Quando escrevi sobre a temporada
anterior de Reacher, mencionei como a
série era como um feijão com arroz. Algo básico, mas com capacidade de
satisfazer por ser bem temperado e bem cozido. Esse terceiro ano segue da mesma
forma entregando uma “confort food”
para quem gosta de narrativas de ação e suspense, executando bem o que se
espera desse tipo de produto sem, no entanto, arriscar muito.
Inimigo Íntimo
A trama coloca Reacher (Alan
Ritchson) no encalço de Xavier Quinn (Brian Tee), um criminoso que ele pensou
ter eliminado em seus tempos de exército. A caçada o coloca no meio de uma
operação liderada pela agente federal Susan Duffy (Sonya Cassidy) que investiga
a ligação de um poderoso empresário, Beck (Anthony Michael Hall), com um
esquema de contrabando que pode ser liderado por Quinn. Sem escolha, Reacher
aceita colaborar com a investigação e se infiltra na organização de Beck, se
tornando segurança do filho do empresário, Richard (Johnny Berchtold).
O primeiro Moana: Um Mar de Aventuras(2016) era uma aventura bacana,
carregada por personagens carismáticas, boas canções e uma reviravolta final
que ressignificava muito do que tínhamos visto até então. Este Moana 2, por outro lado, soa como uma
continuação burocrática, pensada apenas para capitalizar em cima do sucesso do
primeiro filme.
Mar adentro
Na trama, Moana (voz de Auli’i
Cravalho) se torna a exploradora de sua vila e é incumbida de encontrar uma
ilha mítica que teria sido escondida pelo deus Nalo (voz de Tofiga Fepulea'i).
Essa ilha seria capaz de apontar as rotas para todos os povos que vivem no mar
e unir as populações. Para alcançar a ilha, Moana mais uma vez busca a ajuda do
semideus Maui (voz de Dwayne “The Rock” Johnson).
Estrelado por Miles Teller e Anya
Taylor-Joy, Entre Montanhas é mais
uma daquelas produções de streaming que
parece ter sido pensada por algum algoritmo. Pega elementos de diferentes
gêneros que atraem segmentos distintos da audiência, combina eles em um pacote
que parece feito para maximizar o alcance de público e justificar o orçamento,
mas o resultado final não passa de uma colcha de retalhos sem alma.
Romance à distância
Na trama, o atirador de elite
Levi (Miles Teller) recebe a missão de vigiar uma misteriosa fenda entre
montanhas. Seu predecessor não te dá muitas informações além de que da fenda
saem seres bizarros chamados de “homens ocos” cujo avanço deve ser contido. Do
outro lado da fenda a atiradora Drasa (Anya Taylor-Joy), também vigia o local.
Apesar da comunicação entre os atiradores ser proibida, a solidão leva os dois
a interagirem e começam a se aproximar. Além de se apaixonarem, eles também
decidem desvendar o mistério da fenda.
Segunda colaboração dos irmãos
Russo com a Netflix depois do insosso Agente Oculto(2022), este The Electric
State consegue ser ainda mais derivativo e menos memorável do que a
primeira colaboração entre os irmãos e a plataforma de streaming. É uma narrativa sobre uma distopia na qual as pessoas
passam boa parte do tempo em mundos virtuais, presas em sua própria nostalgia e
um adolescente precisa enfrentar o líder da corporação maligna que controla
tudo. Se isso lhe pareceu familiar é porque essa é a mesma trama de Jogador Número 1 (2018) e The Electric State é basicamente uma
versão piorada desse filme que já não era grande coisa para começo de conversa.
Futuro Mecânico
A trama, que adapta um romance
escrito por Simon Stalenhag, se passa em uma versão alternativa da década de
noventa na qual a humanidade criou robôs conscientes. Esses robôs se rebelaram
iniciando uma guerra que foi vencida quando o inventor Ethan Skate (Stanley
Tucci) criou um dispositivo que permitia que as pessoas controlassem drones
robóticos remotamente, igualando a batalha. Anos depois do fim do conflito
Michelle (Millie Bobby Brown) é uma órfã que vive em um lar adotivo hostil até
o dia em que recebe a visita de um estranho robô que diz ter a mente do irmão
que Michelle acreditava estar morto. Agora ela parte ao lado do robô para
reencontrar o irmão.
