A garota (Sheila Vand) vaga pelas ruas da ficcional Bad City em busca de vítimas para se alimentar. Seu caminho cruza com o de Arash (Arash Marandi), um jovem descolado e solitário preso entre os hábitos destrutivos do pai viciado, Hossein (Marshall Manesh), e a opressão do traficante Saeed (Dominic Rains). O modo como as vidas da garota e de Arash se cruzam acaba por transformar a vida de ambos.
Todo filmado em preto e branco, a fotografia cheia de sombras angulosas e paisagens decadentes remete ao expressionismo alemão do início do século XX e a filmes como o seminal Nosferatu (1922). Mais do que um diálogo intertextual com um dos primeiros filmes de vampiro, essas escolhas estéticas visam construir uma atmosfera de pavor, solidão e desamparo que se estende para as decisões dos espaços usados na cidade.
A ficcional Bad City é uma cidade tomada por paisagens industriais, terrenos baldios e construções decadentes. Não é exatamente o Irã, mas também não é exatamente os Estados Unidos. Os espaços são vazios e opressivos, não parecendo uma cidade pensada para ser ocupada por pessoas, para oferecer lazer ou acolhimento. É um local que soa desolador e contribui para o clima de solidão e desalento dos personagens.
A montagem, que usa poucos cortes e planos bastante longos contribui para os momentos de introspecção dos personagens, se detendo neles longamente ressaltando a solidão e ausência de conexão humana que os aflige. Mesmo quando as pessoas estão juntas, como nas cenas com a garota e Arash temos longos períodos de silêncio que reforçam essa natureza mais contemplativa.
Em termos de construção visual não posso deixar de mencionar a sacada que a caracterização da garota, cujo véu que cobre todo o corpo e a deixa apenas com o rosto a mostra a faz parecer um espectro vagando na noite. O modo como véu se movimenta e como ela mexe nele quando persegue suas presas remete às longas capas usadas por vampiros em filmes de outrora, como os Dráculas de Bela Lugosi ou Christopher Lee.
A garota, cuja origem nunca é explicada, serve de metáfora para o senso de opressão que toma esses personagens. As figuras que encontramos ao longo do filme são pessoas que sentem que não tem para onde ir, que não tem controle sobre suas vidas e ela seria mais um elemento de ameaça. Ao mesmo tempo a garota é também uma espécie de veículo de justiça social, se aproximando de homens que estariam tentando se aproveitar de uma garota como ela e virando a mesa sobre eles, transformando esses homens em vítimas de uma predadora insaciável. É o que ela faz com Saeed, por exemplo. Essa postura de justiceira também é vista na cena em que ela assusta um garoto na rua e promete vigiá-lo caso não mude o comportamento.
A aproximação entre ela e Arash, porém, desloca o filme de algo mais próximo do horror para uma trama de romance que reflete sobre a solidão e o tédio de uma juventude que se sente sem perspectiva de futuro e com dificuldade de forjar conexões emocionais. O uso constante de canções indie nas cenas entre os dois é o meio que os personagens de externar seus sentimentos, como a maioria das músicas que eles ouvem evocando a melancolia e solidão que envolve a existência de ambos e esses sentimentos compartilhados fortalecem a conexão entre os dois.
Misturando gêneros e estéticas, Garota Sombria Caminha Pela Noite é um
daqueles filmes que não se pode facilmente rotular, cuja bricolagem de
referências resulta em algo maior que a soma das partes e cria um filme que
envolve por sua personalidade singular.
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