segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Crítica – Sing Sing

 

Análise Crítica – Sing Sing

Review – Sing Sing
Em Um Sonho de Liberdade (1994) o protagonista Andy Dufresne (Tim Robbins) fala que na prisão ou ele se ocupa para viver ou ele se ocupa para morrer. Essa frase veio na minha mente enquanto eu assistia Sing Sing, um filme que também se passa numa prisão e que gira em torno de personagens que estão buscando um meio de se manterem ocupados para buscar novos rumos em suas vidas.

O mundo é um palco

A trama é baseada na história real do programa Rehabilitation Through the Arts (Reabilitação Através das Artes) que foi implementado na prisão de Sing Sing, no estado de Nova Iorque. O programa colocava detentos para estudar teatro, escrever produzir e encenar peças na prisão com o objetivo de fazê-los lidar com suas questões emocionais e ressocializá-los. A narrativa é protagonizada pelo detento John (Colman Domingo), alguém que encontrou no teatro um meio para lidar com o cotidiano da prisão. O cotidiano do grupo de teatro muda com a chegada de um novo integrante Clarence “Divine Eye” (Clarence Maclin), cuja postura agressiva perturba a paz dos detentos que estão tentando se libertar de seus passados violentos.

O filme inclusive usa muitos dos detentos formados no programa para compor o elenco do grupo de teatro do qual John faz parte. Esses detentos, como Clarence Maclin, interpretam versões ficcionalizadas de si mesmos. É como se essas pessoas precisassem primeiro aprender a ser outras pessoas para recuperarem a humanidade, mostrando como o teatro serve de exercício de empatia e permite às pessoas aprenderem a lidar com seus sentimentos.

É provavelmente por essa possibilidade de explorar outras emoções e vislumbrar outras existências possíveis que o programa atrai os personagens e figuras como John se apegam tanto a ele. Colman Domingo faz de John alguém que já encontrou certa paz em sua existência na prisão, tentando ser construtivo no modo como usa seu tempo lá, seja pela participação no programa de teatro, seja em seus esforços de tentar ajudar os colegas em seus processos de apelação ou de liberdade condicional.

A composição de Domingo, no entanto, nos permite ver a dor que há por trás da fachada afetuosa de John e que ele nunca permite que venha a tona ou se permite se abrir a isso. Seu olhar também carrega consigo um enorme anseio, um desejo não apenas de liberdade, mas de transformar sua vida, de ter uma existência diferente, longe da violência ou das tensões da prisão e de sua vida pregressa.

Esperança sem ingenuidade

É importante que vejamos o que há subjacente na superfície emocional de John para dar credibilidade ao percurso emocional do personagem, já que conforme a trama progride e suas esperanças de conseguir liberdade condicional se tornam mais distantes, ele se entrega à dor que tanto tentou silenciar dentro de si. É curioso como a dinâmica entre ele e Clarence se inverte, com o primeiro entendendo a necessidade de se abrir emocionalmente e repensar a própria conduta, enquanto John se afunda na desesperança e precisa ser resgatado pelos colegas.

Por mais que seja uma trama de esperança, que nos lembre da capacidade humana de reconstruir diante das piores condições, a narrativa nunca é ingênua quanto à realidade brutal que os cerca e como há um sistema feito para manter os detentos exatamente do jeito que estão independente do quanto eles tenham mudado. O filme não fecha os olhos para a violência, o risco de morte ou as humilhações constantes da vida da prisão do mesmo modo que não perde de vista o passado dessas pessoas, mas não os define apenas por seus crimes, observando as diferentes camadas que esses indivíduos trazem consigo.

É também uma ponderação sobre o que esperamos do nosso sistema prisional, se ele é simplesmente um espaço para trancar e abandonar aqueles que cometeram crimes ou se é um espaço de ressocialização, um local para fazer os detentos refletirem sobre suas condutas e dar a eles a chance de mudar suas vidas. Assim, Sing Sing é um belo lembrete do poder transformador da arte e como ela pode ser um caminho para se desvencilhar de traumas passados.

 

Nota: 8/10


Trailer


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