Apesar do título em português
evocar um suspense investigativo, Assassinato
em Gosford Park é um drama mais interessado no que o assassinato no centro
da trama movimenta entre os diferentes personagens que habitam a luxuosa mansão
britânica na qual a narrativa se passa do que no crime em si. É um filme sobre
questões de classe social e como a criadagem é tratada de forma invisível, com
os funcionários usando essa invisibilidade a seu favor.
A narrativa se passa em 1932 e
acompanha um final de semana na propriedade de Gosford Park, chefiada pelo
truculento William McCordle (Michael Gambon). A propriedade abriga no final de
semana membros proeminentes da sociedade britânica, como lady Constance
Trentham (Maggie Smith), a filha de McCordle, Sylvia (Kristin Scott Thomas),
Raymond Stockbridge (Charles Dance), além de convidados estrangeiros como o
produtor de cinema Morris Weissman (Bob Balaban). Esses ricos vem acompanhados
de seus criados, como Mary (Kelly Macdonald), que serve lady Trentham, ou Henry
(Ryan Philippe) assistente de Weissman que acaba sendo colocado junto com os
outros criados, além da própria equipe da mansão, como a sra. Wilson (Helen
Mirren), Elsie (Emily Watson), George (Richard E. Grant) e o chefe dos criados,
o sr. Jennings (Alan Bates).
Nunca li os livros de Jo Nesbo,
mas meu contato com adaptações de suas obras não foi dos melhores. Primeiro com
o péssimo Boneco de Neve(2017) e
agora com este fraco Calor Mortífero,
produção da Prime Video que adapta o conto O
Homem Ciumento de Nesbo.
Mistério requentado
A trama se passa na Grécia e
acompanha o detetive particular Nick Bali (Joseph Gordon Levitt) contratado
pela socialite Penelope (Shailene Woodley) para investigar a morte de seu
cunhado Leo (Richard Madden). Leo teria morrido ao cair de um penhasco durante
uma escalada livre (sem equipamentos), com a morte sendo considerada um
acidente. Penelope, no entanto, desconfia de algo, já que o controle da empresa
da família está em jogo, contrata o detetive. As principais suspeitas recaem
sobre Elias (Richard Madden), irmão gêmeo de Leo e marido de Penelope, e Audrey
(Claire Holman), a controladora mãe dos gêmeos.
Com algumas séries de games
sendo esquecidas por suas desenvolvedoras, muitas vezes cabe a jogos indie
trazer de volta o espírito desses games. Pizza
Tower de certa forma faz isso pela série Wario Land, que a Nintendo não produz um game novo desde Wario Land: Shake It, no Nintendo Wii. Pizza Tower é um game de plataforma que
tem o claro objetivo de evocar a estrutura de fase e senso de velocidade que
marcou alguns games da série Wario Land.
Eu não joguei quando Pizza Tower foi
lançado para PC ano passado, mas aproveitei o lançamento para Nintendo Switch
para finalmente conferir.
Lançado em 1928, A Paixão de Joana d’Arc é um marco na
história do cinema por múltiplos motivos. Foi o primeiro longa-metragem a
narrar a história da heroína francesa Joana d’Arc, que liderou o país contra os
ingleses. É também um marco pela maneira de filmar do diretor Carl T. Dreyer
que desafiou várias convenções da linguagem audiovisual da época e que mesmo em
relação ao cinema de hoje traz uma construção pouco usual.
Funcionando como uma versão
moderna de O Retrato de Dorian Gray,
de Oscar Wilde, ou do Fausto, de
Goethe, A Substância usa o horror
corporal para ponderar sobre o tempo, nossa relação com o corpo e os excessos
que as pessoas vão para se adequarem a padrões de beleza e juventude impostos
pela sociedade. É também sobre como Hollywood e toda a indústria do
entretenimento objetifica as mulheres e constrói uma visão de que
envelhecimento é algo indesejável apesar de ser um meio controlado por homens
brancos velhos.