Depois de uma segunda temporada equivocadamente dividida em duas partes, Invencível
retorna para sua terceira temporada no formato habitual de um episódio por
semana e sem a desnecessária divisão que mais prejudicou do que ajudou a
temporada anterior. Esse terceiro ano é talvez o mais intenso da série até
aqui, testando as convicções e lealdades dos personagens ao limite.
Guerra interna
Lidando com as consequências da
batalha contra Angstrom Levy, Mark pondera se a violência que cometeu o
aproxima do genocídio cometido por seu pai e se ele corre o risco de se tornar
igual a ele. Ao mesmo tempo ele avalia a possibilidade de uma relação com Eve e
sua parceria com o implacável Cecil por discordar dos métodos dele.
Produção da Letônia, a animação Flow conta a história de um gato que
fica preso em um pequeno barco com outros animais depois de uma enchente. A
trama é toda contada sem diálogos, acompanhando o gato e seus companheiros
animais enquanto eles tentam encontrar um meio de sobreviver à enchente.
Instinto de sobrevivência
Toda feita no software de código
aberto Blender, a animação mostra como é possível fazer algo visualmente
marcante com poucas ferramentas. Os animais se movem de maneira bastante
coerente com o modo que imaginamos que gatos, cães ou lêmures reagiriam uns aos
outros e diante das situações que a narrativa os coloca. A direção de arte
remete a pinturas feitas em aquarela por conta do esquema de cores e o modo
como a luz e os movimentos se comportam e fazem os modelos 3D dos animais
parecerem desenhos feitos à mão.
O primeiro trailer de Capitão América: Admirável Mundo Novo me
deixou empolgado por conta seu clima de intriga e espionagem que remetia a
produções como Capitão América e o Soldado Invernal(2014) e a série Falcão e o Soldado Invernal (2021), algumas das melhores produções da Marvel. Por
outro lado, o filme teve uma produção atribulada, com elementos modificados no
meio do processo, várias ondas de refilmagens que removiam ou adicionavam elementos,
o que implicava no risco do resultado ser uma bagunça semi incoerente.
Repercussões atrasadas
Na trama, o general Ross
(Harrison Ford, substituindo o falecido William Hurt) se torna presidente dos
Estados Unidos e chama Sam (Anthony Mackie), que assumiu o manto de Capitão
América, para reconstruir os Vingadores. Ross está em meio a uma negociação
internacional pela divisão dos recursos contidos no corpo do Celestial no meio
do oceano, já que dele pode ser extraído um novo elemento chamado adamantium. O
tratado é ameaçado quando Samuel Sterns (Tim Blake Nelson) foge da prisão na
qual foi confinado desde o incidente envolvendo o Hulk e o Abominável para se
vingar de Ross.
Depois de uma segunda parte queconseguiu ser ainda pior que a primeira leva de episódios da sexta temporada, cheguei nesta terceira e última parte
da desnecessariamente longa temporada derradeira de Cobra Kai sem qualquer esperança que a série fosse ter um final
minimamente digno. Comecei a
assistir torcendo pelo melhor, mas me preparando para o pior.
Torneio caótico
A trama começa meses depois do
fim da segunda parte, após um dos discípulos de Kreese (Martin Kove) ter sido
morto durante uma briga generalizada no torneio internacional Sekai Taikai.
Apesar de toda a briga e morte do adolescente ter sido transmitida ao vivo pela
televisão não há muita consequência para ninguém além do cancelamento do
torneio. Silver (Thomas Ian Griffith), porém, não está disposto a desistir
depois de chegar tão perto de mostrar sua superioridade perante Johnny (William
Zabka), Daniel (Ralph Macchio) e Kreese. Silver visita os organizadores do
torneio e os convence a retomar a competição sob seu patrocínio.
