segunda-feira, 9 de setembro de 2024

Crítica – O Bastardo

 

Análise Crítica – O Bastardo

Review – O Bastardo
Histórias sobre a colonização de algum espaço costumam ser narradas como feitos heroicos de pessoas enfrentando ermos cheios de intempéries ou subjugando populações nativas, sem, no entanto, ponderar sobre as consequências ou a inerente violência desse processo colonial. A produção dinamarquesa O Bastardo, uma das escolhas do país para o Oscar, traz um pouco de ponderação sobre o egoísmo humano que está no cerne desse impulso desbravador.

A narrativa é baseada na história real de Ludvig Kahlen (Mads Mikkelsen) militar dinamarquês responsável por colonizar a península da Jutlândia no século XVIII, que hoje compreende a maior parte do território dinamarquês. Estabelecer o primeiro assentamento da região, no entanto, não era uma tarefa fácil e o reinado dinamarquês já tinha perdido o interesse no espaço. É apenas quando Kahlen propõe custear a empreitada do próprio bolso que a Coroa lhe dá permissão para construir seu assentamento. Lá, Kahlen enfrenta as intempéries do ermo, a dificuldade de cultivar um solo tomado por urzes, os saqueadores e principalmente as sabotagens perpetradas pelo magistrado local Frederik De Schinkel (Simon Bennebjerg) que quer as terras para si.

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Drops – Os Provocadores

 

Análise – Os Provocadores

Review – Os Provocadores
Reunindo Casey Affleck e Matt Damon depois de ambos dividirem a cena na trilogia Onze Homens e Um Segredo, Os Provocadores tenta ser um filme de roubo que mistura comédia e algum comentário político. A trama segue Rory (Matt Damon) e Cobby (Casey Affleck), dois sujeitos que estão em um péssimo momento de suas vidas que aceitam a proposta do pequeno criminoso Scalvo (Jack Harlow, do fraco remake de Homens Brancos Não Sabem Enterrar) para roubarem o dinheiro de propina que o prefeito Miccelli (Ron Perlman) tem escondido em um cofre. O assalto dá errado e agora Rory e Cobby são homens procurados precisando encontrar um meio de fugirem da cidade, indo pedir ajuda à terapeuta de Rory, a dra. Rivera (Hong Chau).

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Crítica – Twisters

 

Análise Crítica – Twisters

Review – Twisters
Filmes-catástrofe não fazem muito meu estilo e não morro de amores pelo primeiro Twister (1996), então não fiquei exatamente empolgado com o anúncio desse Twisters. Parecia só mais uma dessas continuações tardias que existe para capitalizar em cima da nostalgia do espectador. Talvez por isso eu tenha ficado surpreso com o fato de que o filme se concentra mais em seus novos personagens sem se preocupar muito com referências ao original.

Novos rostos

A trama é protagonizada por Kate (Daisy Edgar-Jones), meteorologista que desenvolve um protótipo que pode dissipar tornados. As coisas dão errado durante o teste e quase toda sua equipe morre. Anos depois, ela trabalha em Nova Iorque quando o antigo colega, Javi (Anthony Ramos), a procura para uma nova caçada a tornados. Javi está trabalhando para o empreendedor Scott (David Corenswet), que financia sua pesquisa de escaneamento de tornados. Com esse mapeamento, Kate poderia aperfeiçoar seu protótipo e, assim, ela aceita participar da empreitada. Chegando no interior do país, a equipe de Kate esbarra no grupo de youtubers liderado por Tyler (Glen Powell), cuja postura é bem menos profissional que a equipe de cientistas da qual Kate faz parte.

terça-feira, 3 de setembro de 2024

Crítica – Othelo: O Grande

 

Análise Crítica – Othelo: O Grande

Review – Othelo: O Grande
Um dos atores de carreira mais longeva e marcante na dramaturgia brasileira, Grande Otelo, nome artístico de Sebastião Bernardes de Souza Prata, demorou para ter o devido reconhecimento. Parte disso se deve ao racismo da época em que ele atuou, parte por sua trajetória ser muito marcada pela comédia, um gênero muitas vezes considerado “menos artístico” ou “menos sofisticado”. O documentário Othelo: O Grande reconta a trajetória do ator, suas dificuldades, seus triunfos e seu ativismo político.