A narrativa é protagonizada por
Elizabeth Sparkle (Demi Moore) que outrora foi uma premiada estrela de cinema,
mas com o tempo viu sua fama diminuir e agora apresenta um programa matinal de
ginástica. Em seu aniversário de 50 anos Elizabeth ouve Harvey (Dennis Quaid),
o produtor do programa, falando em demiti-la e contratar alguém mais jovem por
Elizabeth já ter passado demais de seu tempo. Depois da demissão Elizabeth
recebe uma correspondência lhe oferecendo uma droga misteriosa chamada apenas
de “A Substância” que promete um “novo eu” perfeito. Ela decide usar o item
misterioso e cria uma versão jovem e bela de si em Sue (Margaret Qualley). Os
efeitos da substância, no entanto, não são permanentes e ela deve voltar ao seu
corpo original a cada sete dias, mas a fama e facilidades que Sue obtém a fazem
ter repulsa de seu corpo mais velho e a levam a estender mais seu tempo como
Sue, trazendo consequências sérias para ambas.
O cinema de André Novais e dos
outros diretores da Filmes de Plástico é muito calcado na construção de um
senso de cotidianidade. Se o drama normalmente tenta se concentrar nos grandes
momentos de triunfo ou tragédia da vida comum, André e seus colegas entendem
que a vida se constrói principalmente nos interlúdios entre essas duas coisas,
que o grosso de nosso tempo se concentra nesse “eterno quase” de conseguirmos
ou não aquilo que desejamos e neste "eterno quase" em que residem muitos de nossos momentos especiais. O Dia Que Te
Conheci é um romance que se desenvolve justamente nesses momentos.
Dirigido pelo mauritano Abderrahmane
Sissako, responsável por filmes como Bamako
(2006), Black Tea: O Aroma do Amor
é um melodrama transnacional sobre desejo e rejeição. A trama é centrada em Aya
(Nina Melo) que depois de dizer “não” no dia do casamento ao descobrir uma
traição do noivo. Aya então se muda para Guangzhou, na China para reconstruir
sua vida. Lá ela começa a trabalhar em uma loja de chás e se aproxima do dono,
Cai Wang (Han Chang) e começam a viver um romance, mas diferenças culturais e o
racismo local trazem problemas para a relação.
Desejo e distância
É uma trama sobre construção de
pontes, conciliações possíveis e também sobre a dificuldade de superar certos
abismos culturais. Tudo isso subjacente à jornada emocional da relação entre
Aya e Cai que permanece o centro emocional da história. As cenas em que Cai
ensina a Aya as técnicas de chá são dotadas de uma sensualidade silenciosa,
repleta de um desejo que esses personagens mal conseguem conter, algo que me
lembra o cinema de Wong Kar-Wai. Cada toque, cada gesto, cada movimento pulsa
com esse desejo latente no qual os diálogos sobre a necessidade de movimentos
precisos para evitar se queimar com a água fervente não é uma fala apenas sobre
chá, é sobre eles se abrirem àquele desejo apesar dos relacionamentos
anteriores que não deram certo.
É quando foca no desenvolvimento
desse relacionamento e no cotidiano de Aya em se adaptar ao modo de vida na
China que o filme funciona melhor. A questão é que lá pela metade ele começa a
se abrir a várias subtramas que não chegam a ser desenvolvidas ao ponto de nos
fisgar ou ter grande impacto. Um exemplo é o arco de Cai em seu desejo de se
reaproximar da filha que tem em Cabo Verde, algo que se materializa em um literal
sonho cujas imagens dele caindo sucessivamente de um barranco e temendo quebrar
o jogo de chá que levou servem também como uma metáfora para seus sentimentos
de fracasso como pai, sempre tropeçando sem nunca alcançar a filha. A questão é
que a despeito dessas imagens marcantes, todo esse conflito fica apenas
subjacente ao personagem e não chega a levá-lo em direção alguma, carecendo de
força dramática.
Diálogos errantes
Do mesmo modo o clímax que
envolve a chegada dos ex sogros de Cai para o aniversário de vinte anos do
filho dele, Li-Ben (Michael Chang), não tem a devida tensão porque até aquele
ponto os personagens e seus posicionamentos não foram devidamente construídos.