Como outras animações estreadas
pela dupla criada pela Aardman Animations, Wallace
& Gromit: Avengança é uma aventura que conquista pela sua
excentricidade e senso de encantamento. Na trama Gromit passa a ficar cada vez
mais preocupado com a dependência de Wallace de suas invenções, se agravando
quando Wallace cria um robô gnomo para realizar todas as tarefas domésticas. As
coisas pioram quando o vilão Feathers McGraw toma o controle do robô e passa a
usá-lo para fins malignos, buscando vingança contra Wallace e Gromit por
prendê-lo no passado.
Ludicidade aloprada
Em essência é uma narrativa sobre
os perigos de confiar demais em automação e inteligência artificial, lembrando
como nada substitui o componente humano, como o ato de você mesmo fazer carinho
em seu cachorro ao invés de recorrer a alguma traquitana maluca como faz
Wallace. Que essa crítica a uma dependência de inteligência artificial seja
feita por uma animação em stop motion
feita à mão só torna essa crítica mais apropriada.
Depois de uma ótima primeira
temporada que introduziu novos heróis e vilões, Castlevania: Noturno leva o confronto contra a “messias vampira”
Erszebet ao seu clímax. Ainda que não seja tão boa quanto a temporada anterior,
a série continua a empolgar com sua mistura das histórias de Castlevania Rondo of Blood e Castlevania Symphony of the Night.
Revolução vampírica
A trama continua no ponto em que
a temporada anterior terminou, com a vilã ampliando seus poderes e ficando mais
perto de conseguir evocar uma noite eterna para que as criaturas da noite
dominem o mundo. Richter e os demais heróis mal conseguem escapar, mas
encontram um novo aliado em Alucard. Agora eles precisam se reorganizar e
encontrar um meio de lidar com os poderes quase que divinos de Erszebet.
Primeiro produto do novo universo
DC capitaneado por James Gunn, a série animada Comando das Criaturas traz vários personagens de quarta ou quinta
categoria da DC para fazer o que Gunn faz de melhor, dar camadas a esses vilões
que nas mãos de outras pessoas seriam buchas de canhão para os heróis baterem,
mas aqui viram indivíduos com várias camadas e razões compreensíveis para que
suas vidas os tenham levado para o rumo que tomaram.
Circo de aberrações
A narrativa começa quando Amanda
Waller (Viola Davis) precisa montar uma nova equipe clandestina para agir
contra uma ameaça na remota nação do Pokolistão e proteger a governante local,
a princesa Ilana (Maria Bakalova). Como o uso de prisioneiros se tornou controverso
depois dos eventos na ilha de Corto Maltese em O Esquadrão Suicida(2021), Waller decide empregar seres que não
seriam considerado “humanos”, colocando Rick Flag Sr (Frank Grillo) para
comandar um grupo de criaturas formado pela Noiva (Indira Varma), o Robô
Recruta (Sean Gunn), Dr. Fósforo (Alan Tudyk), Nina Mazurski (Zoe Chao) e o
Doninha (Sean Gunn).
O sucesso de Sonic: O Filme(2020) foi um dos raros casos em que um bando de
nerds raivosos de internet conseguiu tornar algo melhor ao substituir o bizarro
visual fotorrealista do ouriço veloz por algo mais cartunesco e próximo do seu design nos games. Mesmo não sendo grande
coisa, o filme arrecadou o bastante para justificar uma continuação em Sonic 2: O Filme(2022) que melhorou um
pouco em relação ao anterior, ainda que sofresse com parte dos mesmos
problemas. Agora chegamos a este Sonic 3:
O Filme que entrega algo superior aos anteriores e se continuarmos a
progredir nesse nível talvez tenhamos um filme do Sonic realmente excelente lá
pelo sexto ou sétimo filme.
A série What
If…? funciona melhor quando usa suas possibilidades do multiverso
para explorar novas possibilidades de desenvolver seus personagens ou formatos
narrativos diferentes para suas tramas de super-heróis. Esse terceiro e
aparentemente último ano da série tenta trazer um encerramento ao arco do Vigia iniciado nos anos anteriores e dialogar com alguns gêneros diferentes,
mas tanto suas escolhas narrativas quanto de personagem nem sempre funcionam.