Memória audiovisual

A narrativa é toda contada através de imagens de arquivo, usando produções das quais Otelo participou e também várias entrevistas e discursos públicos que o ator deu ao longo de sua carreira. A pesquisa de arquivo é a principal força do filme trazendo imagens raras e em ótima qualidade de trabalhos antigos, como o Moleque Tião ou suas comédias para a Atlântida, que quase sempre encontramos em qualidade ruim pela internet.

A pesquisa de arquivo também é eficiente nas falas que traz do ator, com ele trazendo desde seus posicionamentos, denunciando o racismo ao longo de sua trajetória, narrando experiências com diretores renomados, como a impagável fala em que conta como foi trabalhar com Werner Herzog em Fitzcarraldo (1982), e também refletindo sobre a natureza da dramaturgia brasileira nos palcos, no cinema e na televisão. Há uma fala interessante de Grande Otelo sobre o Cinema Novo em que ele pondera que o fato do movimento nunca ter atingido as massas como almejavam seus agitadores provavelmente se relacionava com a linguagem experimental de seus filmes, mencionando como uma produção como Macunaíma (1969) teve penetração junto ao público justamente por ter uma linguagem mais próxima das comédias populares de sua época.

Otelo e o cinema brasileiro

Nesse sentido, conhecer a história de Grande Otelo é também conhecer a história do teatro e do audiovisual brasileiro, considerando a longevidade de sua trajetória e a amplitude de diretores e movimentos com os quais colaborou. Vemos o histórico de racismo na dramaturgia onde até mesmo alguém da competência de Grande Otelo tinha dificuldade em conseguir trabalho porque papéis negros eram interpretados por brancos em blackface, algo que Joel Zito Araújo também mostrou no documentário A Negação do Brasil (2001). 

Acompanhando a trajetória de Grande Otelo vemos a ascensão das chanchadas (não confundir com pornochanchadas) da Atlântida em filmes como Carnaval Atlântida (1952). Testemunhamos o surgimento de diretores como Nelson Pereira dos Santos, com quem Grande Otelo trabalhou em Rio, Zona Norte (1957) e a eclosão de vanguardas como o Cinema Novo. Vemos o surgimento e a consolidação da televisão como meio de comunicação de massa e sua difusão pelo país no trabalho de Grande Otelo em programas como A Escolinha do Professor Raimundo. Como o filme nos mostra, conhecer Grande Otelo é conhecer o desenvolvimento do audiovisual brasileiro. 

Por outro lado, o documentário se prende demais às convenções de um filme de arquivo, soando demasiadamente expositivo e convencional para uma figura que não pode ser facilmente colocada em caixinhas. Grande Otelo é uma figura complexa, multifacetada e bastante singular. O filme transmite isso nas falas e depoimentos, mas fica a impressão de que a forma, não apenas o conteúdo, poderia também ser usada para construir a complexidade do biografado. 

Mesmo nunca saindo das convenções de um documentário de arquivo, Othelo: O Grande envolve pela trajetória longeva do ator e como ela se mescla com o desenvolvimento do cinema brasileiro.

 

Nota: 6/10


Trailer

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Crítica – Armadilha

 

Análise Crítica – Armadilha

Review – Armadilha
Um sujeito leva a filha para o show de uma diva pop e se espanta com o volume de policiais no local. Ele logo fica sabendo que as autoridades montaram no show uma armadilha para prender um perigoso assassino em série ao saberem que ele estaria lá. O problema é que o sujeito é o assassino que polícia procura. Novo filme do M. Night Shyamalan, Armadilha parte de uma premissa que parece saída de um suspense B e abraça completamente essa natureza, talvez o filme de sensibilidade mais B do diretor desde A Visita (2015).

A prisão do pop

Cooper (Josh Hartnett) está com a filha no show da cantora pop Lady Rave (Saleka Shyamalan, filha do diretor). Ao descobrir que a polícia montou uma armadilha para prendê-lo ele usa todas as suas habilidades para encontrar um meio de fugir do local ao mesmo tempo em que tenta manter sua fachada diante da filha.

