Costura social
A narrativa se passa em Copenhague no ano de 1919 sendo protagonizada por Karoline (Vic Carmen Sonne). O marido dela foi servir na guerra, mas há um ano não manda notícias, fazendo Karoline crer que ele possa ter morrido. Despejada de onde mora, ela vai parar em um quarto miserável e acaba se envolvendo com o dono da fábrica na qual trabalha. Ela engravida do patrão, mas a mãe dele o proíbe de se casar com ela e a demite. Sem perspectiva, ela tenta forçar o fim da gravidez, mas é impedida por Dagmar (Trine Dyrholm), que diz ser capaz de encontrar um lar adotivo para o bebê de Karoline. Sem trabalho, Karoline vai viver com Dagmar como ama de leite dos bebês que ela traz e se afeiçoa à filha dela, Erena (Ava Knox Martin). Aos poucos, porém, Karoline começa a suspeitar que Dagmar não está sendo sincera em relação ao que faz com os bebês que são levados a ela.
Todo filmado em preto e branco, a produção faz a Copenhague do início do século XX soar como um lugar lúgubre e desolador. São ambientes sujos, hostis, por vezes demasiadamente diminutos. As pessoas não são exatamente melhores, já que ao longo de seu arco Karoline só encontra pessoas que a tratam como alguém a ser explorada ou instáveis demais para ficar perto. Mesmo quando ela reencontra o marido, cujo rosto foi completamente desfigurado por conta de ferimentos de batalha, sua vida não volta ao normal por conta dos episódios psicóticos dele, fruto dos traumas de guerra.
A primeira metade do filme opera para sintamos como tudo é desalentador, sem possibilidade de melhora e que tudo que espera Karoline e os demais ao seu redor é apenas miséria. Essa preparação é importante para a virada que o filme dá quando a protagonista descobre o destino cruel dos bebês que Dagmar recebe.
A natureza do mal
Há uma citação atribuída ao filósofo grego Sófocles que diz “nunca ter nascido pode ser a maior dádiva de todas”. Diante do universo cruel e desprovido de esperança no qual Karolina habita esse é um pensamento que faz sentido quanto mais tempo acompanhamos a realidade. A questão que o filme coloca é até que ponto essa ideia de evitar o sofrimento pode justificar atrocidades.
Acreditando genuinamente ou não neste ponto de vista, Dagmar justifica suas ações a partir dele e o filme nos indaga até que ponto seus atos imperdoáveis são produto do meio em que ela vive ou se é apenas uma desculpa usada por ela para justificar sua crueldade. É um questionamento se pondera se o mal surge naturalmente, se é cultivado por circunstancias externas ou as duas coisas.
O problema é uma vez que a trama expõe a verdade sobre o que Dagmar fazia, fica a impressão que a narrativa começa a andar em círculos repetindo as mesmas ideias sobre crueldade e desalento, principalmente porque a produção não oferece qualquer respiro ou quebra a esse clima constante de opressão, fazendo a trama ficar sempre no mesmo tom. Há uma tentativa de dialogar com o horror psicológico a partir do momento em que Dagmar passa a drogar Karolina para que ela não revele a verdade. Durante o estupor da protagonista, o filme gera algumas imagens bizarras fundindo ou distorcendo os rostos de figuras da vida dela, mas nunca investe plenamente nesse aspecto, que soa como uma tangente momentânea e meio que descartável.
Ainda assim, A Garota da Agulha é uma impactante reflexão sobre a natureza do
mal e até onde as pessoas vão em um contexto de total desesperança.
Nota: 7/10
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