quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Vencedores do XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema


Vencedores do XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema


O XIV Panorama Internacional Coisa de Cinema encerrou ontem e distribuiu os prêmios das suas mostras competitivas. Na competitiva nacional, o longa Luna foi escolhido como o melhor pelo júri oficial, enquanto que Ilha foi o eleito do júri jovem, recebendo também uma menção honrosa do júri oficial. Na competitiva baiana, o júri oficial premiou o documentário Bando, um filme de, dirigido por Lázaro Ramos e o júri jovem premiou o documentário Dr. Ocride. Confiram abaixo a lista completa de vencedores.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Crítica – A Voz do Silêncio


Análise Crítica – A Voz do Silêncio


Review – A Voz do Silêncio
A Voz do Silêncio é um daqueles filmes que constroem um grande mosaico de personagens, transitando entre diferentes histórias que eventualmente se conectam de alguma maneira. Me lembrou bastante o excelente Magnólia (1999), de Paul Thomas Anderson, não só pela sua estrutura de mosaico, como também pela temática de pessoas solitárias em busca de afeto ou alguma conexão e pelo eventual uso de uma ocorrência cósmica/fantástica/sobrenatural para arrematar todas essas histórias. No filme de Anderson é uma chuva de sapos retirada do Velho Testamento, aqui é um eclipse lunar que deixa a Lua vermelha.

Como acontece em muitas tramas que saltam constantemente entre múltiplos personagens e narrativas, o resultado aqui é irregular e nem todas as histórias envolvem como deveriam. A mais eficiente é a que envolve uma mulher solitária em seu apartamento, interpretada por Marieta Severo, falando sobre o filho que está viajando pelo mundo. É uma das tramas que o filme dá mais tempo de tela e talvez seja por isso que ela envolva mais que as demais, além, claro do trabalho de Marieta Severo como uma senhora que parece cada vez mais deslocada da própria realidade e anestesiada pela televisão.

Crítica – Ilha


Análise Crítica – Ilha


Review – Ilha
Em um determinado momento de Ilha, um personagem diz algo do tipo “nosso cinema é subdesenvolvido por natureza”. A frase serve como uma chave para entender o filme e as escolhas estéticas e temáticas feitas nele. Durante os anos 60 e 70, críticos, pesquisadores e cineastas como Glauber Rocha, Fernando Solanas, Octavio Getino ou Júlio García Espinosa já falavam sobre como o cinema poderia servir aos países latino-americanos para refletir sobre seu próprio subdesenvolvimento e condição colonizada.

Termos como “estética da fome”, “cinema impuro” ou “cinema imperfeito” eram usados por esses autores para falar de filmes feitos com poucos recursos e que acabavam deixando de lado a preocupação com uma perfeição da pureza ou perfeição estética em virtude da necessidade urgente de contar histórias sobre pessoas e comunidades marginalizadas que não tem suas vozes ouvidas. Ilha bebe nessa fonte, adotando uma estética propositalmente “suja” para tecer uma trama metalinguística sobre a natureza da representação cinematográfica e a vida no extremo sul da Bahia.

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Crítica – Parque do Inferno


Análise Crítica – Parque do Inferno


Review – Parque do Inferno
Entrando para assistir este Parque do Inferno, a impressão é de que seria uma versão piorada de Pague Para Entrar, Reze Para Sair (1981), um terror oitentista dirigido por Tobe Hooper, responsável por O Massacre da Serra Elétrica (1974). Tendo visto Parque do Inferno posso dizer que, bem, é isso mesmo.

A trama segue Natalie (Amy Forsyth) uma garota certinha que desde os primeiros minutos fica evidente que será a única a sobreviver ao que acontecerá. Junto com algumas amigas de faculdades e seus respectivos namorados, Natalie vai a um parque que é montado na cidade toda época de Dia das Bruxas e que já foi palco de um assassinato dois anos antes. Os amigos de Natalie todos falam de bebida e sexo, o que em termos de terror slasher significa que eles obviamente irão morrer.

Aí reside o primeiro problema. O filme se apoia em clichês velhos, cujo próprio cinema hollywoodiano já apontou a obviedade a exemplo da franquia Pânico ou o metalinguístico o Segredo da Cabana (2012). Ainda assim, Parque do Inferno recicla toda essa miríade de lugares comuns sem um quantum de ironia ou autorreflexividade, aderindo acriticamente a fórmulas manjadas e previsíveis.

