Depois do sucesso de animações
baseadas em games como Castlevaniae Arkane tudo parecia indicar que a
produção seguinte da Netflix nesse filão, Cuphead:
A Série, manteria o alto nível. O resultado, apesar de competente, não
encanta o quanto deveria.
A narrativa acompanha as
aventuras dos irmãos Xicrinho e Caneco (acompanhando a tradução dos games para
os nomes de Cuphead e Mugman) na Ilha Tinteiro. São episódios com histórias
majoritariamente isoladas, com a trama de Xicrinho dever sua alma ao Diabo só
voltando em alguns poucos momentos.
Tal como nos games, a estética
remete às animações de 1930, com granulações na imagem para imitar película,
trilha musical composta por jazz e ragtime, além de personagens com a chamada
estética “rubber hose”, no qual eles não tem articulações bem definidas e seus
membros se comportam como mangueiras plásticas. Assim como essas animações de
outrora, também há uma pecha pelo macabro, com alguns elementos sombrios.
A primeira temporada de Space Forcebrincava com os delírios
militaristas dos Estados Unidos governados por Trump. Todo mote da série se
centrava em pensar o quão ridícula era a ideia do então presidente de colocar
tropas de soldados no espaço. Pois agora, nesta segunda temporada, a série
surge diante um clima político diferente e luta para reestruturar seu caminho
agora que o país já não precisa mais lidar com os delírios trompistas.
Esse acaba sendo o grande
problema da temporada, que não tem exatamente um arco ou uma mensagem que
costure esse segundo ano. Cada episódio parece levar a série em direções
diferentes, tentando fazer da “Força Espacial” uma iniciativa internacional em
um episódio, para no seguinte a divisão ser responsável pela exploração
espacial e no outro por monitoramento de ameaças vindas do espaço. É como se os
criadores não tivessem se planejado para a mudança cultural no país e agora
estivessem jogando qualquer coisa na parede para ver o que cola tentando achar
algum jeito de tornar a série relevante em um contexto pós-Trump.
A temporada tem melhor sorte
quando foca nos personagens, aprofundando as relações entre eles ou explorando
interações entre diferentes personagens que não aconteciam tanto no ano de
estreia. Erin (Diana Silvers), filha do general Naird (Steve Carell), que tinha
sido tratada de modo unidimensional na primeira temporada, aqui tem mais tempo
para ser desenvolvida, explorando mais suas inquietações em ser constantemente
levada pelo pai de uma missão para outra. Tony (Ben Schwartz), o escorregadio
assessor de imprensa também ganha mais desenvolvimento conforme a trama explora
suas vulnerabilidades e inseguranças. A amizade entre o doutor Mallory (John
Malkovich) e o doutor Chan (Jimmy O. Yang) é mais aprofundada, assim como são
construídos novos relacionamentos, a exemplo do enlace romântico entre Chan e
Ali (Tawny Newsome).
Isso ajuda a dar o espectador
alguma coisa para se manter envolvido com a série mesmo quando a temporada soa
à deriva e sem foco. Assim como em seu ano de estreia, a série também oferece
bons momentos de humor, aqui mais focados em parodiar situações de trabalho do
que os elementos de sátira política que estavam mais presentes no primeiro ano.
Com situações que divertem pelo puro absurdo, como a “guerra de pegadinhas”
entre Naird e Mallory, a temporada consegue divertir, mas sem nunca atingir os
níveis de comicidade de outras séries do criador Greg Daniels como The Office ou Parks & Recreation.
Com uma trama que nunca consegue
dizer a que veio e um texto que soa perdido em busca de nova identidade, a
segunda temporada de Space Force só
funciona quando foca em seus personagens.
É difícil não olhar para este Belfast e não pensar em outros filmes
sobre infância vivida em tempos de tensões políticas e sociais como Alemanha, Ano Zero(1948) ou O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias
(2006). Mostrar esses períodos sobre o prisma da infância permite entender como
essas tensões afetaram até mesmo aqueles que não tinham plena consciência do
que acontecia à sua volta.
O diretor Kenneth Branagh baseia
a trama em sua própria infância na cidade de Belfast, na Irlanda, durante a
década de 1960. O garoto Buddy (Jude Hill) gosta de brincar e assistir filmes,
mas seu cotidiano é constantemente interrompido pelos conflitos violentos entre
protestantes e católicos. Aos poucos o garoto também percebe os conflitos entre
o pai (Jamie Dornan) e a mãe (Caitriona Balfe) que brigam por conta de dinheiro
e do que fazer diante das tensões sociais que se agravam.
Mais do que falar sobre essas
questões sociais e políticas, Branagh usa essa história para falar de seus anos
formativos. Sabendo que se baseia em experiências autobiográficas é possível
ver como o diretor insere a influência da ficção e do cinema em sua vida,
mostrando como Buddy ficava imerso nos filmes que assistia, como na cena em que
ele e a família assistem a O Calhambeque
Mágico (1968).
