermediário revelando algum grau de “banalidade do mal” nesse modelo produtivo em que todo mundo só está cumprindo ordens de alguém e ninguém é responsável por nada já que estava apenas realizando um serviço avulso para o qual foi contratado sem qualquer entendimento sobre o quadro geral numa estrutura fragmentada em que as pessoas são cada vez mais descartáveis.
Por outro lado essa subida do assassino ao longo da cadeia produtiva acaba soando um pouco redundante em certo momento, já que chega um ponto em que o filme diz o que precisava ser dito sobre esses aspectos, mas ainda assim continua a dar mais e mais degraus para o protagonista. Poderia ser mais conciso e ter uns vinte minutos a menos para não se tornar tão cansativo. Eu entendo que há uma intenção clara de transmitir um senso de tédio e repetição no cotidiano do protagonista, a questão é que o filme consegue nos fazer entender isso e ainda assim estende essas ideias mesmo quando já disse tudo a respeito delas.
Com um ritmo deliberado e uma condução precisa, O Assassino traz David Fincher
examinando o peso do perfeccionismo.
Nota: 8/10
Trailer
Nenhum comentário:
Postar um comentário