quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Crítica – Borderlands

 

Análise Crítica – Borderlands

Review – Borderlands
Nos últimos anos tivemos boas adaptações de games como The Last of Us (2023) ou Fallout, então é de se esperar que Hollywood tente explorar esse filão, principalmente em um contexto de desgaste de filmes de super-heróis. Borderlands adapta o game de mesmo nome da desenvolvedora Gearbox e, ao contrário dos exemplos citados, é mais um filme ruim baseado em games.

Problemas na produção

O longa teve uma produção turbulenta, com atrasos, material sendo reescrito (Craig Mazin, de Chernobyl e The Last Of Us escreveu uma primeira versão do roteiro e pediu para ter seu nome removido dos créditos quando as mudanças se afastaram de sua visão inicial) e posteriores refilmagens que não contaram com a presença do diretor Eli Roth. É o tipo de coisa que já não dá muita esperança que o resultado vá ser ruim e entrei para assistir esperando algo que sequer conseguisse fazer o mínimo de sentido em sua trama. Os problemas do filme não chegam a tanto, ao menos ele conta uma história com começo, meio e fim, o que é o mínimo a se esperar.

Se os games são famosos por seu senso de humor insano e violência sádica é compreensível a escolha de Eli Roth. Responsável por filmes como O Albergue (2005) ou Feriado Sangrento (2023), Roth é famoso pela brutalidade de seus filmes e personagens bizarros, entretanto nada disso está presente no filme, provavelmente pelas várias intervenções que a produção sofreu.

A narrativa é protagonizada por Lilith (Cate Blanchett), uma caçadora de recompensa que é contratada pelo poderoso Atlas (Edgar Ramírez) para ir ao remoto planeta Pandora resgatar sua filha Tina (Ariana Greenblatt) que foi levada pelo soldado desertor Roland (Kevin Hart) e pelo furioso Krieg (Florian Munteanu). Lá ela descobre que a garota está conectada pela busca da mítica Arca, um cofre oculto criado por uma raça alienígena extinta e que pode guardar segredos poderosos.

Violência domada

É curioso que apesar do jogo ser lotado de uma violência tão exagerada que chega a ser cômica, com cabeças explodindo a cada tiro certeiro, membros despedaçados e armas elementais que derretem a pele dos inimigos com ácido, eletrocutam eles até deixar os ossos, congelam seus corpos para serem destroçados ou os incendeia até virarem pilhas de cinzas (e que ainda assim deixam quilos de armas, equipamento e dinheiro para o jogador coletar), o filme praticamente não derrame qualquer sangue. Os diálogos nos informam a todo o momento como os habitantes de Pandora são brutais, sádicos e violentos, entretanto a violência nunca é de fato construída em cena.

A ação ainda sofre com uma montagem picotada que falha em estabelecer o mínimo de coesão de espaço e tempo, fazendo tudo soar como um monte de fragmentos soltos. Ela também carece da criatividade dos games e todo o tipo de arma maluca que encontramos, desde armas que podem virar explosivos quando descarregadas ou outras que disparam armas menores. Com exceção de Lilith nem mesmo as várias habilidades especiais dos caça-arcas são aproveitadas aqui, com Roland nunca usando sua torreta portátil, por exemplo. Para completar, tudo é permeado por uma computação gráfica pouco convincente, daquelas que deixam evidente que estamos assistindo um bando de atores diante de um fundo verde e que incomoda tanto pela artificialidade quanto pelo desenho de produção genérico que pouco aproveita as locações e criaturas bizarras dos games. Na verdade, há uma espécie de oposição estética, com os personagens tendo visuais coloridos e cartunescos enquanto as paisagens são um borrão genérico de marrons e cinzas dessaturados.

Os caçadores da arca perdida

Cate Blanchett claramente está se divertindo devorando o cenário como uma mercenária durona, e deus sabe que ela merece uma franquia de ação própria para arrancar uma grana fácil de Hollywood e depois poder se arriscar em projetos que lhe interessem mais mesmo que não paguem tão bem. Infelizmente por mais que ela, bem como Ariana Greenblatt e Jamie Lee Curtis pareçam se divertir com suas personagens exageradas, o filme sofre com um humor “padrão Marvel” que consiste em ter todos os personagens fazendo piadinhas e comentários espirituosos o tempo todo mesmo quando não faz sentido para os personagens e que dilui a insanidade e a acidez de personagens como Tina e Tannis.

Quem é mais impactado por isso é Roland. Kevin Hart é um erro grosseiro de casting. Não vou nem entrar no mérito da aparência em relação ao personagem dos games, afinal Tom Cruise também é bem menor do que o Reacher dos livros e ainda assim conseguiu impor uma presença de autoridade e força como o investigador. Hart, porém, nunca convence como um militar de elite experiente, se limitando a repetir a mesma persona que usa em todos os filmes e que não combina com um soldado estoico movido por um senso de dever. Nos games Roland é o sério da trupe, com sua seriedade servindo de escada e contraponto para a maluquice dos demais, ajudando a dar variedade à comédia. Aqui ele só mais um a vomitar piadinhas o tempo todo, tornando a comédia repetitiva, principalmente quando muitos desses diálogos sequer são engraçados.

O Atlas de Edgar Ramírez é um vilão genérico, que falha em representar um senso palpável de ameaça ou em ter qualquer atributo digno de nota. Se a ideia era ter o líder de uma das grandes corporações do universo de Borderlands como vilão porque não usar o Handsome Jack? Líder da corporação Hyperion e principal antagonista do segundo jogo, Jack é o melhor vilão dos games e faria mais sentido do que criar um vilão novo tão inane

Não ajuda que a trama tenha algumas escolhas bem esquisitas em termos de desenvolvimento de personagem, como o fato de que toda a descoberta de Lilith sobre sua herança e habilidades acontecer fora de cena, então quando ela aparece se teletransportando durante o confronto final com Atlas o momento não tem qualquer impacto porque não foi construído. Somos informados da descoberta da personagem ao invés de a vermos descobrindo e lidando com essa revelação a respeito de si.

Por mais que seja legal ver Cate Blanchett como uma heroína de ação durona, Borderlands desperdiça o potencial tanto da atriz quanto do universo aloprado dos games em uma produção sem graça e sem criatividade.

 

Nota: 3/10


Trailer

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