A narrativa tem sua parcela de conveniências, como o fato de Cooper constantemente encontrar pessoas que revelam facilmente os segredos da operação ou algumas soluções pouco plausíveis, como o avental roubado de um funcionário estar com a carteira do sujeito dentro para que Cooper possa usar um documento para sair de um problema. Muito disso, no entanto, é tratado com alguma medida de humor, parte da autoconsciência que o filme exibe a respeito de toda a sua vibe de filme B.

Hartnett, que vem experimentando uma renascença na carreira com participações em produções como Black Mirror ou Oppenheimer (2023), é ótimo em construir a dualidade de Cooper. Um pai amoroso, que parece se importar de verdade com a filha e quer mantê-la longe de sua faceta mais sombria, e um assassino ardiloso e cruel que não se importa em mentir, manipular ou ferir os outros para conseguir o que quer. A composição de Harnett mostra aos poucos as rachaduras que vão aparecendo em sua fachada de cidadão pacato, ficando mais agitado e com mais dificuldade de se manter no controle.

Esse desvelamento da personalidade do protagonista se dá também pelo modo como Shyamalan o filma, recorrendo a closes mais fechados ou planos detalhe de pequenos tiques e expressões do personagem que revelam sua tensão e gradual perda de controle, além de ressaltar a sensação de acuamento e como as opções e espaços estão diminuindo ao seu redor. A narrativa se equilibra em uma corda bamba tonal, tentando ao mesmo tempo nos fazer temer Cooper por sua natureza cruel e implacável e fazer nos importarmos com sua relação com a filha, a exemplo de toda a subtrama envolvendo a briga da filha com uma colega de escola. Essas duas facetas eventualmente convergem, como no momento em que Cooper convence a produção do show a escolher sua filha para ser chamada para dançar com Lady Raven no palco, simultaneamente conseguindo acesso aos bastidores da arena e fazendo a filha provocar ciúmes na patricinha que a maltratou.

O caos da liberdade

É uma pena que toda essa construção cuidadosa e o crescimento da tensão desmoronem assim que a narrativa deixa o estádio. A impressão é que Shyamalan tinha umas três ideias diferentes de como encerrar sua narrativa e resolveu executar todas ao mesmo tempo, resultando em um vai e vêm constante de caminhos narrativos, reviravoltas que se acumulam tão rápido que não causam o impacto devido e soluções tão convenientes que mesmo no clima de excesso do filme soam pouco críveis.

A revelação envolvendo a personagem de Alison Pill, por exemplo, falha em ser a grande reviravolta que o filme a conduz para ser por soar desonesta. A personagem aparece muito tarde e muito pouco para sentirmos que aquela é uma guinada inesperada que ressignifica o que achávamos entender da dinâmica daquelas personagens e mais algo que o roteiro tira da cartola no último minuto porque precisava chocar o espectador. Para funcionar como o filme esperava que funcionasse era preciso apresentar a personagem antes, mostrar o estado da relação de Cooper com ela e ir construindo alguma medida subjacente de ambiguidade.

É mais um exemplo que mostra como Shyamalan é um ótimo diretor, mas um péssimo roteirista, algo que já mencionei quando escrevi sobre Batem à Porta (2023). Shyamalan só tinha a ganhar se concentrasse seus esforços na direção e tivesse alguém para desenvolver os roteiros ao seu lado a partir dos argumentos que ele próprio cria.

Armadilha vale pelo modo como constrói o senso crescente de tensão no jogo de gato e rato entre o protagonista e seus perseguidores, bem como na dualidade que traz ao protagonista, sendo lamentável que ele se perca no clímax, desperdiçando o seu próprio potencial.

 

Nota: 6/10


Trailer

sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Crítica – Tipos de Gentileza

 

Análise Crítica – Tipos de Gentileza

Review – Tipos de Gentileza
Os filmes do diretor grego Yorgos Lanthimos costumam ser divisivos, com reações que muitas vezes se localizam em polos extremos do amor ao ódio por suas produções. Em geral costumo gostar do niilismo surrealista do diretor, mas confesso que Tipos de Gentileza não me pegou.