Prisma de possibilidades
O primeiro episódio da temporada
é claramente uma homenagem a filmes de kaijus
como Godzilla e similares ao nos apresentar a uma realidade com monstros
gigantes em que os Vingadores precisam pilotar mechas para enfrentar as
criaturas. É um episódio com ação bem conduzida, ainda que nunca aproveite as
possibilidades desse cenário e a narrativa tem muito pouco a dizer sobre a
amizade que tenta construir entre Sam Wilson e Bruce Banner.
A trama acompanha Chico Bento
(Isaac Amendoim) e seus amigos da Vila Abobrinha enquanto eles tentam impedir
que um empresário local derrube a goiabeira do Nhô Lau (Luis Lobianco) para
construir uma estrada. É uma trama simples que foca mais no lado de uma
aventura pueril e na comédia do que no desenvolvimento emocional presente nos
filmes da Turma da Mônica.
O primeiro Venom(2018) foi bem fraquinho. A continuação, Venom: Tempo de Carnificina (2021) conseguiu ser pior ao
desperdiçar a rivalidade entre Eddie Brock e Cletus Kasady em um conflito inane.
Aos tropeços essa franquia conseguiu virar uma trilogia que aqui, com Venom: A Última Rodada, encerra a
história com seu protagonista com um miado ao invés de um rugido, entregando o
pior dos três filmes.
Inimigos do abismo
Depois de levar Eddie Brock (Tom
Hardy) ao universo Marvel no final do segundo filme, este terceiro joga Brock
de volta no agora defunto universo de vilões da Sony sem fazer nada com o
gancho deixado no filme anterior. De volta ao seu mundo Brock se vê acusado
pelos assassinatos cometidos por Cletus/Carnificina (Woody Harrelson) no
anterior. Ele decide limpar seu nome, mas no caminho é atacado por criaturas
enviadas por Knull (Andy Serkis) que quer arrancar de Venom e Eddie o Codex que
eles carregam em si e é a chave para Knull fugir de sua prisão no vácuo.
Um anime que contasse a história
do rei Helm Mão-de-Martelo e de como o a fortaleza que leva seu nome permitiu
aos Rohirrim resistirem a uma invasão séculos antes dos eventos de O Senhor dos Anéis: As Duas Torres (2002)
não era a primeira coisa que eu pensaria para uma nova produção na Terra-Média
(ainda não entendo como ninguém tentou um projeto baseado em Beren & Luthien ou Os Filhos de Húrin). Mesmo não sendo um
pedaço da história deste universo que deixava os fãs ansiosos de curiosidade, O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim
é uma aventura bacana.
Lá e de volta outra vez
A trama é focada em Héra, filha
de Helm. Quando um governante do sul, Freca, tenta forçar Helm a casá-la com
seu filho, Helm o desafia para uma luta. Durante o combate Freca cai por conta
de um soco de Helm e bate a cabeça, morrendo. Helm bane Wulf, filho de Freca,
das terras de Rohan, mas ele jura vingança. Anos depois Wulf vem com um
exército de mercenários atacar o reino, obrigando todos a recuarem para a
fortaleza nas montanhas. Os irmãos de Héra morrem no primeiro ataque de Wulf e
agora apenas ela e o pai restam da família real enquanto eles ficam sitiados na
fortaleza.
Na Broadway, o musical Wicked trazia uma interessante releitura
para a mitologia do universo de O Mágico
de Oz, ponderando como sobre o perigo de ouvir apenas um lado da história e
como isso resulta em maniqueísmos injustos. Fiquei curioso com o anúncio de uma
adaptação para cinemas, principalmente pela escolha de dividir o musical em
duas partes, que evitaria ter que condensar demais a narrativa e prejudicar a
construção dos personagens e conflitos, como aconteceu em Caminhos da Floresta(2014). Sim, esse filme é só a primeira metade
da história.