Crítica – Deslembro


Análise Crítica – Deslembro


Review – DeslembroA diretora Flávia Castro já tinha abordado a questão dos desaparecidos políticos da ditadura militar brasileira em seu documentário Diário de uma Busca (2010) no qual ela tentava desvendar a morte do pai, um dos muitos desaparecidos políticos do período. Ela volta a esse período, agora com um filme de ficção, neste Deslembro.

Joana (Jeanne Boudier) é uma adolescente brasileira que morou boa parte de sua vida na França depois que sua mãe fugiu do Brasil por conta da ditadura militar e seu pai foi morto pelo mesmo regime. Por conta da lei de anistia, sua família agora pode retornar ao país, mas Joana não está contente em retornar a um país que, para ela, é sinônimo de morte e tortura. No Brasil, memórias perdidas de infância vão aos poucos retornando a Joana e ela vai tentando entender o que aconteceu com o pai.

O senso de deslocamento de Joana em relação ao Brasil é denotado por escolhas bastante deliberadas de quando ela fala em português ou em francês. Sempre que a personagem se sente desconfortável ou incompreendida, como na cena em que ela pergunta à mãe o que significa ser desaparecido político, ela recorre ao francês quase como um mecanismo inconsciente para demonstrar o quanto ela se sente estrangeira aqui. Esse sentimento de inadequação também é percebido em outras falas da personagem, como a breve pausa que ela dá antes de falar “vó” em uma conversa com a avó ao telefone, como se a ideia de ter uma avó, uma mulher que ela mal conhece, ainda não lhe soasse natural.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Crítica – Infiltrado na Klan


Análise Crítica – Infiltrado na Klan


Review – Infiltrado na Klan
Iniciar um texto sobre Infiltrado na Klan não é fácil, ainda mais quando eu ainda estou sentindo o impacto do filme sobre mim e talvez seja difícil articular uma opinião sobre ele mesmo dias depois de tê-lo visto, mas tentarei fazer o meu melhor. A verdade é que o diretor Spike Lee, em seu melhor filme desde A Última Noite (2002), coloca o dedo em uma ferida social que muitas vezes ignoramos ou subestimamos a periculosidade por tempo demais, lembrando de como muitos eventos atuais acontecem porque não prestamos atenção à nossa história de preconceito e segregação. Digo nossa porque por mais que Lee se detenha a algo ocorrido nos Estados Unidos, muito do que ele retrata da ascensão do preconceito e intolerância é análogo à nossa história, em especial nossa história (muito) recente.

A trama é baseada na história real passada no interior dos Estados Unidos na década de 70. Ron Stallworth (John David Washington, filho do Denzel Washington) se torna o primeiro policial negro da cidade de Colorado Springs e decide se infiltrar na organização racista Klu Klux Klan para aprender mais sobre eles e o que planejam fazer na cidade. Ele consegue estabelecer contato com as lideranças da organização por telefone, mas sendo Ron um homem negro e seus alvos supremacistas brancos, ele não pode ir para os encontros, deixando a tarefa para o colega Flip (Adam Driver), um policial branco e judeu que também não apreço pela Klan.

Crítica – Tinta Bruta


Análise Crítica – Tinta Bruta


Review – Tinta Bruta
Tinta Bruta é, antes de mais nada, uma narrativa sobre solidão. O filme trata de outros temas como homofobia ou o distanciamento causado por redes sociais, mas é o isolamento vivenciado pelo protagonista e sua necessidade de tentar romper com essa existência solitária que funciona como força motriz da trama.

A história é centrada em Pedro (Shico Menegat), um jovem de Porto Alegre que foi expulso da faculdade e enfrenta julgamento pelo delito que levou à expulsão. Ele não tem amigos e vive com a irmã, que está de malas prontas para assumir um novo emprego em Salvador. A única ocupação de Pedro são os shows eróticos que faz via webcam no qual dança e tira a roupa para espectadores pagantes enquanto se pinta com tintas neon. Sua audiência, no entanto, está caindo e ele descobre o motivo ao conhecer Leo (Bruno Fernandes), um estudante de dança que também faz performances via webcam com neon. Inicialmente, Pedro procura Leo para pedir que o dançarino pare de copiar seu estilo, mas aos poucos os dois vão se aproximando e se apaixonando.

