O Brasil, apesar da sua
miscigenação étnica, tem uma sociedade com vários preconceitos enraizados. É
uma sociedade que demonstra ter consciência da presença do preconceito no
cotidiano, mas não parece ser capaz de localizar onde está ou se manifesta esse
preconceito. Isso porque ele está, debaixo dos panos, acontecendo sob
instâncias que o relativizam e lhe dão um viés de normalidade. O documentário Menino 23: Infâncias Perdidas no Brasil
mostra exatamente um desses casos, no qual ações aparentemente inofensivas
traziam em si o julgo brutal do racismo.
Dirigido por Belisario Franca, o
documentário se baseia na pesquisa do historiador Sidney Aguilar. Por
intermédio de uma aluna, o historiador descobre tijolos contendo suásticas,
símbolo associado ao nazismo, em uma fazenda no interior de São Paulo.
Pesquisando sobre o local, descobriu que na década de 30 um trio de irmãos
simpatizantes do nazismo e do movimento integralista brasileiro pegavam garotos
órfãos negros em orfanatos e os levavam para a fazenda e os submetiam a um brutal
regime de trabalho escravo. Essa história tinha permanecido oculta até que
Sidney começou sua pesquisa.
O documentário faz um ótimo
trabalho em construir o contexto da época, um período no qual as pessoas eram
abertamente racistas e essa conduta era vista como praticamente uma virtude. Através
de documentos, imagens e áudios de arquivo, o filme vai nos mostrando como os
ideais de eugenia e superioridade branca dos regimes nazi-fascistas europeus
serviram para como justificativa "científica" (porque praticamente
todos os postulados eugênicos já foram cientificamente refutados) para manter
as populações negras excluídas e marginalizadas, mantendo uma estrutura social
funcionalmente racista. Através das evidências históricas vamos vendo como o
próprio Estado brasileiro validava esses ideais de supremacia branca.