Metáforas da diferença
A narrativa começa com a derrota
da bruxa Elphaba (Cynthia Erivo) no filme de O Mágico de Oz e enquanto a terra de Oz comemora a sua morte,
Glinda (Ariana Grande), a bruxa boa, relembra o passado das duas e como ninguém
nasce naturalmente maligno. Acompanhamos então a juventude das duas e como elas
estudaram juntas para se tornarem feiticeiras, com Elphaba sempre demonstrando
uma aptidão natural para magia enquanto Glinda não tinha o mesmo talento embora
desejasse dominar a magia. As habilidades de Elphaba chamam a atenção da
professora Morrible (Michelle Yeoh), que a consideram capaz de ajudar o grande
Mágico de Oz (Jeff Goldblum), embora a aparência verde de Elphaba desperta
preconceito e intolerância nos colegas.
Não creio que ninguém que tenha
assistido Gladiador (2000) tenha
saído do filme pensando “nossa, mal posso esperar por uma continuação que conte
a história do filho do protagonista”, mas mesmo sem ninguém querer ou que fosse
necessário para amarrar qualquer ponta da história que Ridley Scott contou há
mais de vinte anos atrás, Gladiador 2
está entre nós. Não faz a menor diferença, não precisava existir, mas não é
exatamente ruim.
Ecos da eternidade
A narrativa é centrada em Lucius
(Paul Mescal), filho de Lucilla (Connie Nielsen) e Maximus (Russell Crowe) do
primeiro filme. Para ser mantido em segurança Lucius foi mandado para longe e
se tornou um guerreiro no norte da África. Quando suas terras são conquistadas
por Roma e sua esposa é morta pelo general Acacius (Pedro Pascal) ele é vendido
como escravo e usado como gladiador pelo inescrupuloso Macrinus (Denzel
Washington). Agora Lucius retorna à Roma para se vingar do general e dos cruéis
imperadores Geta (Joseph Quinn, de Stranger Things) e Caracalla (Fred Hechinger).
É basicamente a mesma premissa do
primeiro filme, mas tudo é duplicado. Ao invés de um guerreiro que luta por
vingança e para restaurar a justiça em Roma temos essas motivações divididas
entre Lucius e Acacius. Ao invés de um imperador imaturo e sádico temos dois em
Geta e Caracalla,
mas de resto é a mesma história sobre defender “o sonho de Roma” que embalou a
história trágica de Maximus.
Repetição também está no trabalho
do elenco ainda que entreguem performances competentes. Denzel Washington devora o cenário ao interpretar Macrinus como uma
versão romana e com mais joias do que um bicheiro carioca de seu Alonzo de Dia de Treinamento (2001). Macrinus é um
sujeito ardiloso, que joga em vários lados sempre visando o ganho pessoal e
está sempre a frente dos oponentes, como se ele estivesse jogando xadrez
enquanto os demais jogassem damas. É um personagem que domina cada cena em que
está, mas a essa altura da carreira Washington o interpretaria com as mãos
amarradas nas costas. Connie Nielsen traz a mesma dignidade e altivez a Lucille que apresentava
no original, enquanto Pedro Pascal traz um misto de honra e desilusão a
Acacius.
Os dois imperadores, por outro
lado são tão histriônicos que pendem para a caricatura. Joseph Quinn se sai um
pouco melhor ao conseguir injetar algum mínimo grau de humanidade a Geta, mas o
Caracalla de Fred Hirchinger passa do ponto do exagero e soa como um vilão de
desenho animado. Sim, eu entendo que ele deveria ser um sujeito louco com o
cérebro carcomido pela sífilis, mas mesmo entre toda essa loucura há uma pessoa
ali (pensem em Forrest Whitaker como Idi Amin em O Último Rei da Escócia) e o trabalho de Hirchinger é tão exagerado
ao ponto de soar falso.
Arena Mortal
O primeiro filme foi alvo de
críticas por sua falta de precisão histórica, algo que nunca me incomodou
pessoalmente, mas aqui Scott desvia tanto da realidade que o filme praticamente
entra no domínio da fantasia. Digo isso não apenas por sua trama se povoada por
muitos personagens ficcionais, mas por uma série de eventos que transcorrem,
principalmente dentro da arena do Coliseu. Aqui vemos batalhas com
rinocerontes, uma batalha naval com direito a tubarões nadando na arena uma
série de outras ocorrências que qualquer leigo é capaz de dizer que se trata de
liberdades artísticas.