Durante todo meu tempo com os
entediantes 83 minutos deste novo O
Massacre da Serra Elétrica: O Retorno de Leatherface, tudo que eu pensava era: “qual o motivo disso
existir?”. Não há aqui nenhuma nova perspectiva, nada interessante a ser dito e
apesar de eventualmente apresentar um gore
bem feito, é muito pouco para sustentar o tédio do resto da experiência.
Apesar de querer ser uma
continuação direta do filme original do Tobe Hooper nos moldes do recente Halloween (2018), a trama não tem nada a
dizer sobre o vilão Leatherface ou mesmo sobre a heroína do original, Sally
Hardesty, cuja presença não tem qualquer repercussão na trama (poderia ser uma
personagem original que não faria diferença). O texto poderia ter usado o fato
dos protagonistas serem hipsters dispostos a basicamente gentrificar a
cidade-fantasma habitada por Leatherface e transformar esses jovens em vilões que
estão ali para expulsar pessoas humildes de seus lares para ganhar dinheiro e
Leatherface sendo uma espécie de força de resistência. O filme, no entanto,
nunca aproveita o subtexto que tenta apresentar.
A trilogia Batman de Christopher
Nolan criou uma espécie de modelo para filmes de super-heróis em termos de
apresentarem um realismo convincente ao mesmo tempo em que mantinha a grandiloquência
deste tipo de história. Mais de dez anos depois do fim da trilogia, ela
continua influenciando a produção deste tipo de história, como este novo Batman, dirigido por Matt Reeves. A questão
é que agora esse modelo “nolanizado” de realismo funcional soa mais como limitador
do que ampliador de horizontes.
Na trama, Bruce Wayne (Robert
Pattinson) já está há dois anos trabalhando como Batman e questiona se está
fazendo alguma diferença. Tudo muda quando o misterioso Charada (Paul Dano) começa
a matar figuras proeminentes de Gotham City. Cabe ao Batman investigar os
crimes ao lado do tenente Gordon (Jeffrey Wright), seu único aliado em meio à
corrupção que assola a polícia, e da misteriosa Selina Kyle (Zoe Kravitz), que
esconde uma ligação com o mafioso Carmine Falcone (John Turturro).
É uma trama que foca mais no lado
detetivesco do Batman e que, por isso, consegue trazer algum frescor, já que é
uma faceta que sempre foi deixada de lado em outras versões do personagem. Por
outro lado, toda a abordagem que remete ao trabalho de diretores como Michael
Mann ou David Fincher já tinha sido explorada na trilogia de Nolan e, nesse
sentido, o filme de Reeves acaba sendo mais um retrato realista e funcional do
homem morcego, com pouco a se diferenciar do que veio antes.
Quando joguei o primeiro beta de The King of Fighters XV confesso que
fiquei bem empolgado. Era um refinamento de tudo que KOF XIV tinha feito com melhores e melhor netcode. Não cheguei a
jogar o segundo beta, mas tudo parecia bem promissor. Tendo jogado o produto
final, devo dizer que ele entregou tudo que o beta prometia, ainda que falte
variedade nos modos.
A trama segue os eventos de KOF XIV. Depois da derrota de Verse, que
trouxe de volta personagens que todos acreditavam estar mortos para sempre, um
novo torneio é organizado. Shun’ei continua a tentar entender seus poderes, se
juntando a Meitenkun e Benimaru, mas o herói encontra uma rival em Isla, uma
garota com poderes similares aos seus. Isla se junta à misteriosa sacerdotisa
Dolores e a Heidern, que tentam desvendar os mistérios de Verse.
O que o jogo chama de Modo
História é basicamente um tradicional modo arcade, no qual o jogador enfrenta
uma série de adversários da CPU até enfrentar o chefão final e assistir o
desfecho de sua equipe. É bem apresentado, com algumas cutscenes plenamente
computadorizadas (principalmente para algumas equipes canônicas) e os finais
trazem bastante da trama, embora sejam compostos de imagens estáticas e texto
sem voz. Inserir dublagem nos finais ajudaria a dar mais alguma emoção a esses
desfechos.
Depois de uma fraca terceira temporada com um antagonista raso, The
Sinner volta à sua boa forma com uma trama mais instigante e personagens
interessantes, ainda que o arco do detetive Ambrose não tenha muito a dizer
sobre o protagonista. Na trama, Harry Ambrose (Bill Pullman) está aposentado e
vai passar férias em uma ilha junto com sua nova namorada. Lá ele conhece a
jovem Percy (Alice Kremelberg), com quem desenvolve uma amizade. Quando Percy
desaparece, supostamente tendo cometido suicídio, Ambrose se envolve na
investigação e começa a desencavar segredos ocultos da pequena cidade.
A trama já se diferencia das
outras temporadas ao começar com um suicídio ao invés de assassinato. Isso
permite explorar outras facetas de culpa, conforme a investigação de Harry
aponta para Percy guardando um segredo que tornou impossível de suportar. A
culpa é algo que corrói a jovem por dentro e entender de onde vem um sentimento
tão poderoso, tão insuportável que a impele ao suicídio, é a principal força
que move a temporada.