Claro, a decisão de Cai em pedir que Aya fique no quarto e não saia enquanto
ele e o resto da família jantam porque os sogros não entenderiam a presença de
uma mulher negra ali mostra o preconceito latente no próprio comerciante, que
não está disposto a “assumir” Aya apesar do que sente por ela. A questão é que
o debate entre Li-Ben e os avôs que acontece logo depois fica na superfície do
conflito de gerações em que o avô é uma pessoa que apenas reproduz esses
preconceitos anacrônicos enquanto o neto tem uma mentalidade um pouco mais
aberta e cosmopolita pelo próprio contato que ele tem com as populações
africanas.
É uma maneira de mostrar como a
juventude está mais aberta à diversidade do que gerações anteriores, a questão
é que o avô aparece ali pela primeira vez e Li-Ben é um personagem que ficou
nas bordas da narrativa até então e sabíamos muito pouco a seu respeito, então
não são personagens cujos dramas estamos investidos. Do mesmo modo, o fato de
Aya, o centro de tudo estar praticamente ausente no conflito contribui para
diluir a força da cena. Talvez por isso o momento mais singelo da discussão é
quando Aya começa a cantar e Li-Ben diz que a voz vem do bluetooth, avisando ao
avô que no mundo de hoje todos estamos conectados.
Há uma direção muito precisa e
consciente na construção visual de Black
Tea: O Aroma do Amor, mas a despeito de bons momentos e imagens marcantes a
impressão é que o todo termina menor que a soma das partes por conta do excesso
de subtramas e personagens que não são devidamente explorados.
Esse texto faz parte de nossa
cobertura da Mostra de Cinemas Africanos 2024.
Faz algum tempo que a Konami não
lança nenhum game novo de suas principais franquias, mas ao menos tem
disponibilizado seus antigos games em ótimas coleções. Os Castlevania já foram
contemplados com Castlevania Anniversary
Collection que trazia os jogos de NES, SNES, Mega Drive e Game Boy, além da
Castlevania Advance Collection que
trouxe a trilogia de games do Game Boy Advance e Castlevania Requiem, que juntava Rondo of Blood e Symphony ofthe Nightem um único pacote. Agora é a vez dos três games de Nintendo DS
serem relançados nesta Castlevania
Dominus Collection. A coleção traz em si Castlevania Dawn of Sorrow, Castlevania
Portrait of Ruin e Castlevania Order
of Ecclesia, além do game de fliperama Haunted
Castle em sua versão original e em um remaster.
Com a mania de Hollywood em
continuações tardias que apelam para a nostalgia do espectador é a vez de Tim
Burton se juntar à onda com este Os
Fantasmas Ainda Se Divertem, continuação de Os Fantasmas Se Divertem (1988). Não esperava muita coisa e o
resultado final é meio bagunçado por subtramas que não vão a lugar nenhum, mas
ao menos é divertido por mais que seja mais estilo do que substância.
Bagunça sobrenatural
Mais de trinta anos depois do
original, Lydia Deetz (Winona Ryder) tem um programa de investigação
sobrenatural, explorando sua mediunidade para ganhar dinheiro com a ajuda do
noivo Rory (Justin Theroux). Quando o pai dela morre (porque é claro que eles
não trariam de volta o Jeffrey Jones depois que ele foi preso por conta de
vários crimes sexuais incluindo pedofilia) Lydia precisa voltar a sua cidade
natal, se reconectando com a filha, Astrid (Jenna Ortega), e com a madrasta
Delia (Catherine O’Hara). O retorno de Lydia também chama atenção do espectro
Beetlejuice (Michael Keaton), que segue obcecado em casar com Lydia. O fantasma
lida com seus próprios problemas, já que sua antiga noiva Delores (Monica
Belucci) se libertou de sua prisão sobrenatural e agora busca vingança.
Quando escrevi sobre o péssimo Mentes Sombriasnos idos de 2018 e o
fraco Máquinas Mortaisem 2019
mencionei como eles chegaram atrasados para a festa das adaptações de romances
jovens distópicos, estreando em um momento em que todo mundo já estava cansado
dos clichês desse tipo de história e com tramas que não faziam muito mais do
que repetir tropos desgastados. Pois é com surpresa ver que Hollywood ainda
insiste neste gênero que ninguém mais quer com este Feios. Produzido pela Netflix, é mais uma adaptação de uma série de
romances sobre distopias protagonizadas por adolescentes e, como era de se
esperar, é muito, muito ruim.
