Na minha época de colégio, quando
estudávamos a abolição da escravatura, tudo parecia um gesto magnânimo da
Princesa Isabel. Concebemos os séculos de escravidão como um período
aparentemente pacífico, como se os escravos aceitassem tranquilamente essa condição
subalterna, quando na realidade revoltas eram mais comuns do que os relatos
oficiais nos fazem crer. Nesse sentido, a existência de filmes como este Doutor Gama é importante para expandir o
entendimento do público a respeito desse período e como havia uma constante
luta da população negra, pela força ou meios legais, para tentar emancipar seu
povo.
A trama acompanha a história real
de Luiz Gama (Cesar Mello), advogado negro que trabalhava para libertar
escravos. A narrativa o segue desde a infância, quando foi injustamente vendido
como escravo apesar de ter nascido livre, até a idade adulta quando decide
defender um jovem escravo acusado de matar o seu senhor.
Cesar Mello consegue trazer uma
personalidade magnética e um discurso apaixonado para Gama, tornando crível a
capacidade do advogado em argumentar e convencer brancos donos de fazenda da
chaga que era a escravidão e da injustiça que isso representa ao povo negro.
Nesse sentido, o filme acerta em mostrar as injustiças e sofrimento aos quais
os escravos são submetidos, sem reduzir isso a um espetáculo de violência e
miséria. Do mesmo modo, acerta em mostrar Gama como um sujeito autônomo, capaz
de cuidar de si mesmo sem precisar ser constantemente resgatado por brancos,
algo muito comum nas narrativas sobre superação de preconceitos no Brasil.