segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Crítica - Meu Filho, Nosso Mundo

Análise Crítica - Meu Filho, Nosso Mundo

Review - Meu Filho, Nosso Mundo
Filmes sobre autismo muitas vezes pecam por excesso, romantizando demais a condição ou focando apenas nas limitações e sofrimento. Meu Filho, Nosso Mundo apresenta um raro equilíbrio no modo como trata essa situação, embora ainda estruture as coisas como uma jornada de superação relativamente previsível.

A trama acompanha o comediante Max (Bobby Cannavale), cujo filho, Ezra (William A. Fitzgerald), sofre na escola e acaba sendo atropelado na rua. O acidente faz Ezra ficar sob tutela do Estado, sendo forçado a tomar medicação e sendo colocado em uma instituição psiquiátrica. Sentindo-se impotente em proteger o filho, Max sequestra Ezra e o leva consigo em uma turnê de comédia que irá fazer através do país.

É um road movie bem típico, com encontros e dificuldades fortuitas servindo para expor os problemas na relação de Max com o filho e consigo mesmo, eventualmente levando o protagonista a uma compreensão melhor do filho. Ainda assim o filme envolve pelo cuidado na representação de um garoto no espectro do autismo, mostrando como ele pode sim construir relações saudáveis com outras pessoas ao mesmo tempo que nos lembra de que certos problemas sempre estarão presentes e que não importa o cuidado que Max tenha, ele nunca será como uma criança neurotípica.

Muito do mérito vem do trabalho do garoto William A. Fitzgerald, que é realmente diagnosticado com autismo e TDAH na vida real. Ele traz um senso de humor peculiar a Ezra, que usa citações de filmes para tentar interagir com os outros, ao mesmo tempo em que dá um realismo emocional palpável nos momentos de crise do garoto, sempre nos fazendo entender o que motiva aquelas reações mais extremas e de onde elas vem. É difícil não se comover no momento em que Ezra é abraçado por uma garota e, depois de um breve instante de relutância, decide abraçá-la de volta, mostrando como ele pode se abrir ao contato com outras pessoas. Dirigir atores mirins e extrair uma performance tão complexa não é uma tarefa fácil, então muito do que faz o personagem funcionar vem também da condução do diretor Tony Goldwyn.

Outro mérito é a química entre o elenco. Bobby Cannavale demonstra um afeto genuíno pelo garoto, embora também demonstre que lidar com alguém nessa condição tenha sua parcela de dificuldades por conta dos vários momentos de crise. Muito da frustração de Max com as crises do filho vem por uma esperança vã que ele um dia se torne um garoto mais próximo de neurotípico e parte da jornada é o comediante aprender a aceitar que o filho sempre terá algo de diferente e que ele precisa abraçar as falhas do garoto do mesmo modo que seus méritos.

Essa química também se estende com o resto do elenco, a relação de Max com o pai, Stan (Robert De Niro), revela décadas de trauma geracional e como os problemas entre Max e o pai são transferidos na relação do protagonista com o filho. Do mesmo modo, há uma dinâmica bem sincera entre Max e a ex-esposa, Jenna (Rose Byrne). Isso era de se esperar considerando que Cannavale e Byrne são casados na vida real e aqui, apesar de interpretarem um casal cujo relacionamento naufragou e que tem claras diferenças em suas filosofias de como lidar com o filho, também se importam o suficiente um com o outro para trabalharem juntos em prol do garoto.

Se esse desenvolvimento dos personagens conquista, o modo como o filme lida com o fato de que Max efetivamente cometeu um crime federal ao sequestrar o garoto por vezes torna tudo pouco crível. Por mais que a Jenna demore em notificar as autoridades, quando isso acontece é difícil crer que Max conseguiria transitar com o garoto com tanta facilidade e que isso não viraria notícia rápido considerando que ele é um comediante dotado de algum grau de fama, ainda que seu temperamento tenha queimado várias pontes no ramo. Sim, ao final vemos que Max sofreu algumas consequências pelo crime, mas durante boa parte do filme chega a ser estranho a falta de tensão no percurso do que é basicamente uma fuga interestadual (algo similar ao que acontece em O Rito da Dança). Outra questão é como o namorado de Jenna, que inicialmente aparece como um ponto de conflito entre ela, Max e Ezra simplesmente some da trama e acaba não tendo nenhuma repercussão apesar de inicialmente ser posicionado como um ponto de conflito.

Esses problemas, no entanto, não impedem que Meu Filho, Nosso Mundo conquiste o envolvimento emocional do espectador por conta da sensibilidade com a qual conduz a relação de pai e filho no cerne da narrativa e o cuidado que tem na representação de um garoto no espectro do autismo.


Nota: 7/10


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