Alice Kremelberg aparece
relativamente pouco considerando a centralidade de Percy para a trama, mas faz
valer cada cena ao construir Percy com um desespero silencioso. Uma pessoa que
mesmo quando parece serena ou estoica, demonstra um olhar cansado e uma
expressão de que carrega consigo um peso muito maior do que seria capaz de
suportar.
Mais novo trabalho de Pedro
Almodóvar, Mães Paralelas parte de
uma das mais batidas premissas do melodrama: a troca de bebês. Apesar disso, o
diretor espanhol insere outros elementos que afastam seu filme de uma mera
reprodução de clichês e traz outras ponderações para além do tema da
maternidade.
A trama é centrada em Janis
(Penélope Cruz) e Ana (Milena Smit), duas mulheres cujo parto ocorre no mesmo
dia e dividem um quarto de hospital. Quando Janis volta para casa, o pai de sua
filha, Arturo (Israel Elejalde) diz não reconhecer a criança, achando não ser o
pai. Janis faz um teste de DNA e descobre que ela também não é a mãe do bebê
que levou para casa, desconfiando que sua filha foi trocada com a de Ana na
maternidade. Assim, ela eventualmente procura Ana, mas ao saber que o bebê que
Ana levou para casa morreu, Janis desiste de contar a verdade, mas traz Ana
para trabalhar de babá da filha. Aos poucos as duas se aproximam e outros
sentimentos afloram.
Como disse antes, o filme podia
focar nessa tragédia da troca dos bebês e no sentimento que isso gera, mas
parte desse microcosmo para falar sobre maternidade e memória. Sobre o peso das
escolhas que mulheres fazem (ou são forçadas a fazer quando se tornam mães) e
da importância da memória e conhecimento sobre suas origens. Janis é uma mulher
que não conheceu o pai e cuja família é composta de gerações de mães solteiras.
Ana não tem certeza do pai de sua filha, que pode ser fruto de um estupro e tem
uma relação distante com a mãe que a deixou com o pai para tentar ser atriz.
São pessoas marcadas pelo que não conhecem sobre si mesmas ou suas famílias e,
por isso, sentem-se à deriva em muitos momentos.
Em seu cerne, No Ritmo do Coração é a típica história
de um jovem que busca o sonho de ser artista, mas enfrenta resistência da
família por ir contra os planos daquilo que esperavam. É algo bem prototípico,
presente desde O Cantor de Jazz (1927),
um dos primeiros filmes falados. No Ritmo
do Coração, no entanto, se diferencia ao falar sobre a experiência de PCDs,
especificamente uma família de surdos.
Na trama, Ruby (Emilia Jones)
está terminando o colegial e é incentivada por um professor a tentar faculdade
de canto. Ela é a única pessoa capaz de ouvir em sua casa, com o pai, Frank
(Troy Kutsur), a mãe, Jackie (Marlee Matlin), e o irmão Leo (Daniel Durant),
sendo surdos. A família de Ruby trabalha com pesca e eles se acostumaram a ter
Ruby como voz e intérprete no seu cotidiano de trabalho. Assim, quando ela
começa a se afastar da família para se preparar para tentar uma bolsa de
estudos para a faculdade, isso cria conflitos em casa.
Seria aquela estrutura já
conhecida da jovem em busca de um sonho que já ouvimos tantas vezes, mas aqui
essa trama familiar é usada para falar sobre as experiências das pessoas surdas
em nossa sociedade e como é viver em uma família assim. Há uma naturalidade
enorme na convivência entre o elenco que interpreta o núcleo familiar
principal, nos fazendo acreditar que são de fato pessoas que viveram sempre
juntas. O trabalho de Troy Kutsur se destaca, fazendo de Frank um sujeito
endurecido pelas dificuldades da vida, mas ainda assim um sujeito bem humorado
que ama a esposa e os filhos. Eugenio Derbez também traz leveza e humor como o
professor de música de Ruby.
Quando a série do Pacificador foi anunciada antes mesmo da
estreia de O Esquadrão Suicida
(2021), parecia que mais uma vez a Warner/DC estava metendo os pés pelas mãos
forçando o seu universo compartilhado sem saber se funcionaria. Felizmente não
só o filme do Esquadrão dirigido por James Gunn é bem bacana, como série
surpreende e consegue humanizar um personagem que, de outro modo, seria
meramente um babaca fascistoide.
Depois dos eventos de O Esquadrão Suicida, o Pacificador (John
Cena) sai do hospital e é mais uma vez recrutado pela Argus para caçar as
“borboletas”, seres alienígenas que estão controlando a mente de pessoas em
posições de poder. A nova missão também coloca o personagem em rota de colisão
com o pai, Auggie (Robert Patrick), que lidera uma gangue de supremacistas
brancos.
Desde as primeiras cenas quando
um faxineiro do hospital faz piada com o fato do Pacificador ser um
exterminador de minorias, já fica claro que James Gunn quer usar essa trama e o
personagem como um indiciamento desses heróis violentos que acham que matar os
inimigos resolve tudo. Assim como em O Esquadrão Suicida, o roteiro usa ironia para apontar o paradoxo do
raciocínio do Pacificador em matar qualquer um em nome da paz e como esse
discurso é algo que cabe mais a tiranos ou genocidas do que um super-herói.