quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

Crítica – Conclave

 

Análise Crítica – Conclave

Review – Conclave
Confesso que não imaginei que um filme focado no que é basicamente o TSE do Vaticano conseguiria me manter tão interessado, mas é exatamente isso que Conclave, novo filme de Edward Berger (responsável por Nada de Novo no Front), faz. Claro, o foco é mais nas intrigas da votação do que na burocracia em si, analisando as disputas de poder que ocorrem no coração da fé católica.

Eleição disputada

A trama é centrada no cardeal Lawrence (Ralph Fiennes), reitor da Santa Sé que fica incumbido de organizar o Conclave depois da morte do Papa. Com o colegiado dos cardeais isolados eles precisam votar para eleger um novo Papa. A votação, porém, não é um debate pacífico, com diferentes correntes disputando supremacia no pleito, segredos do passado trazidos à tona e até o surgimento de novas figuras, como o misterioso cardeal Benitez (Carlos Diehz), cuja nomeação foi feita em segredo pelo falecido Papa anterior e sua chegada na eleição desperta curiosidade quanto à sua legitimidade e intenções em relação ao pleito.

A votação desperta a ambição de alguns cardeais e aos poucos vai desenhando um conflito entre uma ala altamente conservadora liderada por Tedesco (Sergio Castellitto), que deseja voltar com liturgias em latim e retornar a dogmas mais antigos, enquanto que uma ala mais reformista, que pensa em uma abertura maior para a Igreja, é encabeçada pelo cardeal Bellini (Stanley Tucci). Outros candidatos tentam correr por fora, buscando suas próprias ambições, mas no meio de tudo está Lawrence, um homem com uma crise de fé, que tenta fazer o que é certo mesmo em meio de suas dúvidas se alcançou a posição que está por ser um bom sacerdote ou por ser apenas um bom administrador como o falecido Papa costumava lhe dizer.

O fato de receber alguns votos nas primeiras rodadas desperta uma pequena medida de ambição em Lawrence, já que por mais que ele diga não desejar o papado a composição de Fiennes nos deixa perceber como ele fica relativamente envaidecido com a possibilidade e quando Bellini o confronta dizendo que ele certamente já pensou no nome que tomaria caso fosse eleito é visível que apesar da negativa de Lawrence a linguagem corporal de Fiennes nos indica que ele provavelmente já pensou na questão.

Lawrence, no entanto, não é o único movido por vaidade. Inicialmente Bellini diz não querer ser Papa e que qualquer um que ativamente deseje o cargo não é o ocupante ideal para ele. Porém quando o conservador Tedesco se coloca como possível vitorioso o mesmo Bellini não vê problema em se colocar no pleito como o rosto de uma liderança reformista. Mais que isso, conforme as tensões aumentam Bellini adota uma postura cada vez mais radical, afirmando que aquela é uma guerra e que quem não está do lado dele em uma Igreja mais reformista está do lado das posições mais retrógradas de alguém como Tedesco. Ele se coloca em um pedestal de superioridade moral no qual se sente autorizado para fazer qualquer coisa já que ele seria “o lado certo” da questão. É um arco que revela como o próprio Bellini esqueceu de suas palavras no início e se deixou tomar pela soberba.

Segredos e sussurros

Essas disputas são construídas pelo filme não apenas como uma crítica às instituições religiosas, mas como um lembrete de que, no fim das contas, a Igreja Católica é uma instituição terrivelmente humana e que seus líderes estão sujeitos às mesmas falhas, desvios e erros que qualquer pessoa. É um lembrete para reconhecermos nossas limitações humanas e que muitas certezas sobre nossa bondade ou nossas crenças tendem a produzir radicalismos.

A produção é competente em criar um senso de claustrofobia conforme os personagens ficam isolados durante o Conclave, com boa parte dos debates ou coalizões sendo formados não no salão de votação, mas em segredo em corredores, escadarias ou nos diminutos quartos em que eles dormem durante o isolamento. São conversas sussurradas, sempre temendo quem possa estar ouvindo, planejando como convencer os demais a votarem, tudo conferindo um clima de intriga palaciana à trama.

O senso de intriga é ampliado pelas constantes reviravoltas que envolvem o passado de alguns cardeais que pleiteiam o papado, com cada uma delas mudando a direção dos favoritos. As reviravoltas também chamam atenção para o papel das freiras dentro da Igreja e como o imperativo de que elas se mantenham em silêncio e obedeçam as autoridades masculinas é um terreno fértil para abusos de poder, sendo necessário dar voz a essas mulheres, como faz a irmã Agnes (Isabella Rossellini) para expor as ações dessas figuras movidas por ambição.

Justamente por reconhecer que é na dúvida e não na certeza na qual reside a autoridade da fé que o filme encerra com um vitorioso inesperado ao pleito. Alguém que não tem certezas plenas de que sua visão é a melhor para a Igreja e que não se encaixa dentro dos padrões dos demais cardeais, lembrando também que sem uma mudança no perfil de liderança, se o poder se mantiver nas mãos do mesmo tipo de pessoa, é difícil produzir qualquer mudança real.

 

Nota: 8/10


Trailer

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