Não que a ação seja ruim, pelo
contrário, ela é um dos pontos altos do filme. Essas liberdades que Scott toma
servem para evidenciar ainda mais a opulência e desigualdade de sua Roma
corrompida que gastava horrores com esses jogos no Coliseu enquanto a população
ficava à míngua e os espetáculos brutais serviam como uma distração para essa
miséria. A condução de Scott é eficiente em construir o senso de escala dessas e
o caos brutal desses embates. São lutas vencidas tanto na estratégia quanto na
força e cujas consequências sangrentas o filme faz questão de exibir. Seja nas
batalhas mais grandiosas ou em duelos mais íntimos, como na luta entre Lucius e
Acacius, a produção instila uma energia intensa na ação e um senso de que
Lucius e outros personagens passam por um risco palpável de serem derrotados. O
senso de grandiosidade e de tragédia também é construído pela música, inclusive
com o uso de faixas da trilha do primeiro filme como Now We Are Free de Hans Zimmer cuja melodia dá senso da jornada
grandiosa de seus personagens enquanto os vocais de Lisa Gerrard, cuja letra
menciona liberdade, constrói a dimensão transcendental e trágica dessa
história.
É por conta desse senso de
grandiosidade da ação e pelo trabalho do elenco que Gladiador 2 consegue oferecer algo de interessante ainda que não
tenha nada que Ridley Scott já não fez melhor antes. De certa forma é como ver
aquela banda que você gosta e que já não toca como antes sair em uma turnê
cantando seus melhores sucessos. É bacana, mas você sabe que é uma reprodução
menor do que veio antes.
Não esperava muita coisa de Operação Natal. O trailer dava a
impressão de um blockbuster genérico,
feito para cumprir a cota de filmes natalinos do ano, mas o resultado é uma
aventura divertida, que cria um universo interessante e tem um inesperado calor
humano. Além do mais, em um ambiente em que praticamente todos os blockbusters são continuações de
franquias longevas ou pertencem a algum universo compartilhado, é um alívio
enorme assistir um filme-pipoca que não te cobra o “dever de casa” de ter
acompanhado meia dúzia de outros filmes, séries e spin-offs para conseguir minimamente se situar na narrativa. É bom
ver que Hollywood ainda sabe fazer filmes que você pode simplesmente sentar e
se divertir.
Papai Noel em perigo
A trama é centrada em Cal (Dwayne
“The Rock” Johnson), o guarda-costas pessoal do Papai Noel (J.K Simmons). Ele
está prestes a se aposentar por estar descrente com a humanidade, cuja lista de
pessoas malvadas já superou a de pessoas boazinhas. No seu último dia de
trabalho, Noel é sequestrado e a única pista é o hacker que ajudou os
sequestradores a encontrarem a fábrica do Papai Noel. Assim, Jack (Chris
Evans), que nunca acreditou em Papai Noel, é arrastado por Cal para descobrir o
paradeiro do bom velhinho.
De certa forma é uma trama bem
esquemática. Uma dupla de personalidades opostas, com Cal sendo o sisudo focado
na missão enquanto Jack é um malandro que tenta resolver tudo na lábia e sempre
busca tirar vantagem. É claro que ao longo da trama eles irão aprender algo um
com o outro e Jack, que está na lista dos malcriados desde criança, vai
aprender a ser bonzinho e se reaproximar do filho com quem tem pouco contato. É
previsível, mas funciona pelo carisma do elenco.
Chris Evans é bem divertido
fazendo um canalha de bom coração que aos poucos aprende a importância de
formar laços com outras pessoas enquanto Johnson funciona como o contraponto
mais sério à personalidade escorregadia de Jack. Evans inclusive encontra
momentos de emoção genuína nas conversas entre Jack e o filho durante o clímax.
J.K Simmons traz a Noel uma presença que é simultaneamente marcante e humilde.