Absurdo previsível

A produção consiste de um tríptico de três histórias curtas. Na primeira história seguimos Robert (Jesse Plemons), um sujeito completamente devotado ao chefe, Raymond (Willem Dafoe), que controla todos os seus horários e ações ao longo do dia. Quando Raymond pede a Robert que bata seu carro em alta velocidade contra outro veículo, Robert não fica confortável com a possibilidade de matar outra pessoa, criando um conflito na relação. Na segunda história um policial, Daniel (Jesse Plemons) se reúne com a esposa, Liz (Emma Stone), depois que ela se envolve em um naufrágio e fica meses perdida no mar. O problema é que Daniel desconfia que a mulher que voltou não é a sua esposa. A terceira história é protagonizada por Emily (Emma Stone) que é devotada a um bizarro culto sexual liderado por Omi (Willem Dafoe) e Aka (Hong Chau) e é incumbida de encontrar uma mulher que, segundo profecias, seria capaz de ressuscitar os mortos.

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Drops – O Reencontro da Turma

 

Análise – O Reencontro da Turma

Review – O Reencontro da Turma
Depois de assistir O Reencontro da Turma pensei seriamente se eu escreveria algo respeito. É uma produção tão inane, tão desprovida de qualquer qualidade minimamente memorável que pensei que seria difícil fazer render um texto sobre ele, mesmo nas pílulas críticas da coluna Drops. Ainda assim, resolvi tentar como um desafio (ou penitência, sei lá) auto imposto para ver o que consigo extrair.

quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Crítica – Sailor Moon: Cosmos

 

Análise Crítica – Sailor Moon: Cosmos

Review – Sailor Moon: Cosmos
Depois que Sailor Moon: Eternal adaptou o quarto arco do mangá em dois filmes, a saga de Usagi e suas aliadas iniciada em Sailor Moon Crystal chega ao fim neste Sailor Moon: Cosmos, que adapta o arco final do mangá. Como na história anterior, o anime produzido pela Netflix vem no formato de dois filmes.

A Lenda da Luz da Lua

A história inicia com Usagi e as demais voltando ao seu cotidiano de estudantes, mas essa paz é logo interrompida pela chegada das misteriosas Sailor Starlights, guerreiras de outro planeta que vieram à Terra um busca de sua princesa, e também da poderosa vilã Sailor Galaxia, que está em busca dos Sailor Crystals que Usagi e as outras carregam consigo.

terça-feira, 27 de agosto de 2024

Crítica – Os Novatos

 

Análise Crítica – Os Novatos

Review – Os Novatos
História mais velha que o próprio tempo: grupo de garotos meio nerds chega no ensino médio decididos a se tornarem populares e conquistarem garotas, a oportunidade vem na primeira grande festa do ano. É essa premissa extremamente típica de filmes adolescentes que Os Novatos vai construir, com o grosso do filme se passando em uma festa que sai do controle não muito diferente de produções como Mal Posso Esperar (1998) ou Projeto X (2012).

Só mais um besteirol americano

A trama gira em torno de Benj (Mason Thames, de O Telefone Preto), que vê na primeira festa do ensino médio uma chance de ficar com Bailey (Isabella Ferreira, de Crush: Amor Colorido), a melhor amiga de sua irmã, Alyssa (Ali Gallo), por quem é apaixonado há anos. Na festa Benj e seus amigos se envolvem em muitas confusões para tentar parecerem descolados.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Crítica – Longlegs: Vínculo Mortal

 

Análise Crítica – Longlegs: Vínculo Mortal

Review – Longlegs: Vínculo Mortal
Dirigido por Osgood Perkins, filho do ator Anthony Perkins (famoso pelo Norman Bates de Psicose), este Longlegs: Vínculo Mortal mistura um thriller de serial killer com horror sobrenatural. Nem sempre a mistura transita de maneira fluida entre os gêneros, mas a condução de Perkins é eficiente em criar uma atmosfera de constante tensão.

Instinto sombrio

A narrativa é centrada em Lee Harker (Maika Monroe, de Corrente do Mal) uma jovem agente do FBI que tem um instinto afiado para encontrar criminosos. Ela acaba incumbida pelo seu superior, Carter (Blair Underwood), de investigar os assassinatos cometidos pelo misterioso Longlegs (Nicolas Cage). Ao longo de anos, o assassino matou cerca de dez famílias inteiras, sempre deixando uma carta cifrada no local do crime, mas nenhuma evidência física de sua participação nos crimes, que são considerados assassinatos seguidos de suicídio e as provas apontam para os pais de cada família cometendo os crimes.