A ausência de um ente querido
promove mudanças no cotidiano de todo mundo afetado por esse vazio. A produção
cearense Quando Eu Me Encontrar se
propõe justamente a examinar as consequências dessa ausência e como as pessoas
reexaminam suas vidas diante dela.
Marcas da ausência
Na trama, a jovem Dayane vai
embora de casa sem dar satisfação nenhuma à família. Sua mãe, Marluce (Luciana
Souza) fica em choque com a partida repentina que a faz reexaminar sua relação
com a própria mãe. Antônio (David Santos), noivo de Dayane, tenta de algum modo
encontrar uma explicação para o sumiço da amada, se aproximando da melhor amiga
dela, Cecília (Di Ferreira). A irmã mais nova de Dayane, Mariana (Pipa),
enfrenta problemas na escola de classe média que ela frequenta como bolsista
depois que uma amiga é abusada durante uma festa e elas se tornam alvos de
comentários maldosos.
De uns anos para cá a Capcom parece
interessada em resgatar a memória de seus clássicos games de luta. Primeiro
lançaram a Capcom Fighting Collection
trazendo games da década de 90 que a empresa nunca fez novas iterações como Darkstalkers ou Cyberbots. Este ano a empresa pegou todo mundo de surpresa com o
anúncio desta Marvel vs Capcom Fighting
Collection que compila os jogos de fliperama que a Capcom fez em parceria
com a Marvel. Digo que pegou de surpresa porque desde o fracasso de Marvel vs Capcom Infinite a relação entre
as duas empresas não parecia estar em um bom momento e mesmo campanhas de fãs para
trazer de volta games como Marvel vs
Capcom 2, como a liderada pelo youtuber Maximilian Dood, eram recebidas com
frieza pela Capcom e com respostas de que era difícil algo assim acontecer.
Se não me engano foi o crítico Roger
Ebert que disse que um filme bom nunca é longo o bastante e um filme ruim nunca
é curto o bastante. Isso se aplica perfeitamente a este O Cara da Piscina, cujos meros cem minutos de duração se
transformam em algo tão dolorosamente excruciante que o filme parece ter mais
de quatro horas de duração.
A trama é centrada em Darren (Chris
Pine), um tratador de piscinas hiponga, conspiracionista, metido a filósofo e
ativista político, sempre cobrando mudanças nas linhas de ônibus na câmara de
vereadores. Quando ele esbarra em um escândalo envolvendo o presidente da
câmara, Stephen Toronkowski (Stephen Tobolowski), que pode estar recebendo
propina do magnata imobiliário Theodore Hollandaise (Clancy Brown) para aprovar
um grande empreendimento, Darren decide investigar a questão. No meio do
caminho encontra a femme fatale June
(DeWanda Wise) e mais uma série de personagens pitorescos.
Escrito por Diablo Cody (de Garota Infernal e Tully) e dirigido por Zelda Williams (filha do comediante Robin
Williams) este Lisa Frankenstein tem
cara de algo feito para virar cult entre certos setores da cinefilia com sua
trama insólita e personagens excêntricos. A trama se passa em 1989 sendo
protagonizada por Lisa (Kathryn Newton) uma garota introspectiva que vive à
sombra da meio-irmã popular Taffy (Liza Soberano) e da madrasta opressora Janet
(Carla Gugino). Sem sorte com garotos por ser considerada esquisita, as coisas
mudam para ela quando acidentalmente reanima um cadáver vitoriano (Cole
Sprouse, de Riverdale) durante uma
tempestade e decide fazer dele seu homem ideal com partes que pega de outros
garotos.
Lançado em 1989, Campo dos Sonhos foi tão referenciado e
parodiado que mesmo que não assistiu conhecia a frase “se você construir, ele virá”. É um drama que se vale do realismo fantástico
para falar sobre beisebol, sonhos, relações entre pais e filhos e como o
esporte pode unir gerações.
