sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Crítica – Tipos de Gentileza

 

Análise Crítica – Tipos de Gentileza

Review – Tipos de Gentileza
Os filmes do diretor grego Yorgos Lanthimos costumam ser divisivos, com reações que muitas vezes se localizam em polos extremos do amor ao ódio por suas produções. Em geral costumo gostar do niilismo surrealista do diretor, mas confesso que Tipos de Gentileza não me pegou.

Absurdo previsível

A produção consiste de um tríptico de três histórias curtas. Na primeira história seguimos Robert (Jesse Plemons), um sujeito completamente devotado ao chefe, Raymond (Willem Dafoe), que controla todos os seus horários e ações ao longo do dia. Quando Raymond pede a Robert que bata seu carro em alta velocidade contra outro veículo, Robert não fica confortável com a possibilidade de matar outra pessoa, criando um conflito na relação. Na segunda história um policial, Daniel (Jesse Plemons) se reúne com a esposa, Liz (Emma Stone), depois que ela se envolve em um naufrágio e fica meses perdida no mar. O problema é que Daniel desconfia que a mulher que voltou não é a sua esposa. A terceira história é protagonizada por Emily (Emma Stone) que é devotada a um bizarro culto sexual liderado por Omi (Willem Dafoe) e Aka (Hong Chau) e é incumbida de encontrar uma mulher que, segundo profecias, seria capaz de ressuscitar os mortos.

São três histórias que trazem a ironia mordaz, o niilismo sombrio e várias outras ideias que Lanthimos já explorou em produções anteriores, mas sem a mesma força. A ideia de que nossa civilidade e princípios podem ser facilmente abandonados pela certeza de conforto material já estava presente em A Favorita (2018). A noção de que o progresso ou prosperidade da humanidade se constrói em cima da exploração do sacrifício de outros é um elemento construído em O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017). A ideia de que uma mudança de perspectiva de alguém pode impactar um relacionamento, tornando-o inviável, como acontece aqui na segunda história, já estava presente de certa forma em Pobres Criaturas (2023).

Com isso, tudo soa como uma repetição empalidecida de ideias que já vimos o próprio diretor executar melhor em outros filmes. Inclusive os contos chegam a se tornar previsíveis por conta disso, já que uma vez que entendemos seu mote central se torna fácil antever seus desfechos e, assim, os momentos de choque que viriam de suas conclusões absurdas, perdem força por deixarem de ser disruptivos. Claro, as histórias não deixam de ter sua parcela de momentos bizarros como Liz cortando fora o próprio polegar para dá-lo para o marido comer ou Aka lambendo o umbigo dos membros do culto para checar suas “impurezas”. A terceira história também traz alguns momentos visualmente bem construídos nos sonhos em preto e branco que Emily narra.

Repetição e variação

O que também tira parte do impacto dessas histórias é que elas se estendem mais do que deveriam. Na primeira, por exemplo, uma vez que entendemos que Robert está disposto a abrir mão de seus princípios para voltar as graças de Raymond fica evidente que ele irá capitular às exigências malucas do chefe, mas a trama anda em círculos repetindo ideias similares até finalmente chegar à sua conclusão. Na segunda, fica evidente que toda a desconfiança de Daniel sobre Liz não ser a mesma pessoa é uma metáfora para como a mudança de comportamento dela impacta na dinâmica do relacionamento e Daniel não aceita a mudança no status quo, exigindo provas de lealdade cada vez mais insanas na tentativa de retomar o controle. A impressão é de que cada história ou deveria ser mais concisa, indo diretamente ao ponto.

Por outro lado, as três histórias servem como veículo para o elenco mostrar sua versatilidade. Jesse Plemons começa a primeira história como um lacaio corporativo bem minimalista em sua composição, alguém que nunca parece demonstrar emoções muito intensas e parece confortável em se deixar levar por outros. Já no segundo conto ele parte da cara de coitado do primeiro para construir um crescente de insanidade conforme seu personagem se perde na paranoia em relação à esposa.

Do mesmo modo, se Emma Stone está na segunda história como uma esposa devotada a consertar a relação com o marido, no terceiro ela faz alguém cuja devoção ao culto maluco do qual faz parte a leva a reações extremas, inclusive a excêntrica dança de quando ela cumpre a missão que lhe foi imposta. Muito do senso de excentricidade sombria do filme vem do trabalho dos atores e também da trilha musical composta por Jerskin Fendrix que sempre imprime uma atmosfera perturbadora. O uso de coros com vozes fantasmagóricas faz os eventos soarem como provações saídas de algum umbral para atormentar aqueles indivíduos.

Mesmo com um elenco versátil que dá conta de toda a maluquice das três histórias, Tipos de Gentileza não afasta a sensação de que é uma repetição menos consistente de ideias que o diretor já executou melhor antes.

 

Nota: 5/10


Trailer


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