Crítica – A Sombra do Pai


Análise Crítica – A Sombra do Pai


Review – A Sombra do Pai
A sociedade delimita papéis e condutas muito claras para homens e mulheres. Quem nunca ouviu frases como “homem não chora”? São chavões que à primeira vista podem até parecer inocentes, mas constroem um ideal limitador e tóxico do que é a masculinidade. A Sombra do Pai, da diretora Gabriela Amaral Almeida, vai examinar esse distanciamento emocional masculino a partir de uma chave de filme de terror.

A garota Dalva (Nina Medeiros) perdeu a mãe recentemente, mas a tia, Cristina (Luciana Paes), acaba preenchendo esse vazio na vida da menina, morando com ela e o pai, Jorge (Júlio Machado). Cristina é adepta a realizar algumas simpatias usando uma imagem de Santo Antônio para tentar arrumar um marido e diz que Dalva tem um dom natural para se comunicar com o sobrenatural e fazer as coisas acontecerem. Quando Cristina anuncia que vai se casar e vai morar longe de Dalva, a menina começa a pensar em alguma maneira de trazer de volta a falecida mãe para não ter que ficar sozinha com o distante (física e emocionalmente) pai.

domingo, 18 de novembro de 2018

Crítica – Luna


Análise Crítica – Luna


Review – Luna
Uma garota percebe olhares diferentes dos colegas de escola. Ela então pega o celular e começa a chorar com o que vê. Em casa, mensagens abusivas e agressivas chegam a ela via redes sociais. Sentindo-se acuada, ela grava um vídeo para a mãe que mais soa como uma carta de suicídio. Tudo isso acontece nos primeiros minutos de Luna e se essa premissa parece mais uma história trágica de cyberbullying e slut shaming, o que o diretor Cris Azzi faz a seguir consegue subverter nossas expectativas.

A trama é centrada em Luana (Eduarda Fernandes), uma adolescente cuja vida é aparentemente banal. Ela faz amizade com Emília (Ana Clara Ligeiro), recém-chegada à sua escola. A amizade com Emília faz Luana explorar sua sexualidade e também a frequentar chats de vídeo via internet no qual Luana conversa com outras pessoas usando uma máscara e nome falso para proteger a própria identidade.

Durante boa parte da projeção, Luna é uma trama bem típica de amadurecimento e autodescoberta, mas que conquista pelo carisma e naturalidade que as intérpretes de Luana e Emília têm juntas. Aos poucos, no entanto, seu olhar vai passando do amadurecimento para as tensões enfrentadas pelas mulheres ao explorar o próprio corpo. De um lado há o medo das represálias sociais, o temor de ser “mal vista” ou criticada por se sentir segura ou confortável consigo mesma. Do outro, há o temor disso atrair a atenção de predadores, da violência sexual e abusos físicos.

sábado, 17 de novembro de 2018

Crítica – Azougue Nazaré

Análise Crítica – Azougue Nazaré


Review – Azougue Nazaré
Uma consulta ao dicionário revela que a palavra “azougue” está associada ao elemento químico mercúrio. Também me diz que a palavra se refere a alguém com muita vivacidade e inquietude. Os dois adjetivos casam muito bem com Azougue Nazaré, primeiro longa-metragem de Tiago Melo.

A trama se passa na cidade de Nazaré da Mata, interior de Pernambuco, e acompanha um grupo de personagens ligados a um clube de maracatu da cidade, mostrando os desafios deles para montar o espetáculo para o próximo carnaval, bem como as tensões entre aqueles que acompanham as tradições seculares do maracatu e os líderes de igrejas evangélicas locais. Uma das figuras centrais da trama é Tião (Valmir do Coco), que durante as apresentações de maracatu assume a persona de Catita Daiana.

O filme cria uma atmosfera enérgica, vibrante e com um quê de misticismo em relação ao maracatu. Caboclos de lança vagam pelas ruas e canaviais da cidade como um lembrete constante de que esta tradição cultural é algo vivo daquele local e está em constante movimento. A trama por vezes dá guinadas inesperadas, levando o espectador por insólitos caminhos, ainda que ocasionalmente deixe elementos em aberto ou sem conclusão. Essas não resoluções, no entanto, soam mais como uma escolha deliberada do que descuido, revelando como essas pessoas vivem tanto para o carnaval e o maracatu que deixam de lado outros aspectos de sua vida.