Sonhos e desilusões
A trama adapta um romance escrito
por W.P Kinsella, sendo protagonizada por Ray (Kevin Costner), um fazendeiro
que está se aproximando da idade que o pai tinha quando ele morreu e teme que,
assim como o pai, vai envelhecer sem nunca ter concretizado seus sonhos. Um dia
ele ouve uma voz dizendo “se você
construir, ele virá” e tem uma visão de um campo de beisebol sendo construído
em seu milharal. Com o apoio da esposa, Annie (Amy Madigan), Ray ceifa parte de
sua plantação para construir um campo de beisebol. Com o campo pronto, o
jogador Shoeless Joe Jackson (Ray Liotta), ídolo do pai de Ray, surge
misteriosamente do meio do milharal para jogar apesar de ter morrido há
décadas. Ray então começa a ter visões envolvendo o recluso escritor Terrance
Mann (James Earl Jones) e decide ir atrás dele, acreditando ser possível resolver
o mistério do campo de beisebol.
Histórias sobre a colonização de
algum espaço costumam ser narradas como feitos heroicos de pessoas enfrentando
ermos cheios de intempéries ou subjugando populações nativas, sem, no entanto,
ponderar sobre as consequências ou a inerente violência desse processo
colonial. A produção dinamarquesa O
Bastardo, uma das escolhas do país para o Oscar, traz um pouco de
ponderação sobre o egoísmo humano que está no cerne desse impulso desbravador.
A narrativa é baseada na história
real de Ludvig Kahlen (Mads Mikkelsen) militar dinamarquês responsável por
colonizar a península da Jutlândia no século XVIII, que hoje compreende a maior
parte do território dinamarquês. Estabelecer o primeiro assentamento da região,
no entanto, não era uma tarefa fácil e o reinado dinamarquês já tinha perdido o
interesse no espaço. É apenas quando Kahlen propõe custear a empreitada do
próprio bolso que a Coroa lhe dá permissão para construir seu assentamento. Lá,
Kahlen enfrenta as intempéries do ermo, a dificuldade de cultivar um solo tomado
por urzes, os saqueadores e principalmente as sabotagens perpetradas pelo
magistrado local Frederik De Schinkel (Simon Bennebjerg) que quer as terras
para si.
Reunindo Casey Affleck e Matt
Damon depois de ambos dividirem a cena na trilogia Onze Homens e Um Segredo, Os Provocadores tenta ser um filme de
roubo que mistura comédia e algum comentário político. A trama segue Rory (Matt
Damon) e Cobby (Casey Affleck), dois sujeitos que estão em um péssimo momento
de suas vidas que aceitam a proposta do pequeno criminoso Scalvo (Jack Harlow,
do fraco remake de Homens Brancos Não Sabem Enterrar) para roubarem o dinheiro de propina que o prefeito Miccelli
(Ron Perlman) tem escondido em um cofre. O assalto dá errado e agora Rory e
Cobby são homens procurados precisando encontrar um meio de fugirem da cidade,
indo pedir ajuda à terapeuta de Rory, a dra. Rivera (Hong Chau).
Filmes-catástrofe não fazem muito
meu estilo e não morro de amores pelo primeiro Twister (1996), então não fiquei exatamente empolgado com o anúncio
desse Twisters. Parecia só mais uma
dessas continuações tardias que existe para capitalizar em cima da nostalgia do
espectador. Talvez por isso eu tenha ficado surpreso com o fato de que o filme
se concentra mais em seus novos personagens sem se preocupar muito com
referências ao original.
Novos rostos
A trama é protagonizada por Kate
(Daisy Edgar-Jones), meteorologista que desenvolve um protótipo que pode
dissipar tornados. As coisas dão errado durante o teste e quase toda sua equipe
morre. Anos depois, ela trabalha em Nova Iorque quando o antigo colega, Javi
(Anthony Ramos), a procura para uma nova caçada a tornados. Javi está
trabalhando para o empreendedor Scott (David Corenswet), que financia sua
pesquisa de escaneamento de tornados. Com esse mapeamento, Kate poderia
aperfeiçoar seu protótipo e, assim, ela aceita participar da empreitada.
Chegando no interior do país, a equipe de Kate esbarra no grupo de youtubers
liderado por Tyler (Glen Powell), cuja postura é bem menos profissional que a
equipe de cientistas da qual Kate faz parte.