É um sujeito que demonstra um grande poder, mas uma medida similar de
benevolência e afeto.
Universo fantasioso
A produção é criativa na
construção de seu universo em que seres mitológicos vivem ocultos em meio ao
nosso mundo, com uma agência secreta que mantem a paz entre seres lideradas
pela expediente Zoe (Lucy Liu). Cal, por exemplo, consegue se mover rapidamente
para qualquer lugar do mundo usando uma rede de portais que são acessados em
qualquer loja de brinquedos e uma manopla que pode transformar qualquer
brinquedo em um objeto real, como transformar um carrinho em miniatura em um
carro de verdade. Sim, esses momentos muitas vezes servem de publicidade para
algumas marcas de brinquedos, mas não deixam de gerar alguns momentos
divertidos.
O filme também acerta nas cenas
de ação e como usa diferentes criaturas de histórias natalinas, como os bonecos
de neve que congelam tudo em que tocam e servem de capangas para a vilã ou o
modo como Cal altera entre sua forma humana e sua forma de elfo enquanto luta usando
a variação de tamanho ao seu favor como se fosse o Homem-Formiga. O fato de boa
parte dessas criaturas serem feitas usando próteses e maquiagem ajuda a tornar
tudo mais crível e a dar um senso de materialidade a esse universo, como no
segmento em que Cal e Jack invadem o lar do Krampus (Kristofer Hivju), o irmão
maligno do Papai Noel, e todas as criaturas ali são primordialmente fruto de
efeitos práticos.
Inclusive nos momentos em que o
filme recorre a criaturas completamente digitais chega a ser difícil não sentir
algum estranhamento, já que elas não parecem pertencer ao mesmo universo que o
resto dos personagens, Alguns, como o urso polar Garcia, são convincentes, mas
outros nem tanto. O melhor exemplo disso é quando a bruxa Gryla (Kiernan Shipka,
de O Mundo Sombrio de Sabrina) assume
sua forma monstruosa durante o clímax e o resultado parece mais um design rejeitado para chefão de Dark Souls.
O texto ocasionalmente apresenta
algumas incongruências. Um exemplo é o fato de Cal trabalhar há séculos
protegendo o Noel e agindo como um guarda-costas pró-ativo e diligente, mas
quando é conveniente para o roteiro ele desconhece completamente como lidar com
determinadas criaturas embora ele se comporte como se já tivesse enfrentado
esses seres antes.
Mesmo com uma trama previsível, Operação Natal diverte pelo elenco
carismático e pelo universo criativo que mistura fantasia e realidade.
Hoje na coluna Drops, dedicada a
textos mais curtos, vou falar sobre dois filmes que acabei deixando passar
quando foram exibidos nos cinemas, Transformers:
O Início e Hellboy e o Homem Torto,
dois filmes que funcionam como recomeços para seus respectivos personagens.
Aventura “padrão Marvel”
Transformers: O Início acompanha a história de dois mineradores,
Orion Pax (Chris Hemsworth) e D-16 (Bryan Tyree Henry, de Atlanta) antes que eles se tornem os lendários Optimus Prime e
Megatron respectivamente. A trama mostra uma Cybertron arruinada, que depende
da constante mineração de energon para sobreviver enquanto o líder, Sentinel
Prime busca a mítica matriz da liderança para resolver o problema de energia do
planeta.
Desde o início incomoda como o
filme se apoia no expediente de ter seus personagens trocando piadinhas ou
diálogos engraçadinhos o tempo todo, muitas vezes comentando a própria trama,
como se esse tipo de humor “padrão Marvel” fosse um substituto para personagens
sem personalidade ou para uma trama mal escrita (tentar rir de um roteiro ruim
não é por si só engraçado). Isso é principalmente evidente em B-127 (que virará
o Bumblebee), cujo falatório constante é mais constrangedor e irritante do que
engraçado, e em Elita-1 (Scarlett Johansson), que é reduzida à “a garota”, se
limitando a reagir exasperada às ações dos demais personagens de maneira tão
clichê que imaginei que em algum momento ela fosse jogar os braços para cima e
dizer “ah, homens” aborrecida.