quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Crítica – Argylle: O Superespião

 

Análise Crítica – Argylle: O Superespião

Review – Argylle: O Superespião
Os trailers de Argylle: O Superespião não me despertaram nenhum interesse em assistir o filme. Ainda assim, tinha alguma esperança que pudesse ser bacana pela condução de Matthew Vaughn. Tendo visto o filme, porém, posso dizer os trailers dão uma impressão errada do produto final. Na verdade ele é ainda pior e mais estúpida.

A trama é protagonizada por Elly (Bryce Dallas Howard), escritora responsável por criar o personagem literário Argylle (Henry Cavill) que se tornou um sucesso mundial. Durante uma viagem de trem ela é abordada pelo espião Aidan (Sam Rockwell) e descobre que seus livros narravam uma conspiração internacional verdadeira. Agora ela e Aidan correm contra o tempo para encontrar um arquivo que irá expor uma unidade de espiões renegados dentro da CIA.

A ideia de uma civil escrever acidentalmente a respeito de uma conspiração real já soava idiota, mas fica pior conforme o filme insere reviravoltas que tentam explicar como isso aconteceu, porém só deixam a trama ainda mais frágil, saindo de uma coincidência pouco convincente para a contradição direta. As coisas simplesmente desabam assim que o filme insere uma reviravolta envolvendo a família de Elly e a partir daí a produção deixa de fazer qualquer sentido.

Se o vilão interpretado por Bryan Cranston estava tão próximo e tinha tanta influência sobre a heroína, porque despachar capangas para matá-la de modo que ela precisaria ser salva por Aidan? Em uma cena mais adiante, uma personagem que Elly acredita ser sua parente aponta uma arma para ela e essa decisão não faz o menor sentido. Seria mais fácil convencê-la de Aidan era o vilão da história do que se revelar para ela como a real antagonista.

As muitas reviravoltas acabam entrando em contradição com informações previamente estabelecidas. Em um dado momento é dito que os livros de Elly previram incidentes geopolíticos antes de acontecerem, mas posteriormente sabemos que as histórias são operações que aconteceram de verdade. Se ela publicou os livros depois que os incidentes aconteceram como é que eles são considerados previsões? Quando as reviravoltas não revelam as fragilidades da trama, elas são altamente previsíveis, a exemplo da revelação envolvendo a hacker vivida por Ariana DeBose perto do final.

O humor tenta funcionar como uma paródia de histórias antigas de espionagem, mas o próprio diretor Matthew Vaughn já fez isso melhor no primeiro Kingsman (2014). Aqui a sátira gira em torno de apresentar um desenvolvimento completamente estúpido e então colocar os personagens para comentar o quanto isso é estúpido ao mesmo tempo em que mantem esse evento estúpido no filme, fazendo tudo soar mais preguiçoso do que engraçado. É como se no processo da escrita tivessem se dado conta de que o material era ruim e aí ao invés de reescrever colocaram piadinhas sobre como o material é ruim sem mudar nada. Em geral o filme nunca consegue equilibrar bem a comédia e os momentos em que tenta ser um thriller mais sério, resultando em uma bagunça tonal que faz tudo ficar inconsistente.

Outra tentativa de fazer humor é colocar Elly para ver o personagem fictício Argylle no meio da ação, colocando-o para fazer piscadinhas sedutoras ou falar frases de efeito, mas o expediente logo cansa pela repetição. A ação é competente, embora boa parte dos embates não tenha nada muito digno de nota, falhando em despertar qualquer senso de urgência ou de que há algum risco palpável, já que todos os adversários são facilmente despachados. A única cena de ação minimamente interessante é a que envolve uma personagem patinando por uma sala cheia de óleo.

Bryan Cranston consegue conferir gravidade ao seu vilão, mas é sabotado por um texto que o faz agir como se ele quisesse ser derrotado pelos heróis, demorando de agir ou deixando passar chances de eliminá-los, tipo parar e dar um longo discurso quando os tem acuados ao invés de matá-los de vez. É o tipo de presepada que Vaughn satirizou muito bem em Kingsman e aqui passa batido. Sam Rockwell sabe muito bem construir a canastrice e sarcasmo de Aidan, seguindo também sua tradição de dançar em todos os filmes que participa. Seu personagem é responsável pelos momentos mais divertidos do filme, embora não sejam muitos e sua alergia a gatos dependa da conveniência do roteiro. A verdade é que Rockwell, John Cena e Catherine O’Hara (a eterna mãe do Kevin de Esqueceram de Mim) acabam desperdiçados em um texto sem graça.

O filme ainda exibe uma cena no meio dos créditos que faz referência ao universo Kingsman. Como muito no filme não faz muito sentido, não tem muita razão de estar ali e provavelmente só existe porque Hollywood não consegue fazer mais blockbusters que não tentem construir universos compartilhados ou que deixem múltiplos ganchos para continuações ou spin-offs. É o tipo de coisa que parece ter sido pensada em uma reunião de executivos de estúdio e sedimenta a impressão de que Argylle: O Superespião não é muito mais do que um produto corporativo cínico e sem alma.

 

Nota: 2/10


Trailer


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