Um dos atores de carreira mais
longeva e marcante na dramaturgia brasileira, Grande Otelo, nome artístico de Sebastião
Bernardes de Souza Prata, demorou para ter o devido reconhecimento. Parte disso
se deve ao racismo da época em que ele atuou, parte por sua trajetória ser
muito marcada pela comédia, um gênero muitas vezes considerado “menos artístico”
ou “menos sofisticado”. O documentário Othelo:
O Grande reconta a trajetória do ator, suas dificuldades, seus triunfos e
seu ativismo político.
Memória audiovisual
A narrativa é toda contada através
de imagens de arquivo, usando produções das quais Otelo participou e também
várias entrevistas e discursos públicos que o ator deu ao longo de sua carreira.
A pesquisa de arquivo é a principal força do filme trazendo imagens raras e em
ótima qualidade de trabalhos antigos, como o Moleque Tião ou suas comédias para
a Atlântida, que quase sempre encontramos em qualidade ruim pela internet.
A pesquisa de arquivo também é
eficiente nas falas que traz do ator, com ele trazendo desde seus
posicionamentos, denunciando o racismo ao longo de sua trajetória, narrando experiências
com diretores renomados, como a impagável fala em que conta como foi trabalhar
com Werner Herzog em Fitzcarraldo (1982),
e também refletindo sobre a natureza da dramaturgia brasileira nos palcos, no
cinema e na televisão. Há uma fala interessante de Grande Otelo sobre o Cinema
Novo em que ele pondera que o fato do movimento nunca ter atingido as massas
como almejavam seus agitadores provavelmente se relacionava com a linguagem
experimental de seus filmes, mencionando como uma produção como Macunaíma (1969) teve penetração junto
ao público justamente por ter uma linguagem mais próxima das comédias populares
de sua época.
Otelo e o cinema brasileiro
Nesse sentido, conhecer a
história de Grande Otelo é também conhecer a história do teatro e do
audiovisual brasileiro, considerando a longevidade de sua trajetória e a
amplitude de diretores e movimentos com os quais colaborou. Vemos o histórico
de racismo na dramaturgia onde até mesmo alguém da competência de Grande Otelo
tinha dificuldade em conseguir trabalho porque papéis negros eram interpretados
por brancos em blackface, algo que
Joel Zito Araújo também mostrou no documentário A Negação do Brasil (2001).
Acompanhando a trajetória de
Grande Otelo vemos a ascensão das chanchadas (não confundir com pornochanchadas)
da Atlântida em filmes como Carnaval Atlântida (1952). Testemunhamos o surgimento de diretores como Nelson
Pereira dos Santos, com quem Grande Otelo trabalhou em Rio, Zona Norte (1957) e a eclosão de vanguardas como o Cinema
Novo. Vemos o surgimento e a consolidação da televisão como meio de comunicação
de massa e sua difusão pelo país no trabalho de Grande Otelo em programas como A Escolinha do Professor Raimundo. Como
o filme nos mostra, conhecer Grande Otelo é conhecer o desenvolvimento do
audiovisual brasileiro.
Por outro lado, o documentário se
prende demais às convenções de um filme de arquivo, soando demasiadamente
expositivo e convencional para uma figura que não pode ser facilmente colocada
em caixinhas. Grande Otelo é uma figura complexa, multifacetada e bastante
singular. O filme transmite isso nas falas e depoimentos, mas fica a impressão de
que a forma, não apenas o conteúdo, poderia também ser usada para construir a
complexidade do biografado.
Mesmo nunca saindo das convenções
de um documentário de arquivo, Othelo: O
Grande envolve pela trajetória longeva do ator e como ela se mescla com o
desenvolvimento do cinema brasileiro.
Um sujeito leva a filha para o
show de uma diva pop e se espanta com o volume de policiais no local. Ele logo
fica sabendo que as autoridades montaram no show uma armadilha para prender um
perigoso assassino em série ao saberem que ele estaria lá. O problema é que o
sujeito é o assassino que polícia procura. Novo filme do M. Night Shyamalan, Armadilha parte de uma premissa que
parece saída de um suspense B e abraça completamente essa natureza, talvez o
filme de sensibilidade mais B do diretor desde A Visita (2015).
A prisão do pop
Cooper (Josh Hartnett) está com a
filha no show da cantora pop Lady Rave (Saleka Shyamalan, filha do diretor). Ao
descobrir que a polícia montou uma armadilha para prendê-lo ele usa todas as
suas habilidades para encontrar um meio de fugir do local ao mesmo tempo em que
tenta manter sua fachada diante da filha.
A narrativa tem sua parcela de
conveniências, como o fato de Cooper constantemente encontrar pessoas que
revelam facilmente os segredos da operação ou algumas soluções pouco
plausíveis, como o avental roubado de um funcionário estar com a carteira do
sujeito dentro para que Cooper possa usar um documento para sair de um
problema. Muito disso, no entanto, é tratado com alguma medida de humor, parte
da autoconsciência que o filme exibe a respeito de toda a sua vibe de filme B.
Hartnett, que vem experimentando
uma renascença na carreira com participações em produções como Black Mirrorou Oppenheimer (2023), é ótimo em construir a dualidade de Cooper. Um
pai amoroso, que parece se importar de verdade com a filha e quer mantê-la
longe de sua faceta mais sombria, e um assassino ardiloso e cruel que não se
importa em mentir, manipular ou ferir os outros para conseguir o que quer. A
composição de Harnett mostra aos poucos as rachaduras que vão aparecendo em sua
fachada de cidadão pacato, ficando mais agitado e com mais dificuldade de se
manter no controle.
Esse desvelamento da
personalidade do protagonista se dá também pelo modo como Shyamalan o filma,
recorrendo a closes mais fechados ou planos detalhe de pequenos tiques e
expressões do personagem que revelam sua tensão e gradual perda de controle,
além de ressaltar a sensação de acuamento e como as opções e espaços estão
diminuindo ao seu redor. A narrativa se equilibra em uma corda bamba tonal,
tentando ao mesmo tempo nos fazer temer Cooper por sua natureza cruel e
implacável e fazer nos importarmos com sua relação com a filha, a exemplo de
toda a subtrama envolvendo a briga da filha com uma colega de escola. Essas
duas facetas eventualmente convergem, como no momento em que Cooper convence a
produção do show a escolher sua filha para ser chamada para dançar com Lady
Raven no palco, simultaneamente conseguindo acesso aos bastidores da arena e
fazendo a filha provocar ciúmes na patricinha que a maltratou.
O caos da liberdade
É uma pena que toda essa
construção cuidadosa e o crescimento da tensão desmoronem assim que a narrativa
deixa o estádio. A impressão é que Shyamalan tinha umas três ideias diferentes
de como encerrar sua narrativa e resolveu executar todas ao mesmo tempo,
resultando em um vai e vêm constante de caminhos narrativos, reviravoltas que
se acumulam tão rápido que não causam o impacto devido e soluções tão
convenientes que mesmo no clima de excesso do filme soam pouco críveis.
A revelação envolvendo a
personagem de Alison Pill, por exemplo, falha em ser a grande reviravolta que o
filme a conduz para ser por soar desonesta. A personagem aparece muito tarde e
muito pouco para sentirmos que aquela é uma guinada inesperada que ressignifica
o que achávamos entender da dinâmica daquelas personagens e mais algo que o
roteiro tira da cartola no último minuto porque precisava chocar o espectador.
Para funcionar como o filme esperava que funcionasse era preciso apresentar a
personagem antes, mostrar o estado da relação de Cooper com ela e ir
construindo alguma medida subjacente de ambiguidade.
É mais um exemplo que mostra como
Shyamalan é um ótimo diretor, mas um péssimo roteirista, algo que já mencionei
quando escrevi sobre Batem à Porta(2023).
Shyamalan só tinha a ganhar se concentrasse seus esforços na direção e tivesse
alguém para desenvolver os roteiros ao seu lado a partir dos argumentos que ele
próprio cria.
Armadilha vale pelo modo como constrói o senso crescente de tensão
no jogo de gato e rato entre o protagonista e seus perseguidores, bem como na
dualidade que traz ao protagonista, sendo lamentável que ele se perca no
clímax, desperdiçando o seu próprio potencial.